Do "sarilho" ao "clube restrito do espaço". O único satélite português foi lançado há 30 anos
Fernando Carvalho Rodrigues, considerado o 'pai' do primeiro satélite português, lembrou que "se ganhou consciência de que, em Portugal, havia tecnologia e ciência para que o país entrasse no clube restrito do espaço".
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Assinalam-se esta terça-feira 30 anos desde que Portugal colocou em órbita aquele que é, até agora, o único satélite português.
A 26 de setembro de 1993, o foguetão Ariane 4 descolou de Kourou, na Guiana Francesa, com o PoSat-1. O desenvolvimento do equipamento resultou de um consórcio entre várias empresas e universidades portuguesas.
O professor Fernando Carvalho Rodrigues foi o coordenador do PoSat-1, e apelidado de 'pai' do satélite. Em declarações à TSF, Carvalho Rodrigues lembrou o início do processo, que passou por "ganhar consciência de que, em Portugal, havia companhias, indústria, e havia tecnologia e ciência que, se agregadas, eram capazes de fazer com que Portugal entrasse no clube que, naquela altura, era restrito, do espaço".
O caminho para o desenvolvimento do PoSat-1 começou bem antes de Portugal aderir à ESA, a Agência Espacial Europeia, que aconteceu no ano 2000. O trabalho foi intenso mas, para Fernando Carvalho Rodrigues, houve um momento em que finalmente tomou consciência da importância do que estava a acontecer. "O senhor que veio assinar o contrato da Arianespace, no final de eu assinar, disse, 'você é que é o responsável pelo satélite'. Porque, quando assinamos um contrato de lançamento, assinamos o momento, o dia, a hora, o minuto, o segundo... E esse senhor abre uma estojo com um relógio normalíssimo. Mas dentro tinha um mostrador, prateado, e dizia Arianespace. Abre o relógio, coloca-o à minha frente e disse: 'agora tenho este relógio para lhe dar, para o senhor ver o tempo passar'. E eu, nesse momento, é que caí em mim, e vi o sarilho em que estava metido. Porque, cada dia de atraso por não ter o satélite pronto era uma quantidade enorme de dinheiro", explicou Fernando Carvalho Rodrigues.
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Finalmente, quando o relógio marcava 2h45 em Portugal continental, do dia 26 de setembro, o PoSat-1 seguia rumo ao espaço. O professor Fernando Carvalho Rodrigues lembra que havia muita tensão na sala de controlo de lançamento porque "ou lançávamos naquele instante, ou só lançávamos dali a alguns meses. Depois, quando o foguetão começa a voar, mesmo cheios de medo, temos de estar muito tranquilos porque temos de seguir vários parâmetros para ver se está tudo bem, para ver se é preciso fazer algumas correções, e aquilo demora 25 minutos, até os satélites serem colocados nas órbitas. O pior que há, quando estamos a lançar um objeto destes para o espaço, é quando se está desocupado. O pior dia na base de lançamento, naqueles meses em que lá estivemos, era o domingo. No domingo a base estava fechada", destaca Fernando Carvalho Rodrigues.
Depois do PoSat-1, houve projetos para o envio de um segundo satélite e para a construção de uma rede de satélites. Já neste século, o regresso ao espaço tem sido falado e, em fevereiro do próximo ano, está previsto o lançamento de um satélite a bordo da Falcon, da Space-X. E sobre se Portugal tem futuro no espaço, Fernando Carvalho Rodrigues não tem dúvidas. "Claro que sim. O futuro da humanidade é andar em estradas. Os romanos inventaram as estradas terrestres. Antes dos romanos não havia estradas. Agora temos as estradas das telecomunicações, em que a informação vai separada de comunicar", remata o 'pai' do primeiro satélite português.
O trabalho de Fernando Carvalho Rodrigues no desenvolvimento do PoSat-1 ainda é lembrado nos dias que correm. Esta segunda-feira, a ministra da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior entregou a medalha de mérito científico ao professor catedrático, a propósito dos 30 anos do lançamento do satélite, numa conferência organizada pela Agência Espacial Portuguesa.