Guerra aberta entre ministro e autarca. De quem é a culpa pelo atraso na reconstrução das casas?
O ministro da Agricultura nega categoricamente alguma vez ter sugerido à Câmara de Monchique um prolongamento dos prazos para as candidaturas aos apoios. É a resposta de Capoulas Santos ao autarca algarvio, que esta manhã admitiu à TSF ter prolongado os prazos... mas por indicação do ministro.
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A notícia de que nenhuma das mais de 50 casas de primeira habitação que arderam durante o fogo de Monchique foi reconstruída e da falta de apoios aos agricultores, apesar de já terem passado seis meses e do pacote de 5 milhões de euros destinado a ajudar a população, abriu uma polémica entre o Governo e o poder local.
O ministro da Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural, Luís Capoulas Santos, começou por garantir à TSF que já foram analisadas todas as candidaturas das explorações que foram afetadas pelo fogo de Monchique, mas que a maioria das mesmas não apresentava todos os documentos necessários.
Mas o autarca de Monchique, Rui André, queixou-se do excesso de burocracia e da complexidade do processo.
"A maior parte das pessoas com quem contactei estão desmotivadas", revela Rui André. "Estamos a falar de pessoas com uma idade avançada, de pessoas que sobrevivem das suas reformas, e, por isso, muitas delas não têm estabilidade financeira para comprar um trator ou um objeto mais caro, esperando, posteriormente, após a apresentação de todos os documentos, receber esse dinheiro. Os processos são muito complexos. É um exagero", insiste o presidente da Câmara Municipal de Monchique.
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Confrontado depois pela TSF com estas críticas, Capoulas Santos questionou a atitude do autarca de Monchique - que chegou a pedir o adiamento do prazo de apresentação das candidaturas.
"Gostava de perguntar à Câmara Municipal [de Monchique], se queria tanto a celeridade neste processo, porque pediu o adiamento por duas vezes?", interroga. "Nós estávamos em condições de iniciar a análise dos projetos a partir do fim de setembro. Tivemos de aguardar dois meses porque nos pediram para adiar", frisa Capoulas Santos.
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E o diálogo público entre o autarca e o ministro continuou, aos microfones da TSF. Desta vez com Rui André a responsabilizar o ministro por ter indicado à autarquia de Monchique que a atitude certa seria pedir o prolongamento do prazo.
"A verdade é que o próprio ministro chegou a abordar-me no sentido de, uma vez que não estavam a aparecer candidaturas em número significativo, pedir um prolongamento do tempo. Por duas vezes o fizemos, justamente por indicação do sr. ministro", contrapôs o presidente da Câmara Municipal.
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Contactado de novo pela TSF, o Ministério da Agricultura desmentiu categoricamente a acusação feita pelo autarca.
Capoulas Santos afirmou que o adiamento do prazo para as candidaturas aos apoios foi feito "a pedido do sr. presidente da Câmara Municipal [de Monchique]". "Sem que tivesse havido nenhuma interferência ou iniciativa da minha parte", sublinhou.
"O Ministério da Agricultura limitou-se a conceder esse adiamento. Eu nunca falei com o sr. presidente da câmara. Nunca, com ele, tive qualquer tipo de contacto sobre este assunto. E agora ouvi-lo dizer, publicamente, que foi a meu pedido é uma coisa absolutamente revoltante", reclamou Luís Capoulas Santos.
Capoulas Santos classifica como "absolutamente lamentável" que, "para se desculpar das suas próprias responsabilidades", o autarca de Monchique "procure envolver quem não tem nada que ver com o assunto".
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Também o ministro do Ambiente e da Transição Energética, João Pedro Matos Fernandes, veio juntar-se à polémica, responsabilizando a autarquia pelos atrasos, mas assegura que o Governo não vai ficar de braços cruzados.
"O decreto-lei é claríssimo no sentido de o Estado assumir a responsabilidade financeira e de os processos serem conduzidos pelas autarquias", esclareceu o ministro.
"Neste caso concreto, havendo esta incapacidade por parte da autarquia, nós iremos fazê-lo. Mas, repito: a responsabilidade não é do Governo - mas parece evidente que, indo além daquilo que nos está acometido por lei, vamos ter mesmo que intervir", retorquiu.
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Candidaturas não têm documentação necessária
Já antes, o ministro da Agricultura tinha recordado que, das 281 candidaturas recebidas, em 172 faltavam documentos necessários.
"Mais de 60% das pessoas não tem o processo tratado porque não trataram os documentos a que são obrigados", lembrou o ministro.
"Não se trata de burocracias, trata-se de dinheiros públicos. Dinheiro dos seus impostos, dos meus impostos, dos nossos cidadãos europeus. Temos de cumprir regras. Até porque, se não as cumprirmos, somos obrigados a devolver à União Europeia as verbas que vêm desse apoio, porque somos escrutinados e fiscalizados por missões internacionais", sublinhou.
Capoulas Santos considera que a autarquia está a utilizar um certo discurso demagogo para colmatar o facto de não ter cumprido todas as regras. "Este discurso absolutamente demagógico - de que se deveria espalhar dinheiro sem regras nem critérios, porque as pessoas são idosas - não pode ser", criticou.
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Notícia atualizada às 13h07