Descobrir que se sofre de Insuficiência Cardíaca pode mudar uma vida, mas não significa deixar de vivê-la. A iniciativa "Coração de Portugal" dá a conhecer histórias de esperança contadas por doentes e de quem procura, com projetos e iniciativas, melhorar a vida de quem luta contra a doença. É o caso de um sistema de alerta informático inovador utilizado no Hospital de Santa Maria, em Lisboa.
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Os casos mais graves de insuficiência cardíaca e cardiopatia podem ser sinónimo de morte súbita, mas há um indicador clínico que faz toda a diferença no momento do diagnóstico: o valor da fração de ejeção (FE).
"Fração de ejeção é uma medida da função contrátil do coração que habitualmente é avaliada por métodos de imagem, como ecocardiograma, cintigrafia ou ressonância magnética", explica João Sousa, cardiologista e coordenador do Laboratório de Arritmologia Invasiva do Hospital de Santa Maria (HSM), em Lisboa.
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O especialista esclarece que este valor funciona como uma espécie de marcador e que os doentes com FE abaixo de 35% são os que correm maior risco.
"Hoje em dia há dispositivos implantáveis que permitem terminar um episódio de morte súbita e salvar a vida do doente, mas a taxa de implantação destes dispositivos em Portugal é muito inferior à dos países europeus mais desenvolvidos, é cerca de metade, e uma das razões é a identificação dos doentes em risco", afirma.
Foi com base nesta ideia, de identificar os doentes em risco para poder implantar os dispositivos e salvar vidas, que foi criado no HSM um sistema de altera informático inovador.
João Sousa recorda que o objetivo "era ter um sistema de alerta acoplado à base de dados do Serviço de Cardiologia que enviasse um alerta para a equipa de arritmologia cada vez que um doente fizesse um exame complementar em que fosse detetada FE abaixo de 35%".
Na prática, a equipa recebe uma notificação sempre que é registado um relatório clínico com reduzido valor da fração de ejeção, e depois de receber esse alerta começa o processo de identificação.
"Vamos à base de dados identificar o doente, perceber se já é seguido no hospital e quem foi o médico referenciador. Depois entramos em contacto com o médico, se for do hospital, ou com o próprio doente e convidamo-lo a vir a uma consulta de arritmologia para implantação desses dispositivos", explica o cardiologista.
O sistema nasceu em 2017, foi testado durante 3 meses num projeto-piloto e acabou por ser adotado de forma permanente no Serviço de Cardiologia do HSM devido aos resultados muito positivos.
"Num trimestre identificámos cerca de 250 doentes com esse marcador [fração de ejeção inferior a 35%], 60% já tinham dispositivo, mas 25% não tinham sido referenciados e poderiam beneficiar do dispositivo. Esses doentes foram contactados, muitos acabaram por implantar o aparelho e desde então temos utilizado este sistema e continuado a identificar doentes que beneficiam desta terapêutica", refere.
O especialista em eletrofisiologia, que lida todos os dias com casos de insuficiência cardíaca, explica que o sistema de alerta é um aliado na prevenção da morte súbita e lembra que é urgente melhorar a referenciação dos doentes, a começar nos consultórios médicos.
"Muitas vezes os médicos, seja clínicos gerais, de medicina interna ou até cardiologistas, não estão completamente alerta e não fazem a referenciação dos doentes, seja por falta de informação nos guidelines, distração, por não acreditarem muito na terapêutica ou não saberem a quem referenciar. Há um desconhecimento de que este fator de risco deve ser reconhecido e há terapêuticas eficazes para prevenir a morte súbita nestes casos", afirma João Sousa.
Sobre o alargamento deste sistema de alerta ao resto do país, o especialista nota que a base de dados utilizada no Serviço de Cardiologia do HSM é um programa informático já adotado pela maioria dos centros de cardiologia portugueses, o que facilitaria o processo.
"Era muito fácil estender esta aplicação e no futuro faria sentido. Isso permitiria identificar mais facilmente muitos doentes em risco", conclui.
"Coração de Portugal" é uma iniciativa da TSF, DN e JN com o apoio da Novartis e da Medtronic."