Germano Almeida, autor de quatro livros sobre presidências americanas, faz na TSF uma contagem decrescente para as eleições nos Estados Unidos. Uma crónica com os principais destaques da corrida à Casa Branca para acompanhar todos os dias.
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1 - OS CANDIDATOS DO MEDO
Geralmente, as eleições presidenciais nos EUA são sobre Esperança. Kennedy nos anos 60, Reagan nos anos 80, Clinton nos anos 90 e Obama entre o final da primeira e o início da segunda década do Século XXI geraram duas fortes maiorias presidenciais exalando diferentes versões dessa mesma ideia poderosa e redentora. Kennedy apontou o caminho da Lua; Reagan anunciou "uma nova manhã para a América"; Clinton recolocou os EUA numa "prosperidade luminosa", Obama foi o Presidente da "Hope" (esperança") sobre o "Fear" (medo). Mesmo George W. Bush -- menos propenso a ficar do melhor lado da História pelo ocaso da Guerra no Iraque, baseado na mentira das "armas de destruição maciça" -- foi, na reeleição de 2004, o candidato da esperança, no sentido da garantia (que conseguiu cumprir) dos americanos não voltarem a passar por ameaça terrorista semelhante à do 11 de Setembro de 2001. 2016 marcou, nesse sentido, uma viragem perturbadora: Hillary, apesar de um currículo político quase inultrapassável e de uma preparação invejável, nunca conseguiu transmitir essa "esperança", mesmo em quem, à sua esquerda, temia Donald Trump; já Trump ganhou, não pela via positiva da Esperança, mas pela força perturbadora do Medo. Se Obama puxava pelo melhor da América, Trump ganhou pintando uma América bem pior do que ela, realmente, alguma vez foi. O "pesadelo americano" chegou, depois dos oito anos de uma presidência Obama que elevou os melhores espíritos mas deixou fechados os piores. Com Trump, esses piores espíritos saíram da caixa e, qual Pandora, ela nunca mais voltou a fechar. Como será nesta corrida de 2020, em que os dois candidatos geram dois diferentes tipo de medo? Com Trump sentimos o medo que não aceite uma derrota, que invente fraudes, que lance o sistema para a lama e para uma confusão difícil de resolver; com Biden há o medo que não aguente quatro anos, muito menos oito, que a idade seja peso demasiado evidente, que possa ficar fisicamente impossibilidade de exercer o cargo político mais influente do mundo (e, sim, para o Presidente dos EUA a saúde deve ser um assunto público). Em que ficamos? Que medo nos pode tolher mais?
2 - OS ANOS TRUMP FAZEM MAL À SAÚDE
A política é, neste início de terceira década de Século XXI, uma fonte de "stress" para os americanos. Um estudo do Pew Research Center identificou que perto de 50% dos republicanos e 60% dos democratas dizem que discutir temas partidários (aborto, imigração, armas) pode ser "stressante e frustrante". E não estamos a falar apenas em estados de espírito: os inquiridos descrevem sintomas físicos como "dores no peito, dores de cabeça e insónias". Era difícil encontrar forma mais reveladora para ilustrar o momento disruptivo em que caiu a política americana. Já depois desse inquérito, a forma tragicamente desastrosa como Trump lidou com a pandemia tem números catastróficos para a saúda dos americanos. Michelle Obama revelou recentemente que está com uma "depressão de baixa intensidade", por culpa de Trump, da pandemia e do racismo. Costumávamos olhar para a América como a nossa inspiração. Será que ela ainda terá força para recuperar essa dimensão redentora? Barack Obama provou, em 2008, que era possível fazer uma campanha presidencial vencedora com uma mensagem crítica mas dentro do sistema. Só que o que aconteceu na política americana na década seguinte alterou quase tudo. Donald Trump, em 2016, foi o sinal mais claro de que algo de muito profundo se tinha quebrado. Em 2016, o primeiro grande sinal de protesto não veio do campo republicano, com a nomeação de Trump. Veio mesmo do lado democrata, com os incríveis 43% obtidos por Bernie Sanders - senador que durante anos nem sequer estava inscrito no Partido Democrata.
UMA INTERROGAÇÃO: Que estados tradicionalmente "azuis" pode Donald Trump ambicionar em 2020?
UM ESTADO: Nova Iorque
Resultado em 2016: Hillary 58,4%-Trump 36,2%
Resultado em 2012: Obama 63,3%-Romney 35,2%
Resultado em 2008: Obama 62,8%-McCain 36,1%
Resultado em 2004: Kerry 57,9%-Bush 39,8%
(nas últimas 12 eleições presidenciais, 9 vitórias democratas, 3 vitórias republicanas)
- O estado de Nova Iorque tem 19,5 milhões habitantes: 55,3% brancos, 19,3% hispânicos, 17,6% negros, 9,0% asiáticos; 51,4% mulheres
29 VOTOS NO COLÉGIO ELEITORAL
UMA SONDAGEM: Nova Iorque | Biden 57-Trump 32
(Siena College, 20/25 junho)