Construído com os donativos dos portugueses depois da passagem do ciclone Idai, o centro de saúde do Macurungo vai ser entregue ao povo moçambicano, a 15 de Março, precisamente um ano depois da tragédia.
Corpo do artigo
Quando hoje se abrem os portões do Centro de saúde urbano do Macurungo, é difícil imaginar como eram as instalações há um ano. Na altura do ciclone Idai, as instalações precárias não resistiram à fúria da chuva e do vento. Os tectos voaram e foi em tendas que os médicos e enfermeiros assistiram milhares de moradores de um dos bairros mais povoados da Beira. Durante a emergência, equipas da Cruz Vermelha Portuguesa cuidaram dos feridos, fizeram partos e enfrentaram um surto de cólera. O socorrista José Moniz explica que por se encontrar abaixo do nível médio das águas, a contaminação dos solos fez disparar os casos de cólera.
O abastecimento de água do centro "funcionava com água tirada de poços de abastecimento", acrescenta Inês Fonseca, também socorrista e técnica de qualidade ambiental, que dirigiu a última fase das obras. Agora, foi erguida uma torre que garante o abastecimento de água potável e se falharem os furos e a rede de águas, "cinco depósitos asseguram o funcionamento do centro durante uma semana".
Além de um edifício construído de raiz, a maternidade ganhou uma nova sala, foram reforçadas as estruturas existentes, garantindo uma maior resistência em caso de uma nova catástrofe. Inês Fonseca dá o exemplo dos portões de correr, que em caso de emergência, são fechados para travar a entrada do vento. Na estrutura, há também aberturas para a circulação do ar, mas sem que o vento possa levantar tectos e placas como aconteceu com o Idai. Em Dezembro, um mini-Idai, como foi designado pelos moradores, serviu de teste ao complexo. A chuva e os ventos fortes afectaram apenas a cobertura de um passadiço e serviu de lição para reforçar ainda mais as chapas de protecção dos edifícios.
TSF\audio\2020\03\noticias\14\16_marco_2020_cristina_lai_men_macurungo_cvp
Simon Simango, residente em Macurungo, nota que a qualidade do atendimento e dos médicos também melhorou, já que foi dada formação aos profissionais de saúde. Este utente, que faz anos a 15 de Março, o dia do ciclone, já recuperou o tecto da casa e um anexo que tinha ficado destruído. "Sofremos", afirma, "mas estamos mais preparados. Sabemos que temos de pregar as janelas, ficar em casa onde é mais seguro, não andar nas ruas à noite". Mesmo assim, confessa "todos nós temos medo".
O Idai "deixou as pessoas no castigo", reforça Sahla Pedro, 43 anos, mãe de seis filhos. Uma das crianças gosta tanto de ir ao centro de saúde que numa consulta, pediu "mamã, não quero sair mais. Por sentir a brisa da ventoinha na sala da médica", conta Sahla, divertida. As crianças foram muito afectadas pelo Idai, "porque perderam os pais, perderam as casas. Tinham alguma coisa, mas ficaram sem nada", recorda José Moniz. Logo após o ciclone, o centro era um ponto de encontro das crianças e ainda hoje, aqui se reúnem depois das aulas. Duas vezes por semana, há actividades promovidas pela equipa de apoio psico-social, por enquanto ainda instaladas em duas tendas brancas. Em Macurungo, os residentes "falam do Idai com medo e respeito. Até porque estamos a fazer um ano sobre o ciclone, o Idai ainda está vivo e os moradores vêem o centro como um local de refúgio".
Um ano depois, o Centro atende diariamente entre 400 a 500 pessoas, muitas delas ainda com "infecções em resultado do Idai". Vêm às consultas fazer o acompanhamento e levantar a medicação, em resultado dos problemas de saúde adquiridos com o ciclone. A nova unidade, inaugurada em Janeiro por Marcelo Rebelo de Sousa, é ainda a primeira na Beira, a ter uma incineradora (além do Hospital Central da Beira) e servirá de modelo a outros centros de saúde na província de Sofala. A obra custou 2 milhões de euros, angariados com donativos dos portugueses, e com a entrega da chave da unidade de saúde às autoridades moçambicanas, fica concluída a Missão Embondeiro, da Cruz Vermelha Portuguesa. "Uma prenda do povo português para as pessoas de Macurungo, da Beira e de Moçambique", sublinham José Moniz e Inês Fonseca, orgulhosos pela missão cumprida.