7 de outubro. Eurodeputados manifestam preocupação perante a evolução da crise no Médio Oriente
Um ano após os ataques do Hamas, a preocupação com a possibilidade de uma escalada regional está patente na maioria dos eurodeputados portugueses. A TSF falou com eles
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Os eurodeputados portugueses, ouvidos pela TSF, são unânimes a considerar que é altura de calar as armas no Médio Oriente, mas dividem-se sobre a atribuição de responsabilidades na nova escalada do conflito. A preocupação perante um possível alastrar da guerra à região também é uma preocupação quase geral.
“Infelizmente é aquilo que parece cada vez mais o cenário com o qual nos confrontamos”, lamenta a eurodeputada socialista Marta Temido, referindo-se à possibilidade de estar a assistir ao início de um conflito regional. Para a eurodeputada, “é importante que as instituições, designadamente as instituições europeias, o Parlamento Europeu, a Comissão, falem a uma só voz”, incluindo o Conselho, onde espera que “os Estados-membros da União Europeia [também] falem a uma só voz”.
“A União Europeia tem uma voz na cena da diplomacia internacional e não pode fazer aquilo que muitas vezes tem feito ao longo dos últimos meses, que é não a utilizar: ou não a utiliza de uma forma unívoca, ou não a utiliza de uma forma consequente”, frisou.
Alertando para o risco futuro da actual situação, o eurodeputado Sebastião Bugalho (PSD) espera que haja a noção de que todos perdem com a escalada do conflito. No entanto, acredita que “há a noção da parte dos decisores, sejam os europeus, sejam aqueles que estão mais envolvidos directamente no conflito, de que a escalada não é do interesse, nem do governo, nem das populações de nenhum dos lados”.
“Israel tem todo o direito a defender-se e tem todo o direito a não ser indiferente aos ataques de que é vítima”, destacou o eurodeputado do PSD. Porém, frisa que “a guerra contra o terror não pode ser feita com terror”.
Destacando as consequências futuras do “elevado nível de instabilidade na região”, Sebastião Bugalho expressa “duas preocupações: a imprevisibilidade de uma escalada; e, sobretudo, o risco de radicalização das novas gerações que estão a crescer rodeadas destas tragédias”.
Sebastião Bugalho deixa ainda uma crítica à decisão de Israel de declarar António Guterres persona non grata no território israelita, alertando que as “soluções de paz têm de ser feitas através de multilateralismo, não através de considerar o secretário-geral das Nações Unidas persona non grata no Estado de Israel”.
À esquerda, o eurodeputado João Oliveira (PCP), exige uma resposta firme da parte de Bruxelas, perante a “necessidade de tomar medidas que, do ponto de vista político e diplomático, sirvam para construir este caminho de cessar-fogo em Gaza, de solução de paz no Médio Oriente e de reconhecimento do Estado da Palestina, como ele está determinado nas resoluções das Nações Unidas”, considerando bem-vindas medidas como “a suspensão do acordo de associação entre a União Europeia e Israel”, assim como “a pressão política e diplomática por via de todos os canais que possam ser utilizados”.
Nesse sentido, defende que da parte do Conselho também se espera uma posição de “todos os Estados-membros a reconhecerem o Estado da Palestina, porque, infelizmente, continua a haver alguns países dentro da União Europeia, ainda que poucos, que se recusam a fazer isso [e], lamentavelmente, Portugal é um deles”.
Admitindo que a atuação de Israel na Faixa de Gaza possa levantar “questões de legitimidade”, a eurodeputada Ana Pedro (CDS), considera que a necessidade de uma resposta aos ataques de 7 de outubro era inquestionável, pois “dificilmente qualquer país permitiria que o seu povo ou parte do seu território ficasse à mercê de um fanatismo de uma organização terrorista que tem apenas um objectivo, que é a destruição do Estado de Israel”.
