A presidente da Fundação GIMM, e investigadora que dedicou parte importante da vida ao estudo da malária, lamenta na Grande Entrevista TSF-JN, que os maiores problemas da ciência em Portugal, continuem a ser a falta de previsibilidade e o subfinanciamento.
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A fundação GIMM junta os antigos Instituto Gulbenkian de Ciência, e a Fundação Calouste Gulbenkian, por um lado, o Instituto de Medicina Molecular, e a Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, por outro, acrescentando a Fundação La Caixa, do grupo espanhol Caixabank, dono do BPI, e a Arico, a holding da família Soares dos Santos, dona dos supermercados Pingo Doce.
Maria Manuel Mota, diz que estes parceiros trazem complementaridade ao trabalho dos investigadores e dos financiadores, para objetivos que são comuns. “A ciência é feita desta diversidade, deste encontro de ideias e, portanto, a esse nível, é fantástico”, acrescenta a cientista.
A presidente da Fundação GIMM explica que a única divisão que existe na estrutura que foi desenhada, consiste na criação de dois programas que se traduzem em duas abordagens diferentes a temas que podem sobrepor-se. Maria Manuel Mota acrescenta que o primeiro programa chama-se “Descoberta” e o outro, o programa “Care”, que “vem da ideia de cuidar dos outros”. O primeiro é “impulsionado pela paixão da descoberta, pela curiosidade dos seres humanos” permitindo a todos os investigadores estudar “os diferentes aspetos ligados a doenças ou ao planeta, mas sempre “impulsionados pela paixão que têm, pela sua curiosidade”. O programa “Care”, é impulsionado pelo espírito de missão. “Curiosidade, mas acima de tudo, espírito de missão”. Apesar de falar em divisão, Maria Manuel Mota diz que esta divisão também pode transforma-se em interação. Como os dedos das mãos “que se entrelaçam e de vez em quando, aprendam uns com os outros, porque nós sabemos que nada na vida, é feito de divisões, mas num contínuo”.
Quanto ao financiamento, será repartido pelos fundadores, e não haverá financiamento público, além daquele que é feito diretamente a investigadores pelos projetos a que se candidataram.
“Muitos dos nossos investigadores, cerca de 14”, detalha Maria Manuel Mota “vão estar ligados a outras instituições académicas, portanto, os seus salários vão ser pagos pelas instituições académicas que os empregam”. A presidente da Fundação GIMM dá os exemplos da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, mas também do ISPA (Instituto Universitário de Ciências Psicológicas, Sociais e da Vida), o Instituto Superior Técnico, e outras instituições. Maria Manuel Mota explica que são instituições académicas que têm todo o interesse em que os seus investigadores tenham um ambiente muito rico em termos de investigação e, ao mesmo tempo, possam transmitir esse conhecimento nas suas Instituições”. A cientista acrescenta que “muitas vezes, o objetivo é que estejam GIMM a fazer investigação por uns tempos e ao fim de um de uns anos, possam estar na instituição mãe, tornando o processo extremamente dinâmico.
Questionada pela TSF e pelo Jornal de Notícias, Maria Manuel Mota continua a defender duas fragilidades, na política de fincamento público para a ciência, em Portugal. Por um lado, a falta de previsibilidade, por contraste com outros países em que os investigadores sabem que, em determinados momentos do ano, podem candidatar-se a bolsas ou programas de investigação. “A principal queixa que foi sempre feita por nós”, explica Marial Manuel Mota “é o facto de nós não sabermos com que contamos”. No exemplo dos Estados Unidos que é usado pela investigadora como o mais tradicional, esse período de candidaturas acontece “sempre na mesma altura desde os anos 50 que os BAA da National Science Foundation - que é o equivalente à nossa FCT, mas só para a parte de ciências da vida, saúde, et cetera - tem sempre períodos por ano, a 5 de fevereiro, 5 de junho e 5 de outubro. Tudo já mudou: antes as candidaturas seguiam por correio, depois por correio eletrónico, e mais recentemente através de um site específico. Obviamente tudo mudou, mas não as datas. A previsibilidade é mantida”.
Outro problema do financiamento da investigação científica em Portugal, reconhece Maria Manuel Mota, é o subfinanciamento crónico. Na luta constante dos últimos anos, dos cientistas, a cientista reconhece culpas da classe. “Nós achamos sempre que a imprevisibilidade era tão importante e que nunca conseguíamos vencer esse lado do financiamento público”. Maria Manuel Mota lembra que “nunca passamos ao passo seguinte, mas o passo seguinte, eu acho que devia ter sido o primeiro. O subfinanciamento é claríssimo e nós nunca atingimos a meta de 3% do PIB na ciência. Isso estava prometido para 2020 e está prometido há tanto tempo e a verdade é que nós nunca conseguimos atingir esse valor e acho que esse valor seria um sinal do Estado que os privados precisam de ver".
Maria Manuel Mota está há muito ligada à investigação do parasita que é o responsável pela transmissão da malária, uma doença que causa milhares de mortes, todos os anos, no mundo. Poderia pensar-se que as novas funções de gestão da Fundação GIMM, a afastariam do laboratório e da investigação. Mas a investigadora garante que continua a ser cientista. “Eu tenho necessidade e acho que a instituição também quer que eu continue a ser cientista. Portanto, eu mantenho um grupo de investigação mais pequeno de que o que costumava ser. Mesmo falando com o nosso Scientific Advise Board, que são cientistas em todo o lado do mundo, eles dizem-me - tens que manter a tua atividade científica; tens de continuar a ser cientista para trazeres esse lado de paixão, de curiosidade”.
