"Peço desculpa". Erro no IRS corrigido nas próximas semanas para 326 famílias
António Mendonça Mendes, secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, em entrevista à TSF e ao Dinheiro Vivo.
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O secretário de Estado dos Assuntos Fiscais lamenta o erro nas declarações dos contribuintes que incluem os pais no mesmo IRS e promete que tudo estará resolvido nas próximas semanas. António Mendonça Mendes faz um balanço positivo dos reembolsos, garantindo que o prazo médio diminuiu, mas quer que mais contribuintes tirem partido do IRS automático.
Este ano já ouvimos falar do ritmo de entrega do IRS, mas qual foi o valor médio dos reembolsos?
Esta campanha de IRS correu muito bem e todas as pessoas têm essa perceção que vem da facilidade com que se pôde submeter a declaração, mas também da rapidez na resposta a essa mesma declaração. Há um ponto que me parece essencial, que é a possibilidade de o próprio contribuinte poder seguir, seja a partir do portal ou da app, o curso da sua declaração. E tem sido tão rápido que conseguimos cumprir os prazos com que nos comprometemos e hoje podemos dizer de forma segura que o prazo médio de reembolso do IRS automático foi de 11 dias, tendo beneficiado desta funcionalidade cerca de 1,6 milhões de pessoas. Mas, ainda mais significativo, conseguimos reduzir de 23 para 16 dias o prazo médio de reembolso de liquidação de todas as declarações. Este número compara com os 23 dias do ano anterior, dos 30 do ano imediatamente anterior e dos 36 do outro. Estamos todos com motivos para ter orgulho na nossa autoridade tributária, que conseguiu corresponder e responder muito bem a este desafio.
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E o valor médio dos reembolsos, subiu?
Essas contas, como tenho tido oportunidade de dizer, terão de ser feitas no final e nós divulgamos sempre esse número. O que posso dizer é que, de acordo com os dados preliminares que temos hoje, as notas de cobrança subiram a um ritmo superior à subida das notas de reembolso.
Como é que explica isso?
Há imensas explicações que podem ser dadas e não tenho neste momento esse detalhe. Por isso mesmo é que ainda não é altura de fazer esse balanço, mas, como tenho dito, os reembolsos estão muitos ligados às deduções e, portanto, as notas de cobrança estão ligadas aos rendimentos. E para além dos rendimentos de trabalho há outros como as mais-valias, rendimentos prediais, que podem variar. Há uma multiplicidade de fatores que explicam os números. O que é importante é que antes gastávamos muito tempo e muitos recursos a tratar daquilo que agora conseguimos tratar em 2 meses e agora temos mais tempo para, mais cedo, fazer a análise mais fina desses dados.
Este ano, os filhos que incluem os pais no mesmo IRS - porque os pais têm pensões baixas - tiveram um problema que o governo, na verdade, já prometeu corrigir: na declaração que entregaram não foi calculada a dedução de 525 euros atribuída a ascendentes. Sabe quantos agregados estão aqui em causa?
São 326 que estão nestas condições. E isto porquê? Uma coisa é o universo potencial e dentro desse universo há quem tenha coleta zero, não podendo fazer uma dedução à coleta. Aqueles que ainda podem beneficiar desta coleta são 326 agregados. Estamos em condições de nas próximas semanas proceder à liquidação destas mesmas declarações.
A correção é automática...
Vai ser automática e sem que estes contribuintes tenham de fazer o que quer que seja. Houve um desfasamento entre aquilo que é o normativo onde está publicado o valor da pensão mínima do regime geral, porque esse valor é um valor de referência para se ter acesso à dedução e não um valor em si mesmo. Ou seja, não é correto dizermos que são os pensionistas que estão nesta situação porque pode ser um ascendente que tenha, por exemplo, só rendimentos prediais, só que o teto do valor é o valor da pensão mínima. E, objetivamente, não há nenhuma pensão mínima que seja menor do que aquele valor mais os 28 euros da atualização extraordinária. Isso foi detetado e prontamente corrigido. Naturalmente que terá o constrangimento inicial para estas pessoas, a quem naturalmente peço desculpa, mas a Autoridade Tributária corrigirá isso nas próximas semanas.
