Germano Almeida, autor de quatro livros sobre presidências americanas, faz na TSF uma contagem decrescente para as eleições nos Estados Unidos. Uma crónica com os principais destaques da corrida à Casa Branca para acompanhar todos os dias.
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1 - ARGUMENTOS FINAIS: JOE BIDEN. Fez uma campanha pragmática, sem grandes rasgos, mas focada no objetivo essencial. Sabe que não tem o brilho inspirador de Barack Obama nem a preparação de "boa aluna" de Hillary Clinton. Sabe que o seu tempo, numa situação normal, já teria passado. Cometeu uma "gaffe" comprometedora na primeira corrida à nomeação (1988), ao plagiar quase por completo um discurso do britânico Neil Kinock. Nunca chegou a ter hipóteses reais de obter a nomeação na segunda tentativa, em 2008, ano de um dos duelos mais notáveis na história das nomeações presidenciais na América: Obama vs Hillary. Mas foi construindo, em mais de três décadas, percurso sólido e de prestígio no Senado americano, num tempo de política clássica e de consensos bipartidários. Construiu alianças que ainda hoje duram, foi negociador. Não é estimulante, mas também não assusta. E isso, nesta corrida, pode ser uma fórmula vencedora. Joe aproveitou a boleia da História quando Barack Obama viu nele, em 2008, o "running mate" ideal para sossegar o eleitorado branco do Midwest. Foi, por oito anos, um vice-presidente sólido, confiável, que geriu bem as negociações com o outro lado da barricada em temas como o orçamento, o evitar do "shutdown", os votos para o ObamaCare. Tudo isso lhe está, agora, a valer uma possível chegada à Presidência quase com 78 anos. Se isso acontecer será, de muito longe, o mais velho Presidente eleito dos EUA (será mais velho do que Ronald Reagan no último ano do segundo mandato). Geriu a pressão da ala esquerda, deu só um minuto a Alexandria Ocasio-Cortez na Convenção Democrata, pacificou a retórica de Bernie Sanders e Elizabeth Warren (dois líderes com cartel na esquerda americana, com quem soube dialogar sem cortar pontes mas também ficar refém de propostas que não se enquadram no "core" do que é a sociedade americana). Num tempo de excessiva valorização dos extremismos, uma possível vitória de Joe Biden será a prova de que ainda é possível acreditar na prevalência do bom senso como máximo denominador comum.
2 - ARGUMENTOS FINAIS: DONALD TRUMP. Tomou o Partido Republicano de assalto, identificando as vulnerabilidades ideológicas e identitárias já verificadas nos anos de oposição nos dois mandatos Obama, com o fenómeno Tea Party (uma espécie de contestação ao sistema a minar o próprio sistema). Transformou a plataforma globalista e pelo comércio internacional do conservadorismo americano numa proposta anti-imigração, agressiva em relação ao outro, pelas tarifas contra o comércio aberto, identitária, populista, anti-multilateralista e contra as grandes organizações internacionais. Depois de Obama ter representado o melhor da América na Casa Branca (diversa, aberta, pluralista, inclusiva e globalista), Trump explorou os piores sentimentos (que sabia também existirem nos eleitores): egoísmo, receio de abertura, expiação de culpas com apontar de erros aos outros. Donald Trump nunca assume erros, nunca pede desculpa. A culpa é sempre dos outros: adversários ou até aliados, pessoas com quem trabalhou de perto (e que agora dizem dele o que Maomé não disse do toucinho). Energizou os evangélicos, os brancos pouco qualificados, os suburbanos. Mas isso é pouco para um Presidente de um país como a América. Nunca procurou unir, explorou o ódio e a divisão, foi um Presidente de Desunião e não de união (como lhe competia ser), ao ser muito pouco solidário com os governadores democratas em momentos como os fogos terríveis, os confrontos raciais ou a crise pandémica. Se ganhar perpetuará um estilo que ameaça os pilares da democracia americana. Se perder ameaça não aceitar os resultados e promete atiçar o seu povo para as ruas. Mas se perder sabe que sairá e não se acredita que queira passar pela figura de obrigar os militares a tirá-lo à força da Sala Oval. Não fará o favor aos seus inimigos de permitir que essa fotografia ocorra. Mas até conceder pode ocorrer uma batalha judicial violentíssima, que pode durar semanas e ameaça gerar confrontos violentos nas ruas (quem sabe até com sangue). Mas a América prevalecerá. Mesmo depois de quatro anos de um Presidente inaceitável - que demasiada gente passou a aceitar com desconcertante rapidez.
UMA INTERROGAÇÃO: Vai a sociedade americana conseguir sair com um mínimo de coesão nacional?
SONDAGENS NACIONAIS FINAIS
NBC NEWS/Wall Street Journal: Biden 52-Trump 42
RASMUSSEN REPORTS: Biden 49-Trump 46
FOX NEWS: Biden 52-Trump 44
THE HILL/HARRISX: Biden 49-Trump 45
IBD/TIPP: Biden 50-Trump 44
ECONOMIST/YOUGOV: Biden 53-Trump 44
EMERSON: Biden 50-Trump 45
USA TODAY/SUFFOLK: Biden 52-Trump 44
REUTERS/IPSOS: Biden 52-Trump 42
CNN POLL: Biden 54-Trump 42
*autor de quatro livros sobre presidências americanas