50 anos do Watergate. Jornalistas revisitaram escândalo à luz do assalto ao Capitólio
"É muito importante entender a progressão da criminalidade de Richard Nixon para a criminalidade de Donald Trump. Ambos são Presidentes criminosos dos Estados Unidos", consideram os históricos jornalistas.
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No 50.º aniversário do escândalo de Watergate nos Estados Unidos, os históricos jornalistas Bob Woodward e Carl Bernstein reeditaram o livro "All the President's Men", traçando paralelos com Donald Trump, cuja presidência terminou com o assalto ao Capitólio, hoje investigado.
"É muito importante entender a progressão da criminalidade de Richard Nixon para a criminalidade de Donald Trump. Ambos são Presidentes criminosos dos Estados Unidos. Mas Trump foi mais longe. Ele é o primeiro presidente sedicioso da nossa história. Ele decidiu que não cumpriria a eleição, a eleição livre e devidamente constituída de Joe Biden como Presidente dos Estados Unidos, e deu um golpe para impedir que Biden assumisse o cargo", disse Woodward, que, ao serviço do jornal Washington Post, desvendou o escândalo do Watergate.
"Watergate foi realmente um esforço para destruir o processo de indicação de candidatos ao Partido Democrata, quer dizer, foi extraordinário (...) foi um dos grandes crimes, não só da política. Nunca vi nada assim, até recentemente", acrescentou o jornalista numa recente entrevista à emissora norte-americana PBS.
O inquérito da Câmara dos Representantes sobre o assalto do dia 06 de janeiro de 2021 no Capitólio dos Estados Unidos, em curso em Washington, coincide com o 50.º aniversário de Watergate desta semana, e por ambos os casos terem ainda aspetos por esclarecer.
Duas das questões que se colocaram há meio século ao ex-presidente Richard Nixon e que se voltam a colocar agora a Donald Trump são: o que é que o Presidente sabia? e quando é que ele soube?
Enquanto Trump havia perdido a eleição e tentava recuperar o poder, Nixon estava num caminho confortável para a reeleição, mas enveredou pelo esforço de tentar destruir o processo de indicação de candidatos do Partido Democrata.
E se Watergate foi um escândalo que derrubou um Presidente norte-americano, o 06 de janeiro derramou sangue.
Há 50 anos, no prédio de escritórios de Watergate, onde o Comité Nacional Democrata mantinha a sua sede, ocorreu um roubo. Em seguida, um encobrimento e, posteriormente, a queda de um chefe de Estado. "Watergate" representará para sempre a corrupção política e a vergonha do republicano Nixon.
Já em 06 de janeiro de 2021, milhares de apoiantes do republicano Donald Trump reuniram-se em Washington para tentar impedir a certificação eleitoral da vitória nas presidenciais de Joe Biden e cinco pessoas morreram. As imagens de uma multidão a invadir a sede do Congresso dos Estados Unidos chocaram o mundo.
Watergate teve ainda um poderoso rescaldo, levando os republicanos a serem expulsos do Congresso às dezenas em 1974. Desta vez, há quase unanimidade de que o partido não terá consequências.
Em comum há ainda os processos de investigação no Congresso do país, através da criação de Comités.
O comité de Watergate, composto por quatro democratas e três republicanos, foi formado após uma votação unânime no Senado, algo inédito em quase todas as questões de substância no país. O comité ficou responsável por investigar o caso Watergate e "todas as outras condutas ilegais, impróprias ou antiéticas" na campanha de 1972.
Já o comité da Câmara dos Representantes que investiga o ataque ao Capitólio norte-americano teve apenas dois republicanos a votar a favor - Liz Cheney e Adam Kinzinger -, que foram integrados nessa comissão.
Com o desenrolar da história, levanta-se outra questão: Daqui a 50 anos, o que dirão os norte-americanos, e o mundo, sobre o 06 de janeiro?
O historiador Michael Beschloss, em comentários na rede social Twitter, indicou que a resposta depende se os Estados Unidos forem uma democracia ou uma autocracia.
"Se for a última opção (autocracia), os líderes autoritários do país podem celebrar o 06 de janeiro como um dos grandes dias da história dos EUA", como Trump tem feito até agora, disse Beschloss.
O historiador levantou ainda uma questão que pode nunca vir a ter resposta: "O que teria acontecido aos Estados Unidos se o golpe de 06 de janeiro tivesse sido bem sucedido?"