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Essa situação já vai ficar acautelada para o ano, tendo em conta que haverá um novo aumento extraordinário em agosto?
Temos de ser mais tolerantes relativamente aos nossos próprios erros, não há super-homens. Este ano há esta questão, no próximo ano haverá certamente outras questões. Temos de procurar ir melhorando e sempre que verificamos que há uma situação que não correu tão bem temos de o assumir e corrigir prontamente.
O IRS automático foi este ano alargado às famílias com dependentes. Em 2019 acha que há condições para dar um novo passo e estendê-los a outro tipo de rendimentos que ainda não estão abrangidos?
Essa questão é muito interessante. Eu tenho feito uma reflexão a dois níveis com a Autoridade Tributária. Continuamos sempre a explorar novos tipos de rendimentos que possam ser incluídos nos IRS automático - esse será o futuro. O nosso esforço é no sentido de procurar ver a que outras fontes de informação já temos acesso para podermos alimentar os dados do IRS automático. Mas há outra dimensão muito importante: no primeiro ano, tínhamos um universo de cerca de 1,5 milhões de agregados e cerca de 800 mil a aderir ao IRS automático; este ano temos um potencial de mais de 3 milhões e uma utilização de cerca de 1,6 milhões. Temos aqui uma margem de 1,4 milhões de pessoas que já podem hoje aceder ao IRS automático e que por algum motivo não acederam. Tenho estado a trabalhar nisso com a Autoridade Tributária, porque temos de fazer um esforço de tentar perceber porque é que estas pessoas ainda não aderiram. O ano passado as declarações de IRS representavam cerca de 16%, hoje em dia representam cerca de 30%, portanto, as pessoas vão tendo mais confiança no sistema e nós temos de ser capazes de induzir essa confiança. Estamos naturalmente a explorar novas funcionalidades que possam permitir alimentar o IRS automático mas há esta dimensão importante: há uma subutilização do IRS automático que devemos preencher.
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Mas há rendimentos mais fáceis de colocar no IRS automático?
Estamos a trabalhar em toda a tipologia de rendimentos. Há tipologias mais difíceis de comunicar automaticamente, como por exemplo as mais-valias, e há outras da categoria B que poderão ser mais fáceis. Mas, como digo, estamos a trabalhar a todos os níveis. A pior coisa que podemos fazer a uma medida como esta é avançar sem segurança. Aquilo que dá confiança no IRS automático é a segurança que as pessoas têm de que, efetivamente, o que a Autoridade Tributária lá tem corresponde ao que a pessoa ia declarar. Temos aqui uma janela de oportunidade nesta margem de pessoas que podem utilizar e que ainda não utilizaram e é nessa que nos devemos concentrar.
A fiscalização dos arrendamento foi considerada uma prioridade inspetiva. Está prevista alguma ação mais direcionada para este setor?
Tenho por regra não comentar nenhuma inspeção em particular que esteja prevista. É importante que se tenha consciência que, para nós, o combate à fraude e à evasão fiscal é uma prioridade e as ações inspetivas fazem parte da rotina da nossa atividade. Uma das partes do sucesso das ações inspetivas decorre também do seu caráter surpresa. Há poucas semanas fizemos uma grande operação a nível nacional a todos os operadores económicos que tinham sido registados desde outubro do ano passado. Estas operações têm seguramente um caráter dissuasor, mas também de indução do cumprimento, porque o contacto que temos com os novos operadores logo no início ajuda-os também a criar as condições para cumprirem as suas obrigações tributárias, e essa é uma das nossas prioridades. Num país onde o padrão é o de cumprimento voluntário das obrigações por parte dos contribuintes, a nossa obrigação é criar condições para que isso aconteça. Nesse e noutros setores estamos sempre atuantes e vigilantes.
Vem aí uma nova forma de as empresas e os contribuintes tratarem as faturas. O que muda?
