Portugal vai perder dinheiro da Europa. E há razões para ficarmos preocupados
Corpo do artigo
A caminho das eleições do próximo domingo, vários partidos têm usado a perda de fundos de Coesão no próximo Orçamento da União como argumento político. O que está realmente em causa? Para que não se perca no "diz-que-disse" eleitoral, preparamos-lhe um explicador.
1 - No próximo quadro financeiro, Portugal perde verbas europeias?
Sim. A Política de Coesão, mantendo as "sinergias" entre os fundos que a compõem, sofre um corte médio da ordem dos 5%, para o total da União Europeia. Portugal não escapará aos cortes.
2 - Quanto se vai perder?
Em março, o Tribunal de Contas da União Europeia divulgou um relatório de análise rápida, em que calcula uma perda real de 7%, no conjunto dos fundos da Política de Coesão. A proposta, porém, ainda não está fechada e depende muito dos critérios que vierem a ser negociados, em sede de Conselho Europeu, para a distribuição das verbas.
3 - Como é feito o cálculo?
O coeficiente aplicado a um grupo de 11 Estados-membros, que têm um Rendimento Nacional Bruto inferior a 82% da média da União Europeia, foi revisto, caindo dos 3,15% para 2,8%. Portugal está no grupo de países afetados.
4 - Como se comparam os orçamentos?
Simples. Para calcular a variação em termos reais, o cálculo deve considerar preços constantes, eliminando o impacto da inflação. Recorre-se a uma referência de um ano base, e a partir daí calcula-se o valor de cada um dos anos com os preços do ano de referência. A comparação entre os valores nominais com os valores reais distorce o resultado e gera confusão.
5 - Qual o montante em causa?
A preços de 2018, Bruxelas apurou um montante de 21.170 milhões de euros para ser distribuído durante sete anos, entre o início de 2021 e o final de 2027.
6 - Onde é gasto este dinheiro?
Os investimentos do Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional e do Fundo de Coesão são dirigidos a projetos de inovação, apoio às PME, às tecnologias digitais e à modernização industrial. A luta contra as alterações climáticas também está no espetro para a aplicação dos fundos.
7 - Porque há cortes?
Em termos reais, o orçamento é mais curto. Há também novas rubricas, como a investigação para a defesa, para acomodar dentro de um orçamento que conta com um contribuinte a menos. Os Estados-membros deverão pôr-se de acordo para aumentar as suas contribuições, de forma a suavizar o corte imposto pela saída do Reino Unido. A Comissão propõe que os Estados passem a contribuir com 1,11% do seu Rendimento Nacional Bruto. O Parlamento propõe 1,3%. O Governo português sugere um aumento que se situa entre os dois patamares, da ordem do 1,2%. Será sempre insuficiente para colmatar as perdas provocadas pelo Brexit. Por isso, resta a opção dos cortes. Defende-se também que Portugal - tendo melhorado a sua situação e modernizado as suas infraestruturas - não deveria olhar para a perda de fundos de coesão como um fator negativo, mas como um sinal de desenvolvimento.
O orçamento é mais curto. Há também novas rubricas, como a investigação para a defesa, para acomodar dentro de um orçamento que conta com um contribuinte a menos
8 - Como se posicionam os partidos?
Todos dizem que tal como está a proposta não é boa. Quando a proposta foi apresentada em Bruxelas, em maio de 2018, à esquerda e à direita os deputados portugueses lembraram que o Quadro Financeiro Plurianual requer unanimidade e que o Governo português não deveria hesitar se fosse necessário chumbar o orçamento. "Só haverá uma proposta contrária aos interesses de Portugal, se o Governo português aceitar essa proposta", dizia na altura João Ferreira do PCP. Silva Pereira, do PS, considerou a "proposta muito insuficiente" e "aquém do esperado", com "cortes violentos" na ordem "dos 10%" no total do volume que é absorvido por Portugal", e a precisar de "ser melhorada". O deputado José Manuel Fernandes, do PSD, defendia que o Governo "deve votar contra" e "bloquear o acordo" se vir que os interesses "não estão acautelados". Mariza Matias, do BE, defendeu que o Governo "não deve deixar passar" o orçamento. Saliente-se que a eurodeputada defende que não se devem misturar valores "nominais com valores reais", que apenas servem para "confundir as pessoas". Já Nuno Melo, do CDS, desafiou a "capacidade reivindicativa" de António Costa para defender o "interesse do Estado português".
9 - O que vai acontecer?
A proposta terá de ser aprovada por unanimidade pelos governos europeus. Até lá, todos os governos vão fazer, na realidade, aquilo que os deputados sugerem na resposta anterior. E, sim, a arma do veto estará sempre presente.
E, sim, a arma do veto estará sempre presente
Por isso mesmo, as negociações do quadro financeiro são das mais difíceis no contexto da União Europeia. Mas, no final do dia, todos os governos terão melhorado os seus montantes o suficiente, para anunciarem algum tipo de vitória.
10 - Quando vai estar decidido?
As negociações relativas aos fundos de coesão ficarão fechadas com a aprovação do Quadro Financeiro Plurianual. Quando, em maio de 2018, se apresentou a proposta de orçamento para sete anos a partir de 2021, o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, pediu que a negociação ficasse concluída até ao final da legislatura - que terminou há um mês. Apercebendo-se da meta pouco realista, o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, apontou a cimeira de outubro de 2019 como a data da adoção do Quadro Financeiro Plurianual. Mas ninguém acredita que tal aconteça. Em 2014, o atual quadro financeiro arrancou atrasado, precisamente porque o consenso tardou mais do que o previsto. Tendo em conta este dado, não estaria mal se a discussão e aprovação estivesse fechada antes do verão de 2020.
11 - Quem são os aliados de Portugal nas negociações?
Os aliados de Portugal na discussão sobre fundos de coesão são os Estados-membros que também beneficiam deste modelo de distribuição de verbas europeias, ou seja, aqueles em que o rendimento nacional bruto por habitante é inferior a 90% da média da UE. Assim, Portugal junta-se à Bulgária, à Croácia, a Chipre, à República Checa, à Estónia, à Grécia, à Hungria, à Letónia, à Lituânia, a Malta, à Polónia, à Roménia, à Eslováquia e à Eslovénia quando se trata de discutir estas verbas no Conselho Europeu.
