Venezuela, o prato principal do 1.º debate às europeias que dividiu opiniões
Primeiro debate às Europeias ficou marcado pela atualidade internacional: Venezuela. Eurodeputados não são consensuais sobre o futuro do país nem do modo como a União Europeia deve agir em relação a Nicolas Maduro.
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Guaidó e Maduro não reúnem consensos nem nos grandes, nem nos pequenos palcos. No anfiteatro III da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, os eurodeputados Francisco Assis (PS), João Ferreira (CDU), José Manuel Fernandes (PSD), Marisa Matias (BE), Nuno Melo (CDS) e António Marinho e Pinto (independente) protagonizaram uma discussão da qual só saiu o consenso de que a democracia deve imperar.
"Não podemos achar que há bons ou maus ditadores", sublinha o eurodeputado José Manuel Fernandes para justificar o voto a favor do reconhecimento de Guaidó como presidente interino da Venezuela. Lembrando a comunidade portuguesa no país, o parlamentar social-democrata defende que é necessário que Juan Guaidó seja considerado presidente transitório até que haja eleições justas e transparentes para que seja "devolvida a paz" ao povo venezuelano.
Reconhecendo que teve dúvidas sobre todo este processo, o eurodeputado Francisco Assis esclarece que votou pelo reconhecimento de Guaidó como presidente interino porque o regime está "completamente esgotado". Assis considera que "este regime conduziu a Venezuela para uma verdadeira catástrofe" e sublinha que, apesar das dúvidas em relação a Guaidó, não teve dúvidas em considerar que este regime "é criminoso" e que Maduro é um "criminoso político". "O que me levou a votar a favor? A convicção de que a Venezuela vive um estado de exceção e que este é o modo para que haja eleições livres e democráticas", diz Assis.
Quem também votou a favor do reconhecimento de Guaidó como presidente interino da Venezuela foi o centrista Nuno Melo que, neste debate, fez questão de sublinhar que "o que está em jogo é quem defende regimes totalitários ou a democracia". O eurodeputado lembrou a comunidade portuguesa na Venezuela e todos aqueles que regressaram ao país. "400 mil! Se têm dúvidas [sobre o que se passa na Venezuela], falem com os portugueses", apelou Nuno Melo lembrando que, nesta altura, há no país da América Latina uma situação que "vitima pessoas". "Não é normal que o país com as maiores reservas de petróleo do mundo tenha o povo a comer dos caixotes do lixo", sintetiza.
Em oposição, João Ferreira, Marisa Matias e António Marinho e Pinto fazem parte dos parlamentares europeus que votaram contra o reconhecimento de Guaidó como presidente interino da Venezuela. Ainda assim, invocam razões distintas.
Do lado do PCP, João Ferreira começa por dizer que a resolução em causa "afronta o direito internacional". O eurodeputado comunista diz que está ser reproduzido um debate que já foi tido em relação a situações como a que se viveu no Iraque, na Líbia ou na Síria. João Ferreira lembra que as coisas, tal como estão neste momento, "não são de excluir desenvolvimentos militares" e que podem pôr em causa as pessoas e, no caso, a comunidade portuguesa. "A situação não melhorou, agravou-se", diz João Ferreira ao lembrar as intervenções de EUA e UE. "Os destinos da Venezuela devem ser decididos pelo povo venezuelano e não por Donald Trump ou Bolsonaro", conclui o parlamentar que ironiza: "O que interessa é que o petróleo jorre para o sítio certo".
Já Marisa Matias defende que é preciso estar ao lado do secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, e de Federica Mogherini, a chefe da diplomacia europeia. A eurodeputada do Bloco de Esquerda esclarece que decidiu votar contra a resolução "por uma questão de princípio democrático". "Não se pode corrigir um desastre com uma asneira", diz lembrando que "o Parlamento Europeu não tem legitimidade para reconhecer Guaidó, é uma ingerência total". "O Parlamento Europeu decidiu lançar achas numa fogueira", conclui.
António Marinho e Pinto aponta o dedo a alguns países de estarem a tentar impor os seus interesses na questão venezuelana, nomeadamente a Espanha. "Porque é que a UE não toma as mesmas medidas em relação à Arábia Saudita?", questiona o eurodeputado. "Nós temos de ter alguma coerência e honestidade intelectual na abordagem dos factos", salienta Marinho e Pinto dizendo que a oposição venezuelana está "a mando de alguém". Em jeito de lamento, António Marinho e Pinto diz que lhe "custa ver a União Europeia a juntar-se a Donald Trump ou a Jair Bolsonaro". "O que esta situação aconselha é a que se promova o diálogo e não a guerra. O Parlamento Europeu está a dar um passo muito mau e que Portugal embarque neste caudal é muito perigoso. O silêncio sobre a Arábia Saudita deita por terra qualquer argumento contra Maduro ou a favor de Guaidó, um presidente não se autoproclama, mesmo que porventura houvesse motivos. Não é disso que resulta a legitimidade política", conclui Marinho e Pinto.