Germano Almeida, autor de quatro livros sobre presidências americanas, faz na TSF uma contagem decrescente para as eleições nos Estados Unidos. Uma crónica com os principais destaques da corrida à Casa Branca para acompanhar todos os dias.
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1 - QUEM ARRECADA O DISCURSO SOCIAL?
Ao preferirem o centro moderado e seguro de Joe Biden ao discurso forte, ideológico e agressivo de Bernie Sanders, os democratas fizeram uma escolha que pode ter algumas perdas no duelo com Donald Trump. 2016 mostrou-nos que, mesmo que não de forma maioritária, haverá mesmo um segmento por identificar na sua totalidade no atual cenário eleitoral americano que tanto pode votar numa esquerda progressista e radical (Sanders, Warren) como numa direita híbrida, por vezes a flirtar com movimentos de extrema-direita mas uma certa ligação ao sistema tradicional, ainda que pela crítica dele, juntando-lhe um lado de culto personalista (Trump). Ora, se uma parte de quem votou Sanders nas primárias 2016 depois não votou na eleição geral (não quis votar Hillary mesmo com o perigo Trump) ou até votou Trump (foram poucos, mas existiram), é porque algum ponto de contato haverá. Não nos esqueçamos que Trump não está preso aos ditames da direita tradicional que, até há poucos anos, tinha horrores ao discurso social. É certo que Bush filho alargou o Medicare e o Medicaid e criou o programa "No Child Left Behind". E que Romney, como governador do Massachussets, criou um sistema de saúde com pressupostos semelhantes ao que viria a ser o "ObamaCare" nacional. Mas os anos anteriores a Trump foram de uma direita a recusar tudo o que fosse despesa social. Com Trump tentou-se uma espécie de "nacionalismo social": discurso para dentro, conservador e de direita nos costumes e na questão da imigração, mas suposta sensibilidade social para com "os seus". A prática governativa não o mostrou, mesmo antes da pandemia. A crise sanitária fez aumentar o relevo de temas como o sistema de saúde ou os apoios sociais. O plano económico de Biden dá grande foco ao tema, de tal modo que Elizabeth Warren não hesitou em avalizá-lo na Convenção. Quanto a Trump, será capaz de voltar a arrecadar ao campo da esquerda democrata uma fatia relevante nesta área? Duvido muito - mas em eleições americanas já vi mesmo de tudo...
2 - UM PRESIDENTE MINORITÁRIO
Donald Trump nunca foi maioritário - nem mesmo na noite da sua eleição presidencial: recolheu 46,1% dos votos expressos, menos 2,2% que a adversária democrata, perto de três milhões de sufrágios menos que Hillary Clinton. Já na Casa Branca, a tendência manteve-se: nas grandes decisões, são muito mais os norte-americanos que discordam da rota do Presidente do que os que concordam: construção do muro (59% discordam, CNN Poll), prolongamento do "shutdown" em janeiro passado (53% culpavam Trump, ABC News), saída do Acordo de Paris (55% dos norte-americanos discordam, Pew Research Center), saída do Acordo Nuclear do Irão (56% dos norte-americano discordam, YouGov). O atual inquilino da Casa Branca é o presidente mais impopular dos últimos 38 anos e o único que nunca conseguiu passar dos 50% de aprovação. Mesmo sendo um presidente da fação, Donald Trump é um líder com uma base significativa, fiel e permanentemente mobilizada. Ao contrário do que as duas eleições de Obama parecem ter representado, a eleição presidencial de Trump não correspondeu a sentimento vasto, claro e maioritário da sociedade americana. Mas foca-se em segmentos que perderam benefícios e a noção de "domínio" nas últimas décadas e viram em Trump o seu campeão para proteger o seu último reduto.
UMA INTERROGAÇÃO: Que "October surprise" haverá nesta eleição 2020?
UM ESTADO: Géorgia
Resultado em 2016: Trump 50,8%-Hillary 45,6%
Resultado em 2012: Romney 53,3%-Obama 45,5%
Resultado em 2008: McCain 52,2%-Obama 47,0%
Resultado em 2004: Bush 58,0%-Kerry 41,4%
(nas últimas 12 eleições presidenciais, 3 vitórias democratas, 9 vitórias republicanas)
-- A Geórgia tem 10,7 milhões habitantes: 52,0% brancos, 9,9% hispânicos, 32,6% negros, 4,4% asiáticos; 51,4% mulheres
16 VOTOS NO COLÉGIO ELEITORAL
UMA SONDAGEM: Geórgia | Trump 47-Biden 45
(Landmark Communications, 14/15 agosto)
*autor de quatro livros sobre presidências americanas