"Atitude politicamente corajosa." Vitor Ramalho saúda ausência de Marcelo da cimeira da CPLP
O encontro fica marcado pela ausência dos Presidentes de Portugal, Angola e Brasil. A TSF falou com Vitor Ramalho sobre o significado político desta atitude
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Na XV Conferência dos chefes de Estado e de Governo convocada para Bissau esta sexta-feira, um dos pontos da agenda é a passagem da presidência da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) para a Guiné Equatorial em 2027, e durante dois anos. O Presidente da República recusou participar nesta cimeira, uma atitude que o antigo presidente da União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa (UCCLA) considera, em declarações à TSF, "muito justa e politicamente corajosa". "Saúdo o presidente Marcelo porque [esta decisão] vai ter impactos futuros importantes, até internamente, para a Guiné Equatorial."
Dirigente da UCCLA até 2024 e especialista em temas africanos que envolvem os países de língua portuguesa, Vitor Ramalho lembra que, quando aderiu à CPLP, a Guiné Equatorial comprometeu-se a cumprir a salvaguarda dos direitos humanos. "Isso não tem sido feito como essência, como norma, há sistematicamente atropelos [aos direitos humanos]. Portanto, é muito difícil uma estrutura que aceitou a Guiné Equatorial como parceiro, não ter agora uma atitude firme, dizendo 'Isto não pode ser, não pode continuar'", vinca.
O presidente da Guiné Equatorial, Teodoro Obiang, mantem-se no cargo desde 1979 e, na opinião de Vitor Ramalho, está a preparar uma espécie de monarquia, em que passará o testemunho ao seu filho. O também antigo secretário de Estado, amigo pessoal de Mário Soares, recorda que Obiang encontrou-se recentemente com Putin para garantir a permanência no país do Afrika Korps — grupo paramilitar sucedâneo dos mercenários da Wagner — e assim assegurar que o filho assuma o cargo. O filho já foi julgado em França e considerado culpado de branqueamento de capitais, branqueamento de fundos públicos desviados e abuso de confiança. "A CPLP não pode, nem deve ficar indiferente a isto", sublinha.
Ramalho assinala igualmente que, com a sua ausência, Marcelo Rebelo de Sousa também demonstra que “esta cimeira é problemática". O presidente da Guiné-Bissau, Sissoco Embaló, que devia ter deixado o cargo em fevereiro, ainda não o fez. "A oposição ao regime de Sissoco sempre considerou que [o encontro] não devia ter lugar, quando a própria CPLP impõe, como é evidente, as regras de democracia para os países que dela fazem parte."
O ex-presidente da UCCLA julga também que Marcelo não se sente confortável com o pacote legislativo sobre imigração apresentado pelo Governo e que esse será outro motivo para não estar presente no encontro da CPLP. Vitor Ramalho lamenta que se esteja a esquecer a história e os laços existentes entre os países de língua portuguesa: "Houve aqui grande precipitação."
"Admito que questões de ponderação política no quadro dos equilíbrios do Parlamento acabaram por se sobrepor a desígnios nacionais”, acredita.
Reconheço ao Presidente Marcelo um ato de grande coragem e estou convencido, porque fui colega dele na faculdade e conheço a inteligência que tem, que será muito difícil ele não enviar esta lei dos imigrantes para o Tribunal Constitucional