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Lisboa, 02 jul 2019 (Lusa) - O advogado que negociou os contratos da petrolífera Anadarko com Moçambique considera que o país vai ter de fazer "um enorme esforço" de formação de quadros para os megaprojetos, alertando que isso ainda não foi feito.
"Vai ter de ser feito um enorme esforço para que Moçambique possa formar mais pessoas que possam estar à altura da exigência destes projetos. É um caminho que Moçambique tem de fazer que não foi feito ainda, que é uma aposta forte na formação de quadros", disse o sócio da sociedade de advogados Miranda responsável pelo Grupo de Jurisdição de Moçambique.
Em entrevista à Lusa, o também presidente do Conselho de Administração da Miranda Law Firm e líder do grupo de advogados que trabalha para a petrolífera norte-americana Anadarko há mais de dez anos, antevê que os megaprojetos em curso no país vão construir-se nos prazos previstos, mas salientou que o país tem dois grandes desafios pela frente.
"Em primeiro lugar, Moçambique não pode deixar de aproveitar as muitas outras valências e riquezas que tem, do ponto de vista económico não pode deixar de as aproveitar, desde logo na agricultura", respondeu Diogo Xavier da Cunha quando questionado se o país está preparado para os grandes investimentos e receitas que se avizinham no setor do gás, que considerou serem "um grande desafio" para o país.
Depois, acrescentou, há a questão da lei do conteúdo local, que define o grau de envolvimento mínimo das empresas e mão de obra moçambicanas nos megaprojetos que estão a ser lançados na área do gás natural liquefeito.
"Aí vai ter de ser feito um esforço enorme", não só na formação de quadros, mas também na promoção da integração dos empresários nas cadeias de valor e "a produção de bens e disponibilização de serviços por parte de empresas moçambicanos", disse o advogado.
"É uma matéria tão sensível que, mesmo a nível interno, não se tem conseguido gerar consenso no país acerca de como deve ser feita e que medidas a lei deve ter em concreto", concluiu.
A ligação da Miranda Law Firm à petrolífera norte-americana Anadarko começou no final de década de 2000, poucos anos depois de a empresa ter entrado em Moçambique, em 2005, lembrou o advogado, que é também o líder do grupo de trabalho que nesta sociedade de advogados trata das questões jurídicas relacionadas com Moçambique.
"Começámos a trabalhar em 2012 nas questões de estruturação do projeto do gás natural, primeiro com o contrato de exploração, depois com os regimes jurídicos específicos e depois na discussão com o Governo em 2013 e 2014 sobre o regime legal especial para o que ficou conhecido como o projeto da bacia do Rovuma", disse Diogo Xavier da Cunha.
Para além disso, a Miranda trabalhou também com a Anadarko sobre os aspetos legais das instalações marítimas do projeto, o terminal internacional de gás natural liquefeito, usando cerca de 30 advogados em Lisboa e a parceira em Moçambique, a sociedade Pimenta e Associados, liderada por Paulo Pimenta.
"Também colaborámos em matérias laborais e pedidos vinculativos especiais em que era necessário ter o conforto do fisco moçambicano relativamente à correta interpretação de algumas questões com implicações muito relevantes na parte económica do projeto, e demos apoio e discutimos com o Governo um acordo mais protocolar acerca de licenciamentos, vistos e questões relacionadas com o desembaraço aduaneiro dos equipamentos" que serão essenciais para a exploração de gás natural no norte do país, vincou.
Questionado sobre o empenho do Estado moçambicano em facilitar as negociações e sobre como a questão das dívidas escondidas afetou as negociações, o advogado disse que Moçambique mostrou uma enorme vontade em acolher investimento externo, mas que foi duro nas negociações, contratando advogados de grande qualidade.
"A vontade do Estado em facilitar este projeto é inexcedível, porque é um projeto que pode mudar tudo no que diz respeito a Moçambique", concluiu o advogado na entrevista à Lusa, na sequência da aprovação pela Anadarko da Decisão Final de Investimento para o projeto da bacia do Rovuma, no valor de 20 mil milhões de dólares, cerca de 17,6 mil milhões de euros.