Qual a figura e o acontecimento do ano 2018? A opinião de Raquel Vaz Pinto, investigadora do IPRI-NOVA.
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A minha escolha para a figura internacional de 2018 não pode ser outra senão a do Presidente da Federação Russa, Vladimir Putin. Tal como não tive dúvidas sobre Xi Jinping em relação a 2017, o ano que passou foi claramente de Putin. Em primeiro lugar, a sua "reeleição" e a organização sem falhas do Campeonato Mundial de Futebol. A imagem da Rússia foi projetada para todo o globo e até a seleção russa decidiu ajudar, surpreendendo todos com a sua presença ... nos quartos-de-final.
Em 2018, tivemos envenenamentos em solo britânico, confirmação da ciber-intervenção na questão catalã, referência constante na imprensa e na investigação especial dos EUA sobre as eleições de 2016, o avanço da construção do segundo pipeline de gás natural para a Alemanha e a manutenção do apoio e financiamento de todos os «extremos», "populistas", "insurgentes" e "anti-sistema" no âmbito da UE.
Para Kiev, a guerra continua na sua fronteira oriental e os seus navios são bloqueados no estreito de Kerch. Como se tudo isto não fosse suficiente, o apoio russo tem sido determinante na manutenção no poder de Bashar al-Assad em Damasco.
É claro que Putin conta com um extraordinário diplomata e seu Ministro dos Negócios Estrangeiros, Sergei Lavrov, e esta é uma das chaves do sucesso da sua política externa.
Resta ver se em 2019, como diria o José Milhazes, se tudo isto é sustentável económica e financeiramente.
A minha escolha para acontecimento internacional de 2018 recai sobre o jornalista eslovaco Jan Kuciak que, em fevereiro, foi encontrado assassinado em sua casa juntamente com a sua noiva. Confesso que tive muitas dificuldades em escolher este jornalista em detrimento de outros. Por exemplo, a coragem extraordinária de dois jornalistas da Reuters, Wa Lone e Kyaw Soe Oo, que demonstraram a barbárie cometida sobre os Rohingya na Birmânia, e que foram detidos, «julgados» e condenados a 7 anos de prisão.
Fazer jornalismo de investigação em países não democráticos como a Birmânia, a Turquia, a Rússia é na maior parte dos casos uma sentença de morte. Mas a minha escolha de um jornalista eslovaco tem o objetivo de demonstrar que cercear e tentar quebrar jornalistas não é apenas apanágio de ditaduras. A Eslováquia é um estado-membro da União Europeia tal como Malta, onde em outubro do ano passado foi assassinada outra jornalista, Daphne Caruana Galizia. O que tinham Daphne e Jan em comum? As suas investigações sobre corrupção. E se olharmos para a Hungria verificamos o quase-controlo da imprensa levado a cabo paulatinamente por Viktor Orban e seus cúmplices. E poderíamos citar mais tristes exemplos.
Em matéria de liberdade de imprensa lembro-me sempre de um dos meus heróis: Lasantha Wickramatunga do Sri Lanka assassinado em 2009. Um jornalista que sabendo o que o esperava depois de vários ataques preparou-se escrevendo um editorial-obituário: "Eu espero que o meu assassínio não seja visto como uma derrota da liberdade, mas como uma inspiração para aqueles que sobrevivem para redobrarem os seus esforços".