Sampaio da Nóvoa procurou, quase sempre sem resultados, chamar Marcelo ao debate. Sem resposta do antigo líder do PSD, foi com os socialistas, que tanto o ajudaram na campanha, que teve de se debater.
Corpo do artigo
Os debates televisivos que antecederam o arranque oficial da campanha anunciavam o despique e prometiam dar à campanha de Sampaio da Nóvoa um fulgor que, até então, e, por via do favoritismo dado a Marcelo Rebelo de Sousa, não se verificava, mas no terreno, ao longo de doze dias, o cenário foi bem diferente.
Apesar de sempre acompanhado, com generosidade, pela "máquina socialista" - a mesma com a qual teve de se preocupar quando o tema da discriminação entre independentes e militantes foi lançado por Maria de Belém no início da segunda semana de campanha -, o antigo reitor nunca soube como enfrentar a ausência ensurdecedora de Marcelo da campanha.
Mas, vamos por partes.
Chegado ao campo político, Nóvoa sempre se afirmou como alguém longe dos partidos e disposto a levar a "mudança" e um "tempo novo" para o cargo de presidente da República, mas a verdade é que o antigo reitor precisaria sempre que Marcelo não se ausentasse do debate para que as diferenças entre ambos pudessem ser mais escrutinadas e, nesse sentido, para que cada um, à medida dos dias, pudesse também ser julgado por cada um dos eleitores.
Assim sendo, Sampaio da Nóvoa encontrou, desde logo, uma adversidade: ao acusar o ex-líder do PSD de ser "fast-food", de realizar uma "campanha vazia" ou de conduzir uma campanha de "afetos, mas sem ideias", o candidato não só hostilizou Marcelo Rebelo de Sousa do ponto de vista da troca de palavras entre ambos, como arredou de vez o ex-comentador do debate público.
Por entre as tentativas, Sampaio da Nóvoa falou até de "rifas" e de episódios bíblicos, procurando enredar Marcelo no atual líder do PSD, Pedro Passos Coelho, e colando a imagem do agora candidato a Belém à do antigo chefe do Executivo. As tentativas, contudo, saíram quase sempre frustradas. Marcelo continuava inamovível e teimava em não entrar no debate em plena campanha. Nem mesmo quando Nóvoa insistia que havia, por parte do ex-líder do PSD uma "negação", uma "ingratidão" e uma quase repulsa pelos militantes do partido: "O que nunca, mas nunca vimos no passado, foi um candidato dizer às pessoas do partido de que foi presidente para por favor não aparecerem".
Esta terá sido, porventura, a principal pedra no sapato de Sampaio da Nóvoa. Nem mesmo as dúvidas levantadas pelo também candidato Cândido Ferreira em relação ao currículo do antigo reitor ou as trocas de galhardetes com Maria de Belém sobre os apoios do PS durante a campanha terão tido tanta influência no desempenho do candidato nas últimas duas semanas.
15 dias em que, apesar de se ter destacado, e de forma clara, como o principal opositor - e , segundo o próprio, o "único capaz de derrotar Marcelo" -, nunca conseguiu descolar de forma definitiva e sem margem para dúvidas nas intenções de voto
Mas, se um candidato "não responde à chamada" e não diz "presente" ao debate público em tempo de campanha eleitoral, é preciso encontrar novos caminhos para a campanha. E, nesse ponto, no campo que desenhou para si, Sampaio da Nóvoa, descendo do pedestal de "Senhor Reitor", esteve sempre à vontade e vestiu bem o fato que a entourage socialista lhe coseu para a campanha.
Assinando sempre como o "cidadão presidente", um "soldado raso" vindo de fora da política e de dentro da academia, alguém de fora dos "clubes fechados", Sampaio da Nóvoa, ao contrário do que muitos previam, foi passando incólume aos "testes de popularidade" e ao crivo dos cidadãos.
"Sabe quem é este senhor?", perguntaram invariavelmente os jornalistas. Uma questão a que, regra geral, a resposta foi positiva.