“Nós temos que pensar de Israel é uma democracia-pivô, uma democracia-chave, rodeada por uma série de Estados autoritários e autocráticos”, sublinhou a eurodeputada centrista, lamentando que “nós, aqui deste lado, no Ocidente, temos muitas vezes a dificuldade de perceber que estas organizações terroristas não se moderam, especialmente quando têm como único objectivo a destruição do Estado de Israel”.
Já a eurodeputada bloquista Catarina Martins, considera que da parte da União Europeia deveria haver algum tipo de medida em resposta à forma como Tel Aviv tem empurrado o conflito para um “nível regional”, suspendendo o acordo de associação com Israel.
“Netanyahu fez tudo para ter um conflito a nível regional”, afirma a eurodeputada do Bloco de Esquerda, considerando que o governo israelita “fez tudo para puxar o Irão para a guerra”.
“E, na verdade, Netanyahu está a ganhar porque, entretanto, o Ocidente apoiou-o”, tendo os Estados Unidos “apoiado a recente invasão do Líbano”, considerou Catarina Martins, fazendo ainda referência a “todo um crescendo no horror da guerra, nos instrumentos da guerra, um espalhar do conflito que foi desejado por Israel”, numa referência à utilização de “novas armas de guerra, como foi explodir os pagers, walkie-talkies”.
“As famílias dos reféns [israelitas levados pelo Hamas] manifestam-se em Israel por um cessar-fogo, porque sabem que nada está a ser feito em nome dos reféns”, destacou a eurodeputada, considerando que as acções seguem apenas “na lógica da guerra”.
“Netanyahu, há um ano, era um primeiro-ministro profundamente acossado com processos graves com a justiça, e usou a guerra como meio de se manter no poder e teve toda a complacência da União Europeia e dos Estados Unidos e o horror foi crescendo”, sublinhou ainda.
Por outro lado, o eurodeputado João Cotrim de Figueiredo (IL), considera que o que está em causa no Médio Oriente é um combate entre duas realidades inconciliáveis, resultando do “conflito entre democracias e tiranias”.
“É um conflito entre um conjunto de países ainda mais alargado do que até aqui tinha acontecido. Que querem, de facto, a destruição de Israel, apoiados por outros países que não têm presença directa na região, como a Rússia, a China, Coreia do Norte, contra o Estado de Israel, transformando isto num conflito entre basicamente democracias e tiranias”, vincou.
“Chegados aqui, se alguém perguntar a um democrata onde é que ele se deve situar? Por muitas dúvidas que haja sobre as credenciais democráticas de Netanyahu, e nós temos, continuamos a dizer e a ter de dizer aquilo que é insuficientemente repetido: que Israel é a única democracia na região e um Estado onde o Estado de Direito funciona na sua generalidade, onde há respeito pelos direitos de minorias. É, portanto, um democrata”, frisou o deputado da Iniciativa Liberal.
“Perante esta nova dimensão do conflito entre democracias de um lado e tiranias do outro, só tem uma escolha. Portanto, achamos particularmente lamentável e estranho que a esquerda, de uma forma geral europeia e a portuguesa, também se coloque de uma maneira inequívoca contra o Estado de Israel neste conflito. Portanto, põe-se do lado das tiranias contra o lado das democracias”, enfatizou Cotrim de Figueiredo.
Numa declaração em ruptura com a posição das instituições internacionais, o eurodeputado António Tânger Corrêa (Chega), questiona uma solução de dois Estados no Médio Oriente, pondo em causa o reconhecimento do Estado Palestiniano.
“Que fronteiras é que iria pôr nesse Estado? As de 67, 61, 76, [com] dois territórios que não são contíguos, que é a Faixa de Gaza e a Cisjordânia, e que são administrados por forças diferentes, mas que se odeiam, e mesmo dentro da Faixa de Gaza há várias tribos que se odeiam entre si e que só estão unidas porque têm um inimigo comum que é Israel”, analisa Tânger Corrêa, considerando que “não faz sentido criar um Estado que não tem bases sólidas para a sua existência, nem humanas, nem de infraestruturas”.