Germano Almeida, autor de quatro livros sobre presidências americanas, faz na TSF uma contagem decrescente para as eleições nos Estados Unidos. Uma crónica com os principais destaques da corrida à Casa Branca para acompanhar todos os dias.
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1 - SONDAR AS SONDAGENS
Com o devido respeito por quem insiste na tese "esqueçam as sondagens que dão grande vantagem a Biden- lembrem-se de 2016 -o Trump vai acabar por ganhar isto", ao olhar para o cenário desta corrida 2020, a pouco mais de duas semanas da decisão, o que vejo é precisamente o oposto: em vez de uma disputa renhida e imprevisível (a narrativa consensual até agora), o que me parece, cada vez mais, é que está a desenhar-se uma das eleições presidenciais mais desequilibradas das últimas décadas na América, com um provável desfecho de vitória folgada de Biden, tanto no voto popular como no Colégio Eleitoral. Por estas três razões:
1 - A FORTE LIGAÇÃO DE BIDEN AO ELEITORADO "RUST BELT" (E QUE HILLARY NÃO TINHA). Esse eleitorado deu o triunfo a Trump sobre Hillary mas grande parte dele está a sofrer bastante com a pandemia e as perdas económicas por ela geradas. É um eleitorado que se revê nas origens e no estilo de Biden e que se sentirá algures entre o desiludido e o traído pelo modo como Trump tem gerido a pandemia e, sobretudo, como tem desrespeitado a memória dos mais de 200 mil mortos americanos neste meio ano;
2 - 2020 NÃO É 2016. Há quatro anos Trump vinha de fora, não tinha que prestar contas e conseguiu enganar muita gente na ideia de que era "um empresário de sucesso". Quatro anos depois é o Presidente que geriu pessimamente a maior ameaça à segurança nacional americana desde o 11 de Setembro e que terminará o seu mandato com menos empregos dos que os que havia quando começou;
3 - A TENDÊNCIA PARA COMPARAR SONDAGENS DE HÁ QUATRO ANOS COM AS DE HOJE É, NA MINHA MODESTA OPINIÃO, ERRADA. Do ponto de vista técnico, as empresas que as fazem conhecem muito melhor o terreno onde falharam há quatro anos. Desde 2016 para cá, a população que vota é diferente: muita gente morreu, muita gente vai votar pela primeira vez. E todos os sinais apontam que as variações entretanto existentes favorecem os democratas. Olhem para o que está a acontecer em estados como o Ohio, a Carolina do Norte, o Iowa ou até a Geórgia. Para Trump ser reeleito teria que estar nesta altura completamente confortável nesses quatro estados. Ora, neste momento, a tendência é para que os possa perder. E olhem, sobretudo, para estes cinco (para mim, os mais decisivos): Pensilvânia, Michigan, Wisconsin, Arizona e Flórida. Quem ganhar pelo menos três deles será Presidente. Neste momento, Biden lidera claramente os três primeiros, está à frente por pouco no Arizona e regista-se empate técnico na Florida. Dito isto, obviamente que nestas duas semanas vai ainda acontecer muita coisa. Pode haver mais "October Surprises", vai haver golpes de teatro... Mas no global as tendências de voto parecem-me já muito fixas -- e os indecisos são muito poucos. Se as eleições fossem hoje, Joe Biden ganharia por margem confortável tanto o voto popular como o Colégio Eleitoral. Veremos o que acontecerá daqui a 17 dias.
2 - A VULNERABILIDADE DO ELEITORADO BIDEN. Joe Biden tem um eleitorado tendencialmente maioritário (muito pelo que foi explicado acima e também porque há mais americanos a desejar que Trump não faça um segundo mandato do que os que desejam que esse segundo mandato ocorra). Mas é também um eleitorado mais vulnerável. Trump tem um eleitorado mais fixo, fiel e mobilizado: 97% de quem diz nas sondagens que tenciona votar Trump pretende fazê-lo "por Trump"; com Biden isso só acontece como 70%. O principal motivo de muitos possíveis votantes Biden não é o candidato mas o desejo de impedir a vitória do adversário. Depois, a vulnerabilidade tem a ver com a forma de votar. Os eleitores Trump tencionam fazê-lo, maioritariamente, de forma presencial. Temem menos o coronavírus e têm mais ligação aos locais de votos. Uma parte significativa do eleitorado Biden conta votar à distância, por correio - e isso implica um mundo de riscos e problemas. Por fim, Biden lidera em dois segmentos que tradicionalmente votam em menor quantidade: os jovens e os mais velhos. Trump parece melhor em segmentos em idade ativa, que geralmente estão mais ligados à participação eleitoral.
UMA INTERROGAÇÃO: Será que, desta vez, as sondagens vão acertar em cheio ou são mesmo fundados os receios de uma repetição de 2016?
SONDAGEM
IBD/TIPP: Biden 50-Trump 43 (12 a 16 out)