Acordo comercial entre UE e EUA traz "previsibilidade" e "parece uma boa notícia, mas depois pode não parecer"
À TSF, Armindo Monteiro, presidente da CIP, considera que o acordo "evita constantemente esta insegurança e esta intranquilidade em relação às encomendas", enquanto o economista Filipe Grilo afirma que foi "o acordo possível"
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O presidente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP) realça que a previsibilidade é a grande vantagem do acordo comercial firmado entre a União Europeia e os Estados Unidos.
"Com este acordo, as empresas podem adquirir uma previsibilidade que evita constantemente esta insegurança e esta intranquilidade em relação às encomendas. É preciso notar que até que os produtos sejam ao consumidor, têm um longo processo que se inicia na encomenda, depois na produção e na entrega. Isso significa que estávamos com falta de previsibilidade já a comprometer as compras do próximo ano. Significa que temos agora condições, sendo mais previsível se estamos a definir quais são as taxas, tentar acomodar estas tarifas no preço ou encontrar outras formas. Por isso, a previsibilidade é talvez um ponto mais importante, seja nas vendas diretas das empresas portuguesas, sejam aquelas que integradas nas fileiras europeias, também têm como destino final os Estados Unidos da América", considera Armindo Monteiro, em declarações à TSF.
O presidente da CIP rejeita que o estado implemente medidas de navegação à vista: "O Estado tem naturalmente uma ação importante, mas nós não podemos colocar no Estado toda a responsabilidade da economia. Há matérias que naturalmente é importante a ação do Estado, nomeadamente o sermos mais competitivos em determinados pontos, mas alguns deles, em Portugal, começam no mercado interno e que se traduzem depois numa competitividade maior quando entramos no mercado internacional. Ou seja, não somos favoráveis a medidas avulsas. Somos mais favoráveis a políticas que enquadrem o apoio firme à economia portuguesa, por isso são sempre desejáveis, mas nós somos uma economia de recursos escassos e necessidades abundantes. Isso significa que temos de ser muito parcimoniosos e não fazer uma política casuística impulsionada pelo momento. Nós temos que pensar a médio e longo prazo."
Armindo Monteiro diz ainda ser impossível garantir que não haja despedimentos por causa do acordo comercial entre Bruxelas e Washington. O presidente da CIP sublinha que o mercado é muito volátil e por isso tudo está em aberto.
"Não é possível prever, porque há setores que dependem ainda muito do preço. Significa que qualquer oscilação do preço pode fazer a diferença entre conseguir ser competitivo num determinado mercado, ou seja, conseguir vender num determinado mercado ou não conseguir fazê-lo. Se a nossa oferta for apenas baseada no preço, naturalmente, com um incremento de preço pode retirar-nos das opções de compra. E, se possível, mas não é possível neste momento, porque não se conhecem alguns detalhes. Há um conjunto de produtos que estarão a uma taxa protegida e neste momento ainda não se conhece a extensão dessa lista", explica.
Já o economista Filipe Grilo considera que o acordo comercial é o possível. O professor da Porto Business School diz que esta foi mais uma negociação à moda de Donald Trump.
"Isto, quando se fala com Trump, parece uma boa notícia, mas depois, quando se vai ver, pode não parecer. Isto é, o Trump colocou a fasquia tão alto nos 30% que os 15% parecem uma boa notícia. Mas depois, quando nós comparamos os 15% com o que estava anteriormente, 15% é bastante alto face àquilo que eram as tarifas impostas pelos Estados Unidos nos diferentes produtos europeus. Portanto, este acordo, foi o acordo possível. Teremos que também ver o que está escrito nas entrelinhas, nomeadamente ao nível do investimento na defesa e também provavelmente do aumento das quotas de importação de produtos agrícolas americanos por parte da Europa. Mas, do que se sabe, já é algo positivo, mas com um impacto praticamente negativo no sentido em que haverá muitas empresas com muita dificuldade em enviar produtos para os Estados Unidos, porque este efeito de aumento de 15% vai afastar alguns consumidores americanos do consumo destes produtos", argumenta.
Filipe Grilo acredita que este acordo pode levar a despedimentos nas empresas mais dependentes do mercado norte-americano: "Haverá algum impacto, é verdade. Poderá haver algumas dificuldades de algumas empresas. As empresas também parece-me que estão no bom sentido e há uns meses já têm vindo falar na diversificação dos mercados internacionais. Isto estamos a falar do impacto direto, mas depois há um impacto indireto que são empresas portuguesas que exportam, por exemplo, para a Alemanha ou para a França e depois que essas empresas vão exportar para os Estados Unidos. Havendo então menos capacidade de venda por parte destas empresas nos Estados Unidos, pode ser que haja uma redução das vendas das nossas empresas portuguesas e, mais tarde, haverá também provavelmente um congelamento, por exemplo, na subida de salários ou até mesmo, num caso mais pessimista, um corte de emprego."
Apesar de o lider do PS, José Luís Carneiro, defender que o Governo tem de apoiar as empresas a lidar com o impacto do acordo firmado entre os EUA e a União Europeia, Filipe Grilo acredita que não faz sentido o estado andar a acomodar os efeitos negativos das tarifas nas empresas portuguesas.
"Nós estarmos a ajudar indiscriminadamente as empresas podemos estar a criar aqui um sentido perverso em que não estamos a incentivar as empresas a procurar e a reagir a outro tipo de mercado. Em relação ao tipo de ajudas, temos que ter muita atenção também porque uma das coisas que pode ser feito, e aí o Ministério dos Negócios Estrangeiros tem que trabalhar mais, que é tentar promover junto das empresas encontros com outro tipo de mercados para elas, sim, poderem encontrar as suas soluções. Nós estamos a falar de simplesmente injetar dinheiro para colmatar estas perdas, eu diria que isto não é sustentável, porque o que é expectável é que estas tarifas vão ficar aqui pelo menos para os próximos quatro anos. Portanto, estamos a ajudar consecutivamente estas empresas não parece de todo sustentável. Temos é que criar um mecanismo para que elas reajam, porque o objetivo delas é precisamente essa, tem que lutar na economia mundial e tem que se vender lá fora", conclui.
