A seis meses da data prevista para a saída do Reino Unido da UE, o processo continua a marcar passo. Sabe o que está em causa, o que pode mudar e porque é que a questão se arrasta? Leia aqui tudo o que precisa de saber sobre o atual impasse na questão do Brexit.
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O Brexit é uma decisão definitiva?
O governo do Reino Unido e o partido trabalhista dizem que o Brexit vai acontecer. Existem alguns grupos em campanha para que o processo seja interrompido e seja realizado um segundo referendo, mas os políticos eleitos do Reino Unido estão empenhados no processo. Se não houver, no entanto, um acordo, o partido trabalhista, liderado por Jeremy Corbyn, defende a realização de eleições antecipadas ou mesmo de um outro referendo. Corbyn diz que é inconcebível uma saída sem acordo, seria um desastre nacional.
Em que ponto está todo o processo?
Em dezembro do ano passado o Reino Unido e a União Europeia entenderam-se quanto às três questões mais importantes do "divórcio". Primeiro, quanto é que o Reino Unido deve à UE; em segundo, como se vai resolver o problema da fronteira da Irlanda do Norte; por último, o que vai acontecer com os cidadãos europeus que moram no Reino Unido.
Neste momento, os dois lados estão concentrados nas relações que vão ter lugar depois da separação e nos detalhes para evitar uma fronteira física entre as duas Irlandas. Para ganharem mais tempo, e tentando facilitar o caminho para as relações pós-Brexit, concordaram num período de transição de 21 meses. Durante esse período, o Reino Unido continuará a integrar o mercado comum e a beneficiar da união aduaneira, apesar de já não ser um membro da UE. Londres deixa de ter poder de representação ou de decisão junto das instituições comunitárias.
O governo britânico definiu, entretanto, a forma como pretende que as relações futuras funcionem, mas esse plano - conhecido como Chequers por ter sido definido na residência de campo da Primeira-ministra, que tem o mesmo nome - enfrentou críticas, tantos dos ativistas anti-Brexit, como de importantes figuras que defendem a saída. A União Europeia também diz que será dificil aplicá-lo.
O que prevê o Plano Chequers?
O plano foi aprovado a 6 de julho e propõe uma zona de comércio livre para os bens industriais e produtos agrícolas, mas sem liberdade de circulação de pessoas ou serviços. A zona de comércio livre destina-se a evitar controlos de alfândega e manteria aberta a fronteira irlandesa.
O governo britânico diz que esta é a única forma de concretizar o Brexit sem prejudicar a economia, mas os adversários dos dois lados não estão de acordo. Uns dizem que provoca uma rutura muito brusca com a União Europeia, outros defendem que a proposta mantém um vinculo entre Londres e Bruxelas.
Boris Johnson, um dos defensores mais destacados do Brexit durante o referendo de 2016, e que abandonou o governo depois da aprovação do Chequers, diz que a proposta é uma humilhação moral e intelectual porque mantém a convicção de que é mais seguro e mais fácil manter parte da vida do Reino Unido a ser governada pela UE, apesar de o país já não estar na União.
O que separa Londres e Bruxelas em relação ao Chequers?
A proposta de Theresa May foi rejeitada pelo presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, com o argumento de que não vai funcionar e prejudicará o mercado único. Já Angela Merkel defendeu que o acordo sobre a futura relação entre a União Europeia e o Reino Unido tem de ser o mais concreto possível. A chanceler alemã voltou a frisar que o Governo britânico não pode escolher apenas os aspetos do mercado único que lhe interessam.
Theresa May queixou-se de Donald Tusk por este não ter detalhado a rejeição da proposta britânica, nem sequer ter oferecido uma alternativa consistente. A Primeira-ministra alegou ainda que a União apenas ofereceu duas opções inaceitáveis: uma que implicaria a permanência na união aduaneira, e outra que seria um acordo de comércio livre, mas que consideraria a Irlanda do Norte como parte do mercado único.
Qual o peso da questão fronteiriça da Irlanda do Norte no acordo de saída?
A dificuldade em conseguir um entendimento neste aspeto tem sido um dos principais travões ao Brexit. O negociador europeu, Michel Barnier, esclareceu que não há acordo de saída até estarem resolvidas as divergências quanto à situação na Irlanda.
Bruxelas lembrou que os 27 têm um dever de solidariedade com a República da Irlanda, e uma obrigação de proteger o mercado comum. Theresa May já garantiu que não aceita nada que ponha em causa a integridade territorial e constitucional do Reino Unido.
Os prazos de negociação vão ser cumpridos?
Dificilmente. As negociações deviam estar concluídas a tempo de um projeto de acordo poder ser aprovado no Conselho Europeu de 18 de outubro, mas essa hipótese já foi afastada. Bruxelas adiou o prazo até ao fim de dezembro e Donald Tusk propôs a realização de uma cimeira extraordinária sobre o Brexit em novembro.
Se até ao final do ano não houver entendimento, será difícil conseguir concluir todo o processo até 29 de março. Não basta a assinatura dos lideres europeus, o documento também terá de ser votado no Parlamento Europeu e ratificado pelas assembleias nacionais dos 27.
Em Londres, o acordo também tem de passar pela Câmara dos Comuns.
E se não houver um acordo para o Brexit?
Após a rejeição do plano Chequers pelo presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, e depois da reunião em Salsburgo, tem havido uma crescente especulação de que o Reino Unido poderá deixar a União sem um acordo. Uma das frases repetidas por Teresa May é que nenhum acordo é melhor do que um mau acordo.
Sem um acordo comercial, o Reino Unido vai lidar com a UE sob as regras da Organização Mundial do Comércio, o que pode implicar verificações alfandegárias e tarifas sobre mercadorias, bem como verificações de fronteira mais longas para os viajantes. O governo de May tem alertado as empresas para o possível aumento da burocracia e aconselha-as a contratar especialistas em questões alfandegárias.
Os consumidores britânicos vão pagar mais caro pela utilização do cartão de crédito na União Europeia. As empresas no espaço europeu podem deixar de ter acesso aos bancos de investimento em Londres e os expatriados britânicos, que vivem nos outros 27 países, podem perder acesso aos fundos de pensões ou contas bancárias no Reino Unido.
Existe a preocupação de que os britânicos que vivem no exterior na UE possam perder também os direitos de residência e o acesso a cuidados de saúde de emergência gratuitos.
Por tudo isto, a possibilidade de não existir um acordo está a tentar ser evitada, a todo o custo, pelos dois lados, que querem um divórcio tão amigável quanto possível. Não será a primeira vez que negociações parecem estar à beira de um abismo para depois se conseguir um acordo, mesmo em cima do final do prazo.