Eduardo Lourenço diz que a esquerda francesa está a pagar o preço de, durante anos, ter atirado a extrema-direita para um "gueto" e de não lhe ter dado a importância que devia.
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Depois da vitória da Frente Nacional, de Marine Le Pen, na primeira volta das eleições regionais em França, o filósofo e pensador que viveu em França até há dois anos, conversou com a TSF sobre a ascensão da extrema-direita, mas também sobre a queda da esquerda.
Eduardo Lourenço entende que a esquerda marginalizou o partido de Le Pen, uma situação que só foi diferente durante o mandato de François Mitterrand. Nessa altura, a Frente Nacional estava representada no parlamento, "como é normal numa nação democrática".
Dessa forma, a França conseguiu evitar que "essa direita, excluída, se considerasse uma vítima". O que aconteceu depois, foi o aproveitamento dessa "vitimização" e o resultado, entende Eduardo Lourenço, "está à vista".
A filha "mais hábil" do que o pai
Para o ensaísta, não é a vitória da Frente Nacional que espanta. É antes a dimensão dessa vitória que é "extraordinária". Eduardo Lourenço lembra que, desde a queda do muro de Berlim, a Europa tem "deslizado" para a direita. Embora o caso francês seja muito particular, já que, "praticamente desde a Revolução Francesa, a esquerda se instalou como uma das componentes fundamentais da política" em França.
O filósofo sublinha que a França enfrenta, neste século 21, uma crise interna, "de uma imigração que já é francesa e que contesta o "status quo" da política e da cultura francesas". E Marine Le Pen, "mais habilmente do que o pai", conseguiu tornar-se uma espécie de representante de uma parte dos franceses que, tendo origens, por exemplo, no Magrebe, estão contra o que a Frente Nacional considera a "presença excessiva" de imigrantes.
Marine Presidente? Seria "espampanante"!
E poderá essa "habilidade" da líder da Frente Nacional levá-la até ao Eliseu? A França terá eleições presidenciais em 2017 e há analistas que consideram que esta vitória, na primeira volta das regionais, dá a Marine Le Pen um "novo fôlego", caso pense candidatar-se à Presidência.
Uma possibilidade em que Eduardo Lourenço "não quer acreditar", mas que não afasta. Só colocar esse cenário é uma "visão um pouco fantástica"... mas não impossível. "Imaginar que um partido "guetizado" durante tantos anos, pudesse chegar à Presidência da República, seria uma coisa espampanante"!