Insuficiência cardíaca: diagnóstico precoce salva vidas e reduz custos no SNS
"Temos enormes desafios em matéria de insuficiência cardíaca e o Governo tem consciência do muito que ainda há a fazer." Foi esta a mensagem deixada pelo Secretário de Estado Adjunto e da Saúde, António Lacerda Sales, na segunda sessão do ciclo de conferências "Insuficiência cardíaca: Uma estratégia para Portugal", que o Global Media Group realiza com o apoio da Novartis e da Medtronic, entre 6 e 8 de outubro, das 18h30 às 20h00.
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No debate desta quarta-feira, que reuniu vários especialistas e profissionais de saúde, foram analisadas as fragilidades do Sistema Nacional de Saúde (SNS) e as propostas que constam do relatório "Consenso Estratégico para a Insuficiência Cardíaca em Portugal".
Diagnóstico precoce
A importância da prevenção e do diagnóstico precoce da insuficiência cardíaca (IC) foi um dos assuntos consensuais. Pedro Marques, cardiologista e especialista de Arritmologia, Pacing e Eletrofisiologia, sublinha que mesmo antes da pandemia muitos doentes com IC só chegavam ao hospital num estado avançado da síndrome. "Muitas vezes o diagnóstico inicial da IC só é feito no primeiro internamento, depois de um episódio de descompensação", lamenta.
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Para que o diagnóstico possa ser feito de forma precoce é preciso informar a sociedade sobre o que é e como se manifesta a IC. "Muitos doentes não têm conhecimento sobre os sintomas mais frequentes da doença, não valorizam sinais como cansaço e falta de ar, que são muitas vezes atribuídos ao envelhecimento", refere Joana Pimenta, membro da Coordenação do Núcleo de Estudos de Insuficiência Cardíaca da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna.
Também José Silva Cardoso, coordenador do Grupo de Estudo Insuficiência Cardíaca da Sociedade Portuguesa de Cardiologia, nota que é urgente informar os portugueses sobre os sinais de alarme da doença, mas também motivar a prática de exercício físico e de um estilo de vida saudável. "A prática de exercício deve ser encarada como uma necessidade biológica e não como uma opção. É como dormir ou comer diariamente."
Outro caminho para a prevenção e diagnóstico precoce passa pelo teste de doseamento peptídeos natriuréticos, uma ferramenta que os especialistas consideram essencial na triagem da IC. Rui Nogueira, Presidente da Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar, lamenta que a análise não seja comparticipada. "Julgo que há aqui uma iniciativa política necessária para podermos encontrar formas de ter acesso a esta análise."
Uma ideia reforçada pelo cardiologista Pedro Marques: "A não utilização desta análise protela o diagnóstico da IC e obriga a realizar exames muito mais dispendiosos, que poderiam ser evitados se fosse feita a triagem com o teste."
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Custos e internamentos
Apostar no diagnóstico precoce é salvar vidas, mas também aliviar os custos da IC no SNS. É essa a tónica deixada por José Silva Cardoso. O especialista refere que "os internamentos representam 50% a 75% dos custos com IC e 3,2% dos custos anuais em saúde." Silva Cardoso lamenta que os internamentos sejam a regra e não a exceção. "Mais de 80% dos doentes são internados pelo menos uma vez. Ora, os internamentos acontecem por descompensação, que é mais provável se o doente tiver IC e não souber, porque progride", refere o especialista.
Sobre as implicações dos internamentos, Joana Pimenta lembra que "é mau para o doente, que claramente não gosta de estar internado, é mau para os médicos e profissionais de saúde, que têm dificuldades na gestão de camas, e é mau para o sistema porque é o principal motor dos custos em IC".
Rede de referenciação
Sendo a IC uma síndrome geralmente associada a outras patologias (como hipertensão, diabetes, doença pulmonar, doença renal, entre outras), torna-se central articular o trabalho das equipas multidisciplinares. Victor Herdeiro, Secretário da Mesa da Assembleia Geral da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares sublinha que é preciso pôr o doente no centro da questão. "Isto só pode funcionar se as instituições de saúde se organizarem em função das patologias e não das especialidades médicas", afirma.
Rui Nogueira acrescenta que os doentes com IC são doentes complexos, com mais do que uma patologia, o que reforça a importância de criar uma rede de referenciação integrada que permita a gestão e o acompanhamento coordenado do doente por parte dos profissionais de saúde: "É um doente de medicina interna, de cardiologia, de endocrinologia e de bastantes médicos e técnicos de saúde."
Financiamento por resultados
Por fim, e no que toca ao financiamento da IC, os especialistas consideram que é urgente criar mecanismos estatais. "Da mesma forma que para o HIV/SIDA se criou a nível central uma linha de financiamento para a doença", refere Victor Herdeiro.
A medição e monitorização de resultados é outra das propostas do relatório "Consenso Estratégico para a Insuficiência Cardíaca em Portugal". Joana Pimenta refere que "em Portugal estamos numa fase embrionária, para não dizer inexistente da avaliação dos cuidados aos doentes com IC. É preciso promover registos e avaliar os resultados".
A especialista, membro da Coordenação do Núcleo de Estudos de Insuficiência Cardíaca da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna, considera que esses dados serão determinantes no momento de financiar a IC, de acordo com os resultados conseguidos nas diferentes unidades de saúde.
A terceira e última sessão do ciclo de conferências "Insuficiência cardíaca: Uma estratégia para Portugal" decorre esta tarde, das 18h30 às 20h00, e poderá ser acompanhada em direto nos sites da TSF, DN e JN.
Mais informações em CORACAODEPORTUGAL.DN.PT