Mosquito descoberto na Islândia "é endémico em Portugal", mas "alterações climáticas podem estar a levar a um deslocamento"
Carla Sousa, do Instituto de Higiene e Medicina Tropical, aponta as alterações climáticas como uma das causas para terem sido encontrados mosquitos na Islândia
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A Islândia registou, pela primeira vez, a presença de mosquitos no país, sendo que a espécie descoberta, a Culiseta Annulata, é "endémica em Portugal". À TSF, Carla Sousa, a Unidade de Parasitologia Médica do Instituto de Higiene e Medicina Tropical da Universidade NOVA de Lisboa explica que as alterações climáticas estão a forçar um "deslocamento das áreas de distribuição destes animais.
Três mosquitos, duas fêmeas e um macho, da espécie Culiseta Annulata foram encontrados numa localidade a norte da capital do país, Reykjavik. Os habitats da Islândia, com muitos pântanos e lagoas, sempre foram propícios à reprodução destes insetos, mas o clima rigoroso era um entrave ao seu desenvolvimento. Mas, se no país nórdico esta espécie era desconhecida, por cá o mosquito é bastante conhecido. Carla Sousa, da Unidade de Parasitologia revela que esta espécie "é endémica de Portugal".
"Há registo da sua presença em muitos locais de Portugal. [...] É a espécie [...] que frequentemente pica humanos, e que às vezes até encontramos durante períodos de menor calor", explica.
As alterações climáticas, cada vez mais vincadas, têm feito aumentar a temperatura do país. Na Islândia, as temperaturas têm subido a um ritmo quatro vezes superior ao do resto do hemisfério Norte e isso pode ser uma das causas para terem sido encontrados estes mosquitos.
"Talvez as alterações climáticas estejam a ter um impacto profundo. E o que está a acontecer não é específico dos mosquitos. [...] As alterações climáticas estão a fazer um deslocamento das áreas de distribuição das diferentes espécies. [...] e, com isso, onde já há adequabilidade climática, as densidades das espécies podem estar a aumentar ou a diminuir", sublinha Carla Sousa.
A presença de mosquitos naquela zona era algo que os cientistas já previam que pudesse acontecer, já que vários habitats têm todas as condições para o desenvolvimento destes insetos, mas, até agora, as temperaturas baixas não permitiam a sobrevivência da maioria das espécies. A professora do Instituto de Higiene e Medicina Tropical explica, contudo, que "qualquer espécie tem alguma plasticidade genética".
"Muitas vezes, juntamente a isso, associam caraterísticas que os tornam particularmente favoráveis a serem transportados por meios humanos. E isso também facilita a sua dispersão", aponta.
A par disto, a professora refere que em causa estão também aspetos "circunstanciais" que podem contribuir para a migração deste tipo de animais: por exemplo, aqueles insetos que vivem "associados ao Homem" podem encontrar no "meio humanizado" algumas condições que "mitigam as caraterísticas ambientais exteriores".
"Depois, também temos de ter ideia que, uma coisa é um inseto chegar a uma determinada localização e ser lá detetado. Outra coisa é ele conseguir estabelecer-se", sublinha.
Ainda assim, por agora, os islandeses podem ficar descansados. Ainda não vão precisar de repelente. "Não vão chegar a esse ponto [de usar repelente], até porque, quando uma espécie é recém-estabelecida, as densidades [de mosquitos] são sempre relativamente baixas, e o facto de existirem estes dois momentos, a chegada e o estabelecimento, faz com que as autoridades de saúde, e outras, especialmente naquelas com importância em medicina humana, possam atuar, aplicar medidas de controlo vetorial e impedir o estabelecimento da espécie" afirma Carla Sousa.
Com o aumento das temperaturas no globo, várias espécies invulgares têm sido encontradas na região da Islândia. Por exemplo, o degelo dos glaciares tem contribuído para o aparecimento de peixes de climas mais quentes naquela zona. Este ano, no Reino Unido, foram também descobertos ovos de mosquito da Febre Amarela e Tigre Asiático.