Falta de equipamentos de proteção básica, excesso de burocracias e de lutas internas... Uma investigação da Associated Press descobriu dez erros que a Organização Mundial de Saúde comentou quando tentava travar o contágio do ébola, na cidade de Kenema, na Serra de Leoa.
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Foi a partir daqui, no verão de 2014, que o vírus se espalhou por toda a África Ocidental.
A Associated Press analisou os e-mails internos da OMS, assim como documentos e entrevistas dadas por responsáveis desta organização e conclui que em todo este processo houve má gestão, falta de equipamentos de proteção básica e excesso de burocracias e de lutas internas.
Os dez erros graves:
1. Ao contrário de outras organizações de ajuda humanitária, que conseguiram desinfetantes, em Kenema, na Serra Leoa, os funcionários do hospital local descobriram que o cloro estava fora do prazo, algumas embalagens estavam abertas ou nem tinham prazo de validade. A OMS chegou a pedir uma investigação, porque o desinfetante é fundamental para limitar a exposição ao vírus.
2.Morreram mais de 40 funcionários da área da saúde e 20 foram infetados durante a construção de uma clínica para tratar o ébola e que iria permitir diminuir a pressão sobre o Hospital de Kenema. Muitos não sabiam como usar os equipamentos de proteção e a situação tornou-se tão grave que a organização Médicos Sem Fronteiras foi chamada para encerrar o edifico.
3. A Cruz Vermelha ofereceu-se para construir uma clínica para tratar o ébola em Kenema, mas não conseguiu resposta nem do governo da Serra Leoa, nem ninguém da OMS disse onde poderia ser construída. Quando o equipamento foi inaugurado, o surto da doença já tinha atingido o pico máximo.
4. No início de agosto de 2014, um relatório interno da OMS verificou que as vítimas mortais desta doença, altamente contagiosa, estavam em sacos sem qualquer proteção ou informação. Mais tarde, um funcionário da OMS tentou entregar 100 sacos próprios para cadáveres, mas o governo bloqueou a entrega, alegando problemas burocráticos.
5. Os responsáveis da OMS estavam tão limitados por problemas burocráticas, que o diretor-geral decidiu escrever um e-mail, para denunciar que os especialistas na África Ocidental estavam a receber apenas algumas centenas de dólares por semana para cobrir milhares de dólares em despesas, para comprar coisas básicas, como botas de borracha de proteção e desinfetante.
6. O gerador utilizado pela OMS no laboratório do hospital era tão instável, que temiam que pudesse danificar todo o restante equipamento médico. O problema não foi tratado e, quatro dias mais tarde, o laboratório foi atingido por um "apagão".
7. Os funcionários da OMS no terreno, em Kenema, pediram por inúmeras vezes aos superiores para intervirem, alertando que estavam a ser marginalizados, mas nunca ninguém agiu.
8. Os casos oficiais de ébola contabilizados pela OMS, foram alterados pelo governo da Serra Leoa, para corresponderem às estatísticas "oficiais".
9. Apesar de existir uma frota de mais de 50 novos Land Cruisers estacionados na sede da ONU em Freetown, os responsáveis diziam que não tinham veículos suficientes para controlar a propagação do vírus. Um responsável da OMS na Serra Leoa chegou mesmo a sugerir que fossem pedidas motos para viajar entre as aldeias, em vez das bicicletas que estavam a usar.
10. O coordenador da OMS para o ébola em Kenema, e a empresa US Metabiota, que monitorizava a doença em nome do governo da Serra Leoa, entraram em conflito e chegou a ser sugerido que a organização das Nações Unidas fosse retirada da cidade.