A ex-candidata a Presidente da República que rega as plantas dos vizinhos
A socióloga que já está na estrada "lado a lado com o que é de todos" (slogan de campanha), espera levar companhia para Bruxelas no próximo dia 26.
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Marisa Matias, a deputada europeia do Bloco de Esquerda, vive no bairro congolês em Bruxelas. Lá moram muitas pessoas que trabalham no Parlamento Europeu, "as pessoas que trabalham nas limpezas, os porteiros do parlamento, os motoristas", assinala a candidata ao terceiro mandato ao Parlamento Europeu.
Foi lá que, em 2017, uns dias depois das eleições portuguesas para a Presidência da República, uns vizinhos espanhóis, depois de terem visto nas notícias Marisa Matias, lhe foram bater à porta e perguntaram: "Então tu que foste candidata a Presidente da República de Portugal, estiveste este tempo todo (férias) a regar-nos as plantas?"
"Sim, porquê? Ficaram mal regadas?", respondeu Marisa Matias.
A deputada do Bloco é assim, "terra à terra", trata todos de igual modo e é assim que gosta de ser tratada, sendo certo que trabalha até à exaustão para cumprir com os objetivos. "Eu chorei imenso quando fui redatora por causa dos benchmarks que são os índices dos índices das bolsas. Eu estudava, estudava, estudava à noite e ficava com aquela sensação de não perceber porque era tão técnico e depois com todo o trabalho a decorrer. Às vezes é preciso superarmos aquilo que achamos serem as nossas limitações."
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Marisa Matias foi eleita pela primeira vez como deputada em 2009. Nesse mandato tinha a companhia de mais dois bloquistas. Neste último foi só ela que teve de "dar conta do recado".
"Para mim a mudança maior foi a de não ter ninguém para me substituir em coisíssima nenhuma. É um peso e uma responsabilidade enorme. Raramente tenho memória de dormir mais de cinco horas por dia", salienta. É também por isso que gostava de "ter companhia" depois do dia 26 de maio.
Marisa Matias olha para a Europa com a certeza de que o projeto europeísta precisa de uma mudança urgente. "Acho que neste momento não é possível ser-se europeísta sem se ser crítico daquilo que tem sido a evolução da integração europeia que levou ao Brexit e que tem levado a mais divergências entre os diferentes países. Se não for para mudar não vale a pena".
Marisa Matias é presidente da Delegação para as Relações com os Países do Maxereque (Líbano, Jordânia, Egito e Síria). "Este mandato centrou-se muito nos refugiados e no terrorismo. Visitei não só as instituições mas também todos os campos de refugiados que existem na Jordânia".
É no oriente que Marisa Matias tem uma das suas maiores causas: a Palestina. "É uma prisão a céu aberto. É uma situação que viola completamente o direito internacional. Acho que é uma das causas maiores da humanidade. É uma vergonha da comunidade internacional".
Quando fala de refugiados diz que "a União Europeia está a ser cúmplice de um massacre que já vem dos países de origem. Nos últimos cinco anos assistimos à morte de 20 mil pessoas no mar Mediterrâneo. Podia ter havido uma redistribuição de um milhão e meio de refugiados pelos quinhentos milhões de cidadãos da união europeia. Eles não vêm fazer terrorismo, eles vêm a fugir do terrorismo".
Gostava de ser avaliada nas urnas
Marisa Matias gostava que as Eleições Europeias fossem um escrutínio ao trabalho dos deputados e não um teste ao Governo ou à "geringonça", apesar de acreditar que isso será uma inevitabilidade porque diz existir em Portugal uma "nacionalização da política" e que o trabalho dos 21 deputados portugueses na Europa e em Portugal é "invisível, porque não tem cobertura mediática e as pessoas sentem Bruxelas ainda muito longe. Deviam saber que aqui decide-se muito mais sobre a vida das pessoas do que em Portugal", refere.
A cabeça de lista do Bloco tem nas questões ambientais um dos principais pontos da sua campanha. "Nós não temos outro planeta. Estamos a trabalhar para a nossa autoextinção. Ou mudamos comportamentos radicalmente ou não há futuro para as gerações futuras".
A única deputada do Bloco em Bruxelas dorme cerca de cinco horas por dia e, para lá de passar uma semana do mês em Estrasburgo, vem todos os fins de semana a Portugal para trabalho do Parlamento. Diz que a família lhe faz falta, principalmente a mãe, e que gostava de poder ir mais vezes à aldeia de Alcouce no distrito de Coimbra.
A socióloga que já está na estrada "lado a lado com o que é de todos" (slogan de campanha) espera levar companhia para Bruxelas no próximo dia 26.