Germano Almeida, autor de quatro livros sobre presidências americanas, faz na TSF uma contagem decrescente para as eleições nos Estados Unidos. Uma crónica com os principais destaques da corrida à Casa Branca para acompanhar todos os dias.
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1 - BIDEN REAGE À AMÉRICA ASSUSTADA
Tensão nas ruas, americanos aos tiros uns contra os outros, medo a crescer. A América está assustada e isso pode favorecer Trump. O Presidente dos EUA está a cavalgar no discurso do medo, Biden reagiu e, na Pensilvânia, saiu finalmente da campanha virtual e fez discurso poderoso, em que responde, ponto a ponto, às críticas do adversário republicano. "Trump foi incapaz de proteger a América e agora que assustá-la. Ele não pode travar a violência porque passou anos a fomentá-la", acusou Biden em Pittsburgh. "Olhem para mim: acham mesmo que eu sou um radical socialista e marxista?", atirou Joe, para desmontar a tese que Trump e seus pares insistiram na Convenção - a de que uma vitória Biden em novembro seria "entregar a Casa Branca à esquerda radical". À primeira vista, a ideia parece absurda: a escolha dos democratas nas primárias foi precisamente a oposta, ao preferirem claramente Joe Biden sobre Bernie Sanders. Mais tarde, a opção de Biden por Kamala Harris para vice (em detrimento de Elizabeth Warren ou Lance Bottoms) reforçou a tese de um "ticket" democrata moderado, institucional, longe de qualquer aventura esquerdista ou radical. Como pode, então, estar a colar o fantasma do "esquerdismo radical socialista" junto da argumentação republicana?
2 - NÃO FOI O APOCALIPSE. MAS FOI MAIS GRAVE DO QUE MUITOS IMAGINARAM
No dia seguinte à vitória choque de Donald Trump, a 9 de novembro de 2016, Barack Obama, citado num artigo de David Remnick na "New Yorker", apontava. "Isto não é o apocalipse. Não acredito numa visão apocalíptica - pelo menos até que chegue o apocalipse." Quase quatro anos depois, de facto não chegou o apocalipse. Mas talvez tenha sido mais grave do que muitos imaginaram. Timothy Garton Ash, professor em Oxford, nota: "As pessoas pensam que Trump é estúpido, mas ele não é nada estúpido. Há cinco anos ainda falava a linguagem típica de um investidor de Wall Street, com formação académica. Agora fala a linguagem de quem nem completou a educação básica. É assim que consegue que alguém num bar, ouvindo vagamente a TV, exclame: "Olha, aquilo sou eu a falar." Governar pelo Twitter não era a ideia que tínhamos do modo de atuação de um Presidente dos EUA. E muito menos seria a forma truculenta, demagógica e mentirosa como Trump se tem comportado em momentos chave da sua presidência. O prestígio e a autoridade do cargo político mais influente do mundo estão em perigo. Sim, o sistema tem pesos e verificações que garantem contrapoderes e limitam tentações autoritárias - e isso também funcionou em momentos cruciais. Mas não nos enganemos: quem marca a agenda é o Presidente. Mesmo Obama, com tanta oposição republicana e nos media afetos à direita, foi o "pivot". A via obamiana de pensar que "só é o fim do mundo quando chegar o fim do mundo" pode ser aconselhável do ponto de vista anímico. Mas o olhar da sua mulher, Michelle, terá sido mais cirúrgica, quando, dias antes da eleição, declarou de forma profética: "Isto vai ser sobre quem vai votar mas também muito sobre quem não vai votar". Hillary que o diga: ao não mobilizar mais negros na Carolina do Norte e mais mulheres no Midwest permitiu, há quatro anos, que o absurdo se tornasse real. Martins Amis identificara a perplexidade: "Na corrida de 2016, nunca pareceu existir correlação objetiva da retórica com a realidade. A economia estava bem. Os rendimentos da classe média até aumentavam um pouco desde a crise. Não é como se isto fosse a República de Weimar. Não vivemos no meio de ruínas decadentes, caos, anarquia. Havia um programa relativamente liberal e cauteloso e de repente confrontamo-nos com este hiato cor de laranja e artificialmente bronzeado. É difícil ver nisto uma reação à realidade. O que parece é um divórcio da realidade." Stephen King, escritor americano especialista em contos de terror, já nos tinha avisado: "Os monstros são reais e os fantasmas são reais também. Vivem dentro de nós e, às vezes, vencem".
UMA INTERROGAÇÃO: Se Joe Biden for o 46.º Presidente dos EUA, vai mesmo retomar todos os acordos comerciais que Donald Trump denunciou?
UM ESTADO: Connecticut
Resultado em 2016: Hillary 54,6%-Trump 40,9%
Resultado em 2012: Obama 58,1%-Romney 40,8%
Resultado em 2008: Obama 60,6%-McCain 38,2%
Resultado em 2004: Kerry 54,3%-Bush 43,9%
(nas últimas 12 eleições presidenciais, 5 vitórias republicanas, 7 vitórias democratas - AS 7 ÚLTIMAS FORAM DEMOCRATAS)
-- O estado do Connecticut tem 3,6 milhões habitantes: 65,9% brancos, 16,9% hispânicos, 12,2% negros, 5,0% asiáticos; 51,2% mulheres
7 VOTOS NO COLÉGIO ELEITORAL
UMA SONDAGEM: Connecticut | Biden 52-Trump 32
(Survey USA, 19/24 maio)