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Começou em 1988 e parece que esteve sempre ali. Confesso a minha inabilidade para estabelecer antiguidades em restaurantes, para mim os bons são eternos. O Solar dos Nunes existe por isso desde sempre e sempre ali estará. Virtude do genial anfitrião que é José António Nunes, proprietário. Há petiscos prontos a consumir, servidos com garbo. Belíssimo paio de Serpa fatiado, por exemplo, assim como bom presunto. Sou fã das gambas al ajillo da casa, sabem a eternidade. E é excelente a frigideira de mexidos com farinheira, ovos mexidos com a cremosidade certa e o enchido de boa criação e muito bem tratado. Era bom que assim fosse sempre, mas só aqui me sabe bem.
Entremos no reino de Neptuno para aceitar a empreitada suave e sápida dos pratos de peixe. Encabeça os meus favoritos no domínio oceânico a sopa rica de peixes. A composição varia ao longo do ano, mas a textura fina e aveludada é constante. Sabor profundo, quase configura refeição completa. O bacalhau à Tia Narcisa é uma variante canónica da receita original do bacalhau à moda de Braga e é de execução primorosa. A cataplana de cherne e lagosta é um prato com história neste solar exemplar e representa grande riqueza de sabor, na forma suculenta e apaladada. E há um caldo de robalo com poejos à alentejana que encanta. Pede vinho branco vigoroso, o que é desejo fácil de satisfazer, graças à boa garrafeira que esta casa tem.
Nos pratos de carne, todos os valores são seguros. Gosto muito do entrecôte de novilho na tábua, carne imaculada, temperos divinos. Pontificam também os lombinhos de porco ibérico, que gosto de acompanhar com puré de batata. É muito bom o cabritinho do monte no carvão e as costeletas de cordeiro à moda da quinta tornam só por si a refeição inesquecível.
A caça tem aqui promontório de gabarito desde o início. Basta debicar a perdiz frita à moda de Serpa para ver que é mesmo assim. Sou fã incondicional da lebre no pote com feijão-branco que aqui se faz. E há uma alheira de caça que é imperdível.
Nas sobremesas encontramos várias tentações que vão prolongar na perfeição o prazer da mesa. A sericá d’Elvas com ameixa é gloriosa. A encharcada de Mourão é perfeita. O bolo de bolacha é popular e consensual, como deve ser. E o arroz-doce da avozinha é toda uma iniciação à doçaria tradicional portuguesa. Perder-se nesta esquina feliz de Lisboa é encontrar-se com a vida.