Branko Milanovic, um dos maiores especialistas mundiais em distribuição de rendimentos, esteve em Lisboa para falar sobre desigualdades na conferência "Em Que Pé Está a Igualdade?".
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Se olharmos para o mapa mundial, um dos maiores especialistas em distribuição de rendimentos explica-nos, sem surpresas, que as sociedades mais igualitárias estão na Europa. Além dos países nórdicos, Branko Milanovic, aponta também para países como a Áustria, Hungria, Eslovénia, Eslováquia e República Checa.
O economista sérvio-americano, que esteve em Lisboa para participar no encontro anual da Fundação Francisco Manuel dos Santos, refere que o nível de igualdade de distribuição de riqueza nestes países está relacionado com a homogeneidade da população, o sistema de impostos, o elevado nível de educação e anos de grandes transferências sociais. "A maioria deles, já tinham Estados Sociais antes da Segunda Guerra Mundial", comentou.
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Para falar das sociedades mais desiguais, há que mudar de continente. Para a lista de países mais desiguais do mundo entram o Chile, o Brasil, as Honduras, a Nicarágua, a Guatemala, a Namíbia, a África do Sul e Angola.
"Uma razão, muitas vezes apontada, é o facto de muitos destes países dependerem de matérias-primas, de petróleo. Angola inclui-se nesse grupo com o petróleo, os diamantes e o gás", explicou Milanovic, acrescentando que existem ainda razões culturais e históricas que motivam grandes desigualdades de distribuição de riqueza entre residentes de um país.
"A questão racial na Colômbia é bastante forte. No Brasil também. O mesmo se passa nos países da América central, em que há uma população indígena menor quando comparada com a população mais espanhola", explicou.
Tornar países pobres em países mais ricos pode ser a chave para diminuir as desigualdades entre sociedades, defendeu o economista, explicando que "a Ásia, com uma grande população, tem crescido rapidamente o que deu origem a uma classe média global".
Milanovic refere que diminuir as desigualdades entre países passa também pela migração. "Tecnicamente falando, é igual enriqueceres no teu país ou mudares-te para um país rico e enriqueceres lá. Mas claro que em termos políticos não é o mesmo. Por isso, a chave para combater a desigualdade global é a redução das diferenças entre países pobres e ricos".
O economista explica que a globalização tem ajudado alguns países a saírem da pobreza mas nem todos são vencedores neste caminho. "Há vários segmentos muito significativos da população, sobretudo nos países mais ricos, que não beneficiaram da globalização", referindo-se à classe média de países desenvolvidos. "E isto não devia ser uma surpresa para nós, mas foi."
"Ou pede ajuda no seu país ou vota contra o governo"
Milanovic defende que "se não queremos ter perdedores, cabe às políticas nacionais ajudá-los a sobreviver à globalização" porque as adversidades são à escala global, mas as respostas aos problemas são dadas a nível nacional.
"Quando vemos pessoas que foram afetadas por outsourcing, pelo comércio entre países, pela produção barata na Ásia, não há um mecanismo central e global que possa ajudá-las. Se alguém ficar desempregado aqui não vai pedir ajuda à Organização Mundial do Comércio ou ao Fundo Monetário Internacional. Ou pede ajuda no seu país ou vota contra o governo", exemplificou.
Os problemas de que Milanovic fala têm afetado sobretudo a classe média em países desenvolvidos e o economista explica que há um segmento da população que está insatisfeito com a falta de crescimento e a falta de oportunidades. "Eles acham que não terão uma oportunidade numa economia global, que a economia está a ser dirigida pelas elites".
É a insatisfação e as desigualdades que também existem na Europa e nos Estados Unidos que têm alimentado movimentos populistas em países como a Alemanha, a EUA ou a França. Mas Milanovic acredita que os partidos de extrema-direita até nem estão interessados em formar governo.
"Eu acho que estes partidos populistas não vão chegar ao poder e eu acho que eles não querem chegar ao poder. Mas eles têm forçado os principais partidos a seguir uma direção. Por exemplo, conseguimos ver isso na Alemanha com o partido AfD. Eles já estão a fazer isso. Já estão a empurrar os cristãos-democratas mais para a direita", ilustrou.
Uma viragem à direita pode ter consequências na governação mesmo se os líderes desses movimentos prometerem igualdades difíceis de atingir. "Eu creio que eles nem pensaram bem num programa de governo. Podemos ver isso no caso do Trump. Talvez seja um caso extremo, mas ele surgiu com slogans vazios que não podem ser implementados. E ele está, gradualmente, a aperceber-se disso".
No caso francês, Milanovic explica que um dos principais pontos do programa da campanha para as presidenciais de Marine Le Pen passava pelo abandono do Euro mas "acabou por não ser popular na França e esta separação recente [saída de Florian Philippot, vice-presidente da Frente Nacional e braço direito de Marine Le Pen, da Frente Nacional] pode ser resultado disso".
Branko Milanovic defende que os movimentos populistas têm sobretudo "uma lista de queixas", sabendo de antemão que as politicas sugeridas, não podem ser implementadas.
"Se os políticos estão mais preocupados em criar problemas do que em resolvê-los, as desigualdades vão continuar a marcar sociedades um pouco por todo o mundo", defende Branko Milanovic acrescentando que "quanto maior a desigualdade, mais nos afastamos da democracia".