A lei de amnistia enfrenta o derradeiro teste: o Congresso espanhol vota a sua aprovação definitiva
Salvo surpresa de última hora a amnistia deve ser aprovada por maioria absoluta e publicada, já esta sexta-feira, no Boletim Oficial do Estado
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Seis meses depois de ter sido registada pelo PSOE, a lei de amnistia tem esta quinta-feira a sua votação definitiva no Congresso dos Deputados espanhol. Uma votação que acontece após o Partido Popular, com maioria absoluta no Senado, ter vetado a lei na Câmara Alta. A lei precisa agora de maioria absoluta - 176 votos pelo menos - para levantar o veto e conseguir a aprovação final.
Se não acontecer nenhuma surpresa de última hora, a lei deve passar o último trâmite, com os mesmos votos a favor que permitiram a investidura de Pedro Sánchez. Se for aprovada, a lei será publicada no Boletim Oficial do Estado na sexta-feira e entrará em vigor já no sábado. Depois, os tribunais terão um prazo de dois meses para começarem a aplicar a lei.
A amnistia faz parte do acordo de investidura de Pedro Sánchez com os independentistas catalães do Esquerda Republicana e do Juntos pela Catalunha. A norma vai anular a “responsabilidade penal, administrativa e financeira” de todas as pessoas que cometeram delitos relacionados com o processo independentista da Catalunha durante mais de uma década.
Os beneficiados por esta lei vão desde as mais altas esferas do independentismo catalão aos cidadãos comuns. Com ela, Oriol Junqueras, do Esquerda Republicana, deixa de estar inabilitado para o exercício de cargo público e Carles Puigdemont, do Juntos pela Catalunha, poderá voltar a Espanha sem ter de enfrentar a justiça. Mas também os polícias imputados por repressão violenta deixam de estar sujeitos aos processos judiciais, assim como os cidadãos que colocaram as urnas de votação do referendo ilegal de 1 de outubro de 2017.
Durante o seu percurso no Congresso, o texto da lei sofreu várias alterações e chegou mesmo a ser chumbado com o voto contra do Juntos pela Catalunha, em janeiro. O acordo final só chegaria em março, depois de umas tensas negociações com o PSOE que modificaram o texto.
Alterações ao texto
As principais mudanças diziam respeito à referência ao “direito europeu e internacional” em vez do Código Penal espanhol, nos crimes de terrorismo, excluídos da amnistia. Assim, fora da lei de amnistia ficaram os “atos que, pelo seu objetivo, podem ser classificados como terrorismo, de acordo com a diretiva europeia de 2017”, e que, por sua vez, “tiverem causado intencionalmente graves violações dos direitos humanos regulamentados nos artigos 2.º e 3.º da Convenção Europeia dos Direitos Humanos”, que se referem ao direito à vida e à proibição da tortura.
As referências ao Código Penal Espanhol foram eliminadas do capítulo que se refere aos tipos de delitos que não se podem amnistiar, que passaram a ser definidos pelo direito internacional.
Fora desta lei, ficam também os delitos de traição, mas apenas se “se tiver produzido uma ameaça real e efetiva, como o uso da força contra a unidade territorial” de Espanha.
Além destas modificações, o Juntos pela Catalunha conseguiu também ampliar o período que abrange a lei: na proposta inicial a amnistia incluía os delitos relacionados com o processo independentista catalão cometidos a partir de 1 de janeiro de 2012 - a nova versão ampliou este período a novembro de 2011.
Os delitos de malversação de dinheiros públicos também serão amnistiados desde que não tenha havido enriquecimento ilícito. Este apartado é importante, uma vez que a maioria dos dirigentes catalães foram condenados por delitos de sedição e malversação.
Tensão
Espera-se que o debate desta quinta-feira seja tenso, como foram, de resto, todas as sessões onde se discutiu a lei, com duras acusações por parte da oposição que, durante estes seis meses, tentou de tudo para travar a sua aprovação. Ao veto no Senado, somam-se as várias manifestações, convocadas pelo Partido Popular e pelo Vox, contra a amnistia, que levaram à rua milhares de pessoas, principalmente em Madrid.
Ambos acusavam o PSOE de “humilhar o país” e “vender Espanha aos independentistas”. Do lado do PSOE, justificavam a lei como a forma de devolver ao terreno político o conflito catalão, e de “iniciar uma nova etapa de diálogo e convivência na Catalunha”.
As últimas eleições na Catalunha, a 12 de maio, onde o PSOE conseguiu 42 deputados e os partidos independentistas perderam a maioria que ostentavam há 14 anos, são, na opinião dos socialistas, a prova de que esta lei reforça a sociedade catalã e neutraliza as pretensões do independentismo, que vai perdendo força.
A aprovação da lei é de vital importância para a estabilidade governativa. Tanto, que Pedro Sánchez deu ordem a todos os deputados para se deslocarem a Madrid na noite anterior e pernoitarem na capital, para que nenhum imprevisto possa impedir que todos os deputados estejam presentes na votação.