Rotulado como catedrático e homem do mundo académico, alguém sem passado político e com pouco caminho feito nos canais ditos essenciais do poder, na feira municipal ou na rua, no café ou no centro cívico, Sampaio da Nóvoa sempre soube interagir e passar a mensagem. Muitas vezes de esperança, outras nem tanto, mas sempre com a garantia de que, caso fosse eleito, seria sempre "mais um par ajudar".
Nas arruadas - que também, por via do mau tempo, foram pouco frequentes - , o reitor quase sempre passou com distinção, aproveitando também ele para fazer passar uma mensagem dividida em cinco causas: lutar contra o desânimo, as desigualdades, o desemprego, o despovoamento do interior ou o desperdício.
Mas, se sempre lhe correram bem os contactos com a população, nem sempre teve - ou quis ter - resposta para alguns dos eleitores. "Vamos ver", "tem de ser" ou "é preciso é força", foram algumas das expressões que pontuaram o discurso do candidato quando a dificuldade em responder de forma pronta a um anseio ou a uma dúvida se tornava evidente.
Sorrindo, mostrando o lado mais afável, Sampaio da Nóvoa soube, porém, sair sempre da situação, no mínimo, com uma palavra de conforto, a garantia de mobilização para o problema e a promessa de continuar atento ao tema. O que, em política, e perante a falta de argumentos mais válidos, mais técnicos ou de âmbito mais especializado, é, por si só, significativo e digno de resisto.
Durante a campanha, e voltando aos apoios partidários ou à falta dos mesmos, o antigo reitor da Universidade de Lisboa sempre fez questão de se afirmar longe dos partidos, embora, ao introduzir algumas nuances no discurso, fosse reforçando que contaria sempre "com todos, incluindo os socialistas" para fazer crescer a campanha e para "passar à segunda volta".
Na caravana, seriam sempre visíveis esses apoios. Na estrutura de base, alguns "jotas" e funcionários vistos noutras campanhas, entre as quais a da António Costa para as legislativas, bem como a ajuda preciosa de vários autarcas que, de norte a sul do país foram marcando presença em força nas várias ações de campanha - e na direção da campanha, Pedro Delgado Alves, um dos jovens parlamentares mais próximos do primeiro-ministro.
Um apoio registado também por via dos cinco governantes do executivo liderado por António Costa presentes em ações de campanha: Capoulas Santos, Augusto Santos Silva, Vieira da Silva, Adalberto Campos Fernandes e Eduardo Cabrita; e ainda de três ex-chefes de Estado: Mário Soares, Jorge Sampaio e Ramalho Eanes.
A troca de argumentos com a candidatura de Maria de Belém, já depois do apoio - ainda que oficioso e não oficial - de grande do partido, mais do que uma suspeição seria sempre mais uma constatação e uma forma de marcar uma posição sobre uma matéria para a qual ambas as candidaturas já estariam mais do que preparadas.
Uma discussão de proporções incontroláveis, na última semana de campanha, que não terá sido benéfica para nenhuma das candidaturas, mas muito menos para a da ex-ministra da Saúde, correndo até o risco de ter beneficiado Marcelo, diariamente acusado de "esconder-se" do debate em matérias como a Constituição ou as funções presidenciais.
Depois de criticas iniciais às "incongruências" e constantes "ziguezagues" de Marcelo, da reta final, e após a pausa forçada levada a cabo na sequência da morte de António Almeida Santos, resta novamente um combate entre os dois candidatos da área do Partido Socialista: as subvenções.
Reiterando a importância de respeitar as decisões do Tribunal Constitucional, mas manifestando-se contra a decisão do pedido e fiscalização das normas feito pelos deputados, Sampaio da Nóvoa termina a campanha com larga vantagem sobre Maria de Belém - quer do ponto de vista da retórica quer dos atos aos olhos dos eleitores -, com os olhos postos na segunda volta e a "esperança", ainda que agridoce, de que os portugueses tenham "acordado tarde para as presidenciais".
Resta saber se todo o esforço final terá, ou não, sido suficiente.