Germano Almeida, autor de quatro livros sobre presidências americanas, faz na TSF uma contagem decrescente para as eleições nos Estados Unidos. Uma crónica com os principais destaques da corrida à Casa Branca para acompanhar todos os dias.
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1 - SIM, O HOMEM É "MESMO ASSIM TÃO MAU". Nestes quatro anos de bizarria trumpiana, com um Presidente a não respeitar regras básicas da convivência democrática, a pisar os outros poderes, a ter comportamento "bully" junto de adversários e até aliados, a fazer da mentira descarada uma estratégia básica de atuação, a prometer não aceitar uma derrota nas urnas, preferindo lançar todo um sistema para a lama com a ameaça de atiçar os apoiantes para a insurreição, não deixa de ser desconcertante ver como tantas pessoas supostamente bem informadas tendem a normalizar o inaceitável e preferem encontrar algum quadro de acomodação do que veem e ouvem por parte de Donald Trump. Em artigo recente no Expresso, Luís Pedro Nunes desmonta essa posição de tentar colocar-se do lado do líder "bully" e observa, com título em negação propositada: "O homem não é assim tão mau como dizem". "Defensores de Trump ou apenas pessoas bondosas que querem ver "os dois lados" e acham excessivo e injusto o modo como se retrata Trump. A questão é se há "outro lado" e se há "outro Trump" para descrever. Mas nada como questionar as acusações (...) "O que diz John Kelly de Trump? "Nunca conheci pessoa com tantas falhas de personalidade, a profundeza da sua desonestidade não cessou de me surpreender, toda a relação que cultivava tinha uma natureza transacional, embora acabasse por ser mais patético que outra coisa qualquer". Kelly "confessou" retrato a amigos sabendo que se ia tornar publico. Já "Mad Dog" Mattis disse que se ia a manter em silêncio. Não se conseguiu conter. Em Junho, declarou, em pleno caos devido ao caso George Floyd e como reação à ignóbil utilização pelo presidente dos militares na encenação do exibir uma bíblia frente a uma Igreja tendo para isso afastado com violência manifestantes pacíficos: "Há 50 anos quando me alistei jurei defender a Constituição e este presidente é a maior ameaça à Constituição americana e à união dos cidadãos ao fazer troça das instituições". McMaster também tinha garantido que não abriria a boca. No início do mês não cumpriu ao dizer que o "presidente está a ajudar a campanha de desinformação da Rússia ao não denunciar como Putin está a tentar manipular os votos". Não se pode dizer que seja pouco. Todos eles falharam a promessa de se manter em silêncio? Sim, mas nitidamente devido a um princípio que consideram maior que é a constatação que a Constituição está sob ataque de um presidente imbecil e que pode estar comprometido por uma potência estrangeira. Trump."
2 - A SUPREMA IMPORTÂNCIA DO SUPREMO. O Supremo Tribunal dos EUA é o pilar de um complexo sistema de poderes e contra-poderes. Nesta estranha corrida 2020 pode mesmo decidir esta eleição, pelo cenário que está criado de contestação da candidatura Trump sobre os prazos para os estados contarem os votos por correspondência. A confirmação da juíza Barrett foi uma vitória Trump na mensagem que passa à base conservadora que consegue fazer valer a agenda ideológica. Mas pode também ser fator de mobilização para a esquerda votar Biden e, com Joe na presidência e possível maioria democrata no Senado, lançar a questão do alargamento do número de juízes no Supremo para compensar desequilíbrio na balança (6-3). Desde Nixon que nenhum Presidente não conseguia nomear três juízes - mas nenhum tinha feito em apenas um mandato. Dos nove juízes do Supremo, Trump nomeou um terço deles e, precisamente, os mais novos: Amy Barrett (48 anos), Neil Gorsuch (53) e Brett Kavanaugh (55). O mais velho, o juiz Stephen Breyer, de 82 anos, é um dos três únicos liberais (nomeado por Bill Clinton). Ora, isso pode, a curto/médio prazo, vir a desequilibrar ainda mais. Barrett ocupou a vaga de Ruth Bader Ginsberg - outra mulher, mas representando uma visão de sociedade completamente oposta. Os republicanos aproveitaram em tempo recorde a junção de terem ao mesmo tempo um Presidente e uma maioria no Senado (sem "filibuster" de bloqueio democrata). Será o maior legado deste mandato de Trump - junto do seu eleitorado natural, pelo menos. Mas não deixa de ser chocante ver a juíza Barrett, já depois de confirmada e depois de ter garantido no Senado que nunca usará motivações políticas ou partidárias nas suas decisões, participar numa cerimónia ao lado do Presidente de celebração dessa confirmação. É um péssimo sinal. Péssimo.
UMA INTERROGAÇÃO: Que papel terá o Supremo Tribunal dos EUA na definição do novo Presidente?
ESTADOS DECISIVOS
OHIO: Biden 48-Trump 43 (Quinnipiac, 23 a 27 out)
ARIZONA: Biden 48-Trump 46 (Reuters/Ipsos, 21 a 27 out)
MINNESOTA: Biden 47-Trump 42 (SurveyUSA, 23 a 27 out)
PENSILVÂNIA: Biden 51-Trump 46 (The Hill/HarrisX, 26 a 29 out)
GEÓRGIA: Biden 48-Trump 46 (PPP, 27 e 28 out)
*autor de quatro livros sobre presidências americanas