O caminho de Mário Centeno no governo tem sido marcado por constantes braços de ferro com Bruxelas em torno dos orçamentos do Estado e dos problemas da banca. Pelo meio, a polémica dos sms.
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A relação de Mário Centeno com Bruxelas mostrou-se difícil desde bem cedo. O primeiro orçamento do governo, em 2016, encontrou fortes resistências da Comissão Europeia e, numa semana, o ministro das Finanças teve de arranjar espaço para mil milhões de euros adicionais. Deixou cair a descida da Taxa Social Única paga pelos trabalhadores com salários baixos e aumentou impostos indiretos, como o Imposto sobre Produtos Petrolíferos.
Ainda nesse ano, Portugal conseguiu evitar sanções e o congelamento de fundos estruturais por não cumprir as metas do défice do ano anterior. As posições dentro da Comissão estavam divididas, mas o processo foi encerrado. Mário Centeno conseguiu ainda mais um ano para ir ao encontro das exigências de Bruxelas: um défice de 2,5% em 2016.
Missão cumprida. Apesar de criticado pela oposição, que acusou o Governo de recorrer ao Programa Especial de Redução do Endividamento ao Estado e às cativações para reduzir o défice, o ministro das Finanças deixou as contas com um saldo negativo de 2% do PIB, o mais baixo da democracia portuguesa.
O Procedimento por Défices Excessivo, que já durava desde 2009, acabaria por ser encerrado. E Wolfgang Schäuble, ministro das Finanças alemão que tão crítico tinha sido do governo, elogia o ministro português, chamando-o mesmo de "Ronaldo do Ecofin", o órgão formal de ministros das finanças de toda a União Europeia.
Os números da economia e do défice foram ajudando a relação de Centeno com a Europa, mas numa altura em que o executivo português aponta para um défice de 1,1% do PIB e para um crescimento novamente acima de 2% em 2018, Bruxelas avisa que Portugal está "em risco de incumprimento" das regras europeias.
A reestruturação da banca e os polémicos sms
Se a caminhada de Mário Centeno foi difícil nas questões orçamentais, entre negociações com a esquerda e exigências de Bruxelas, seria ainda mais problemática na tentativa de resolução dos imbróglios da banca. O ministro já mobilizou quase 10 mil milhões de euros para estabilizar o sistema financeiro, segundo contas do Jornal de Negócios.
O primeiro dos obstáculos surgiu logo a seguir à tomada de posse do governo, ainda no final de 2015, com a resolução do Banif. O Tesouro português injetou quase 1,8 mil milhões de euros, a que se juntaram mais de mil milhões do Fundo de Resolução da banca.
Seguiu-se a reestruturação da Caixa Geral de Depósitos, que recebeu quase quatro mil milhões de euros de dinheiro público para se recapitalizar. O Eurostat, gabinete de estatísticas europeu, ainda não decidiu se a operação tem implicações no défice.
Mário Centeno veria ainda com alívio a venda (muitas vezes adiada) do Novo Banco, mas que implicou a injeção de até 3,8 mil milhões de euros pelo Fundo de Resolução, com garantia de financiamento estatal. Resolvida está também a questão dos chamados lesados do BES, com uma garantia estatal de 301 milhões de euros, depois do acordo alcançado no final de 2016.
Pelo meio, a polémica das mensagens trocadas com António Domingues, que motivou mesmo uma comissão de inquérito no Parlamento. Em causa está a alegada garantia dada ao então recém-nomeado presidente da CGD de que não precisaria de apresentar a declaração de património no Tribunal Constitucional. O documento final da comissão de inquérito, redigido por um deputado socialista, acabou por admitir que pode ter havido um acordo entre Mário Centeno e António Domingues.