O prazo para apresentação de candidaturas a apoios para a agricultura após os incêndios de Monchique termina esta sexta-feira. Ajudas que ainda não contemplam a reflorestação.
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"Arderam-me as máquinas, os tratores, as balanças, as vedações. Ardeu-me os pomares de castanheiros, de nogueiras, ardeu-me tudo", lamenta.
Ardeu toda uma vida. José Silva Albano, agricultor, nem sequer ainda foi ver algumas das suas propriedades que arderam durante o incêndio de Monchique. Não quer lá ir. As lágrimas enchem-lhe os olhos.
A mulher de José Albano ensaia uma explicação. "Pois, ele está muito em baixo, mas já vai melhorando", garante. Alda da Conceição lamenta que, passados quase quatro meses após o fogo ter devorado aquela serra, Monchique já pouco seja notícia. "Falam nos incêndios de outros países e no de Pedrógão, ou lá o que é o nome, e neste não falam nada e nós queríamos comprar o tratorzinho de rachar a lenha e aquilo tudo", diz.
Até hoje não chegaram quaisquer subsídios. Já por duas vezes foi adiada a data de encerramento das candidaturas para apoio aos agricultores. Esta sexta-feira, finalmente, terminam.
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José Albano nem consegue fazer as contas a todo o prejuízo que teve, sabe apenas que se candidatou a ajudas. "Se me vão dar alguma ajuda, não sei", afirma desalentado.
Rui André, presidente da Câmara Municipal de Monchique, explica que foi necessário criar um gabinete de apoio aos agricultores, porque a burocracia era muita. Exigiam a estas pessoas, quase todas idosas, coisas tão complicadas como aceder a uma plataforma eletrónica. "Devíamos adequar estas regras à realidade e criar medidas mais fáceis para as pessoas", frisa.
Alguns agricultores, que tiveram ajuda de instituições de solidariedade social ou a quem o incêndio provocou poucos estragos, nem se candidataram às ajudas. Segundo a autarquia, há cerca de 400 processos para apresentar ao Ministério da Agricultura. "[Prejuízos] até 5 mil euros as pessoas recebiam 100% do valor apresentado, de 5 mil a 50 mil euros, 85% e mais de 50 mil euros, 50%", explica.
Rui André frisa que, no caso de Monchique, os prejuízos da maior parte dos agricultores não ultrapassam os 50 mil euros. O problema é que, passado todo este tempo, ninguém ainda viu o dinheiro. "Propus várias vezes que, assim que fossem avaliadas as candidaturas, fossem dadas as ajudas às pessoas."
José Albano nunca conseguirá cobrir todo o seu prejuízo, mas considera que qualquer ajuda já é bem-vinda. Tem um documento com a avaliação de prejuízos de 34 mil euros que lhe foi feita. Muito aquém do desejável.
Por enquanto, o agricultor poderá apenas receber apoios para tubos de rega, alfaias ou tratores agrícolas. Não pode ainda avançar com a reflorestação das áreas ardidas, porque só agora foram lançadas pelo Ministério da Agricultura as candidaturas que ficarão abertas até final do mês de janeiro de 2019.
Mesmo assim, a Câmara Municipal de Monchique considera que depois do incêndio há uma oportunidade única de reordenar a serra.
José Albano, apesar dos seus quase 83 anos, ainda resiste. "Fui trabalhar hoje até ao meio dia, ainda trabalho com moto serras, trabalhei toda a vida para comprar o que tenho. E agora...". Fica com a voz embargada.
Agora, quase tudo ficou destruído. Mesmo assim, ainda há vontade de continuar. "Se eu tivesse 34 mil euros comprava máquinas novas", garante. Porque das cinzas também podem nascer sonhos.