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Estamos nos cocurutos de Portugal, em Gimonde, Bragança. Aqui só vem quem sabe ao que vem. Incluo-me nesse grupo feliz de muito poucos. Faço-o com honra e garbo, pois é terra de boa gente e muitos prodígios. Quis o destino que aqui viesse a pertencer. O Dom Roberto, em Gimonde, é identitário para todo e qualquer português. Não há português que não reconheça aqui as raízes da sua existência. As carnes suplantam os peixes no cardápio, o que é fácil de aceitar. Por outro lado, o porco, o bovino e o caprino assumem por estas paragens o supremo da qualidade e do rendimento de sabor.
Damo-nos logo conta disso quando saboreamos uma alheira de porco bísaro assada. Maravilhosa também a chouriça de porco bísaro assado. Duas delícias que só fazem pleno sentido quando harmonizadas com pão de trigo e centeio de Gimonde. Não estivéssemos nós nos terrenos de Elizabete Ferreira, criadora e responsável da Padaria Pão de Gimonde, eleita há pouco como a melhor padaria do mundo. É, além disso, a primeira vez que o título é atribuído a uma mulher. Estamos, portanto, em território sagrado.
Os pratos de peixe restringem-se ao bacalhau, como de resto seria de esperar. Há bacalhau cozido, de excelente qualidade, assessorado por belas verduras, batata e ovo, a que na gíria chamamos “com todos”. Sabe pela própria vida. O outro prato de peixe do Dom Roberto é… bacalhau assado no forno, delícia que aprimorada pelo excelente azeite virgem extra local nos eleva ao céu. A posta à Dom Roberto é uma peça de carne de grande gabarito, normalmente processada no forno a lenha e que só por isso configura eternidade. De safra semelhante é a fantástica costeleta de vitela, também sacralizada em forno a lenha. Não consigo deixar de ressalvar a glória do Cordeiro Bragançano assado, uma carne que depois da primeira experiência nunca mais conseguimos dispensar. Goza por isso mesmo de popularidade crescente. E é muito saborosa. Por estas paragens, há muito javali, tanto pela abundância de matéria-prima como pelas muitas batidas que acontecem, visando a redução do efetivo da raça a um tempo amada e odiada. Certo é que o arroz de javali que o Dom Roberto prepara é prodigioso e tem um tal acerto de temperos que nos vicia logo na primeira garfada. Faz-se uma perdiz estufada de enorme delicadeza e requinte, e o cozido à Dom Roberto é absolutamente inesquecível.
Para sobremesa, deliciamo-nos com um fantástico pudim de castanhas, ou com milhos doces com compotas de produção inteiramente caseira. Maravilhoso sentido de abundância e riqueza, que fica para sempre no coração.