Há 50 anos, foi plantada em Melgaço a primeira vinha contínua de Alvarinho. Soalheiro era o nome da parcela, que gerou um caso de sucesso exemplar e ligação ao território pelas mãos da família Cerdeira
Corpo do artigo
O Soalheiro Primeira Vinhas, um vinho icónico lançado em 2006, é o reflexo do porfiado labor, visão e sentido de inovação da família Cerdeira.
À época, a opção de João António Cerdeira foi considerada uma «loucura»: o Alvarinho era plantado na bordadura dos campos e foi um risco plantar, no ano de 1974, em Alvaredo, a primeira vinha contínua daquela casta em Melgaço. A parcela com forte exposição solar deu nome à marca, hoje símbolo de inovação e sustentabilidade, conceitos que não são mera retórica, antes ganharam expressão autêntica na região, quando não eram ainda tão apregoados.
O Clube de Viticultores, agregando cerca de 200 pequenos produtores consagrados pela imagem e currículo na obra ‘Manta de Retalhos’, por ser essa a imagem aérea sugerida pelo conglomerado de pequenas parcelas, reflete esse carinho e apego às gentes de Melgaço. Um exemplo – hoje, infelizmente, raro – de humanismo.
O ‘casamento’ do Soalheiro com o território é uma imagem de marca feita de inovação graças ao espírito irrequieto e inconformista de Maria João e de Luís Cerdeira, os irmãos que transformaram o legado do pai, que «teve uma fantástica ideia»,
realça o primogénito, num caso de crescente sucesso. Para orgulho e felicidade da mãe Palmira, a professora de outros tempos, que hoje recorda «a emoção da plantação da primeira vinha».
As primeiras garrafas foram rotuladas, no ano de 1982, em processo manufaturado, «durante serões que terminavam em ‘chocolatadas’ à espanhola», relembra a matriarca da família.
Desde então o Soalheiro não parou de crescer, com os pés assentes num território, que tem sabido promover e valorizar.
«A subsistência era o mote da agricultura naquele tempo; hoje o Alvarinho é o ouro», realça Luís Cerdeira, aludindo à valorização das vinhas graças a uma viticultura de qualidade. As certificações alimentar e ambiental traduzem os cuidados postos na produção, norteada pela inspiração, para desse modo conseguir a desejada diversidade.
No Soalheiro, primeiro produtor a fazer espumante na região, em1995, inovar representa valor, exige experiência e conhecimento, bases de uma enologia que revela método e rigor.
Com liberdade criativa e responsabilidade, a dinâmica, jovem e bem preparada equipa corresponde de forma coesa aos desígnios da empresa, detentora de um portefólio diversificado traduzido em Clássicos; Espumantes; Bio; Territórios e Inovação, que ilustra riqueza de propostas,
Primeiras Vinhas em prova vertical
A empresa tem continuado a dar forte contributo à valorização da região onde teve origem. O Primeiras Vinhas, cuja colheita inicial é datada de 2006, foi um marco na região, ao valorizar o património que são as vinhas velhas em Monção e Melgaço.
A estratégia de incluir 15 por cento de barrica – os restantes 85 por cento fermentaram em depósito de inox com levedura espontânea -- reforçou a estrutura e consistência do Alvarinho, num ano quente, marcado por menor acidez.
O ano de 2008 foi de excelência, graças a uma maturação muito lenta originada por um mês de agosto frio. Aromas e acidez vibrantes, neste vinho com boa estrutura e muita tensão.
A colheita seguinte – 2009 – originou um vinho elegante, muito equilibrado com intensidade aromática.
Na prova vertical de uma dezena de colheitas, de vindimas e anos diferentes, sobressaiu a elegância de um vinho produzido com tal precisão que faz dele um símbolo do Soalheiro.
A produção superior à média em 2011 não foi óbice em termos de qualidade, sobressaindo o perfil aromático. Quatro anos depois, uma colheita mítica, com o ano de 2015 a refletir a evolução do Alvarinho, estabelecendo, em termos de viticultura, um padrão para as vinhas com idade superior a 35 anos.
Com um bom potencial de guarda, o Primeiras Vinhas 2018 revela um perfil fresco, acidez marcante, com aromas vincados e boa textura na boca.
Salinidade e madeira no ponto ideal caraterizam a colheita de 2019. Mais encorpada, com notas algo doces e menor acidez, a colheita de 2020 revelou potencial de evolução.
No ano seguinte, outro vinho para guardar: o único Primeiras Vinhas com menor teor de álcool – 12,5 por cento --, com muita frescura e boa estrutura.
O conhecimento das parcelas e o controlo dos detalhes na vinificação foram fatores preponderantes para a produção, em 2022, de eum vinho com muita personalidade: boa estrutura, acidez bem presente, cremoso na boca: um alvarinho que dá grande prazer e realça o trabalho de precisão efetuado no domínio da enologia.
A Casa das Infusões
Noutro âmbito, o enoturismo do Soalheiro é hoje uma referência na sub-região de Monção e Melgaço. Visitas á moderna e modelar adega, provas de vinhos e alojamento, recente mais-valia do conjunto, bem integrado nas vinhas, a meio da encosta sobranceira ao rio Minho.
Um cenário magnífico onde está inserida a rústica Casa das Infusões, com três quartos, vizinha das plantações de ervas aromáticas, que exprimem ‘The Pur Terroir’: infusões e tisanas.
A oferta no domínio do enoturismo é alargada à Quinta de Folga, para apreciar, mediante reserva para grupos, para além da soberba panorâmica, o fumeiro de Melgaço de produção própria e saborear uma refeição minhota por excelência, harmonizada com vinhos Soalheiro, com vários perfis, que revelam trabalho incessante na procura de diversidade.
«O sonho continua sempre», sublinha Luís Cerdeira, olhando o futuro com determinação.