Estamos a procurar e a implementar medidas que simplifiquem a vida dos cidadãos e das empresas. No que diz respeito às empresas, destacaria uma medida da maior importância: os arquivos digitais. Ou seja, em vez de as pessoas guardarem os papéis - e as empresas sabem o custo de contexto que isto tem - há a possibilidade de substituir (porque têm de manter isso durante alguns anos) e manter o seu arquivo através de meios digitais. Do ponto de vista dos contribuintes, estamos a querer implementar um sistema em que, por um lado, se não quisermos dar o NIF isso não significa vacilar no avanço que tivemos com as faturas comunicadas, porque vamos introduzir um QR code e um número de referência. Para o caso de eu não querer dar o NIF numa determinada aquisição posso, depois, através do meu telemóvel, numa app que vamos fazer, comunicar à Autoridade Tributária essa mesma fatura. Para além do QR code, esta possibilidade é importante do ponto de vista mental. Queixamo-nos todos da carteira cheia de papéis. Estamos a querer implementar um sistema em que, quando damos o NIF, a nossa fatura vai diretamente para a nossa zona reservada do e-fatura. Isto implica um conjunto de adaptações muito significativo, mas é um projeto muito ambicioso.
A autoridade da concorrência revelou esta semana que a carga fiscal representa 63% do preço de venda ao público da gasolina e 56% do preço do gasóleo. Bem sabemos que este peso dos impostos já foi maior, mas, numa altura em que o preço do petróleo aumenta, não seria de repensar esta carga fiscal sobre os combustíveis?
Tenho muito respeito pela Autoridade da Concorrência. O relatório de que fala não é um relatório definitivo, uma vez que os dados mais atualizados não foram considerados. Por isso. esse relatório, de acordo com a informação que tenho, ainda vai ser objeto de reformulação para a sua adaptação. Aquilo que é importante termos presente é que a questão dos combustíveis não pode ser vista de forma isolada. Temos procurado sempre, no âmbito da tributação sobre os combustíveis, aproximar aquilo que são as boas práticas europeias.
Em 2016, o governo aumentou o ISP em 6 cêntimos por litro, dizendo que o fazia porque estava a perder receitas fiscais com a diminuição do preço do petróleo. Ao mesmo tempo prometeu rever o imposto de 3 em 3 meses, conforme a variação desse preço. É verdade que ainda houve algumas reduções de ISP, mas no ano passado o governo deixar cair essa revisão. Porquê?
É muito importante, sobre esse tema, que possamos contextualizar a altura em que a medida foi tomada. Parece um passado distante, mas em 2016 havia um procedimento por défice excessivo e Portugal estava à beira de ser objeto de sanções por parte da Comissão Europeia, porque não tinha tido nenhum exercício orçamental em que tivesse cumprido as metas. Hoje, parece tudo muito simples porque estamos habituados a que as metas sejam cumpridas e o que se discute agora é se as metas vão ser superadas. Portanto, o contexto dessa decisão foi esse, mas também acho que é importante ler os preâmbulos das portarias de 2016 e 2017. Em 2016, foram sendo feitas as revisões, e em 2017 foi assumido de forma clara a distorção que existe entre aquilo que é a média dos países da UE antes do alargamento e a nossa realidade. E, em particular, uma questão muito concreta: a nossa taxa unitária de ISP do gasóleo é mais baixa do que a taxa unitária de gasolina, em contracorrente com as práticas europeias. Práticas essas que decorrem do facto de este tipo de combustível ser ambientalmente mais sustentável. Quando olhamos para esta realidade, não nos podemos esquecer que, no que diz respeito ao transporte público, seja de mercadorias ou de passageiros, não há só a possibilidade das deduções destes custos em IRC. No transporte rodoviário de mercadorias há uma medida da maior importância que é o gasóleo profissional, que foi reivindicada durante muitos anos, e que permite aos veículos acima de 35 toneladas terem o máximo de desconto possível que nos é dado, de acordo com a diretiva europeia: por cada litro abastecido, há um reembolso do Estado de 14 cêntimos.