Malik Jalal é um paquistanês que diz estar na "lista para matar" dos Estados Unidos. Sobreviveu a 4 mísseis e, apesar de ser ele o alvo a abater, teme pelo que possa acontecer à família.
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O paquistanês, nascido na crítica zona do Waziristão, faz o relato na primeira pessoa num artigo reproduzido pelo jornal inglês Independent.
"Estou na estranha posição de saber que faço parte da lista para matar. Sei disto porque já mo disseram e porque fui alvo, uma e outra vez, de tentativas de assassinato. Por quatro vezes mísseis foram disparados contra mim. Tenho muita sorte em estar vivo".
É assim que começa o relato de Malik Jalal.
"Eu não quero acabar como um escaravelho espezinhado - a palavra feia que usamos para o que resta de um ser humano depois de ter sido explodido por um míssil Hellfire disparado de um drone Predator, - mas mais do que isso, eu não quero minha família se torne vítima, ou mesmo viver com os drones sobre as nossas cabeças, sabendo que a qualquer momento eles podem ser vaporizados.
Estou em Inglaterra esta semana porque decidi que, se os ocidentais me querem matar-me sem se darem ao trabalho de vir falar comigo primeiro, talvez deva ser eu a ir falar com eles. Vou contar a minha história para que possam julgar se eu sou o tipo de pessoa que vocês querem que seja assassinado".
Malik Jalal continua a explicar de onde vem "do Waziristão, região da fronteira entre o Paquistão e o Afeganistão" e o que faz "sou um dos líderes do Comité de Paz do Norte do Waziristão (NWPC), que é uma organização [...] que se dedica a tentar [...] impedir a violência entre os Talibãs locais e as autoridades".
Malik está em Londres a convite do parlamento britânico e tem reuniões agendadas com parlamentares e com membros do governo. Também já foi entrevistado na rádio BBC.
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O artigo continua com o relato de alguns dos episódios em que terá sido "alvo" da máquina de guerra norte-americana.
Em janeiro de 2010, eu emprestei o meu carro ao meu sobrinho, Salimullah, para que ele o levasse até Deegan para uma mudança de óleo. Havia rumores que os drones estavam à procura de alguns veículos em particular fazendo o acompanhamento de determinados sinais de telemóvel. O céu estava claro e havia drones lá em cima".
E depois veio o míssil.
"Um segundo veículo parou ao lado do meu. Havia quatro homens dentro, apenas mineiros. Um míssil destruiu ambos os veículos, matou os quatro homens, e feriu gravemente Salimullah, que passou os 31 dias seguintes no hospital".
Nove meses depois, um novo ataque.
"Naquele dia, eu estava a conduzir um Toyota Hilux vermelho [...] para uma reunião da comunidade de anciãos. Outro veículo vermelho, quase idêntico ao meu, estava a cerca de 40 metros para trás. Quando chegamos Khader Khel, um míssil explodiu com esse carro, matando todos os ocupantes. Eu acelerei dali para fora, a ver as chamas e escombros no meu espelho retrovisor".
Teria sido ele o alvo? Malik acredita que sim. "Soube mais tarde, que as baixas foram quatro membros da tribo Mada Khel, nenhum dos quais tinha qualquer ligação com grupos militantes. Agora, parecia mais provável que eu era o alvo".
Os drones fizeram os mísseis cair perto dele outras duas vezes.
No último ataque aéreo "cerca de 40 civis morreram naquele dia, todos inocentes, e alguns deles colegas da NWPC". Malik estava lá e "como outros naquele dia, eu disse algumas coisas que eu lamento. Eu senti raiva, e disse que iriam sentir a nossa vingança. Mas, na verdade, [...] a nossa verdadeira frustração era que nós - os anciãos de nossas aldeias - somos impotentes para proteger nosso povo".
Foi aí que foi avisado. Malik não revela a fonte mais diz que "fui avisado de que os americanos e os seus aliados tinham-me posto, bem como outros da Comissão de Paz, na sua lista de assassinatos."
Foi aí que, a bem da família, Malik Jalal mudou de hábitos. Conta que começou a "dormir sob as árvores e longe de casa para evitar ser um ímane mortal para todos os meus familiares". O paquistanês revela que uma dessas noites, o filho mais velho o seguiu e contou que também ele tinha medo dos drones e do que eles fazem às crianças.
"Eu sei que os americanos acham que eu sou um opositor das suas guerras dos drones. Têm razão: sou. Decidir a morte de alguém, e matar nove crianças inocentes por cada pessoa que eles têm como alvo, é um crime de proporções inomináveis. E essa política é tão disparatada quanto criminosa, já que radicaliza o mesmo povo que nós estamos a tentar serenar".
"Eu estou ciente que os americanos e os seus aliados acham que o Comité de Paz é uma fachada, e que estamos apenas a criar um espaço seguro para os talibãs do Paquistão. Mas a isso eu respondo: vocês estão errados. Vocês nunca foram ao Waziristão, então como é que vocês sabem?"
"A ladaínha que diz que o ocidente não deve negociar com "terroristas" é ingénua. [...] Lembrem-se do IRA, que uma vez tentou matar o primeiro-ministro inglês, e agora estão no parlamento. É sempre melhor falar do que matar".
Malik termina o artigo publicado no jornal Independent, dizendo que percorreu meio mundo porque quer "resolver este conflito da forma que vocês nos ensinam: através da lei e dos tribunais e não pelas armas e pelos explosivos. Perguntem-me tudo o que quiserem, mas sejam justos - e por favor parem de aterrorizar a minha mulher e crianças. E tirem-me da kill list".