Uma "eleição atípica". Bolsonaro cresceu à custa da erosão do PSDB e das redes sociais
Joyce Leão Martins estuda todas as campanhas eleitorais no Brasil desde 1989 e diz que nunca se viu nada assim. Ela considera que Bolsonaro ocupou o lugar da Direita democrática. E que Haddad ainda pode ganhar.
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Para entender melhor o que estão a ser estas eleições, será fundamental ver o que aconteceu ao Partido Social Democrata Brasileiro que, durante 20 anos, ou governou ou foi o líder da oposição.
Joyce Leão Martins, pós-doutoranda em Ciência Política, que estuda as campanhas eleitorais no Brasil, considera que o PSDB foi fundamental para a ascensão de Bolsonaro.
"A partir de 2010, o PSDB começou a sair do lugar de fala da oposição. Era um momento em que o Governo Lula tinha atingido mais de 80% de aprovação popular e o José Serra, que era candidato em 2010, começa a dizer ser o melhor sucessor para o Governo Lula. Acabou por aparecer como um candidato genérico porque o verdadeiro sucessor era quem o Lula estava a dizer que era, era a Dilma, e o PSDB vai então começando a sair paulatinamente desse lugar de fala da oposição, que vai ficando vazio. E na Política não existe lugar vazio, né? Esse lugar foi ficando vago para que outras pessoas e outros valores o ocupassem. Até então, nós tínhamos uma Esquerda e uma Direita democráticas no nosso país."
Este contexto político é muito importante, mas Joyce Leão Martins sublinha que há um fenómeno social que explica a ascensão de Bolsonaro e o sentimento anti-PT, não sendo, por isso, de estranhar o papel que as redes sociais estão a ter.
"Até às eleições passadas nós tínhamos um horário eleitoral, que é um bloco de propagandas que passa diariamente na TV como a variável explicativa do voto dos brasileiros. Agora nós temos um novo meio de comunicação que são as redes sociais, e que é muito mais difícil haver um debate porque a gente não sabe o que é que está rolando nos subterrâneos das redes sociais. E com certeza isso está fazendo uma diferença nessas eleições muito forte."
Desde o início desta semana, a campanha de Fernando Haddad tem insistido "na virada", na ideia de que o resultado está a mudar, e a última sondagem Datafolha indica uma recuperação do candidato do PT. A verdade, no entanto, é que um candidato que não venceu na primeira volta conseguir ganhar na segunda, nunca aconteceu desde 1989. A doutoranda em Ciências Políticas vê a hipótese como difícil de concretizar, mas salienta o caráter único desta campanha.
"Se a gente for olhar para o passado, muitas coisas não podem ser explicadas nessa eleição. Olhando para o passado, essa virada seria muito improvável, essa virada nunca aconteceu. Mas nós estamos perante uma eleição atípica, então, pode ser que aconteça. O Bolsonaro foi agora acusado de estar junto de empresários para promover essa campanha de 'fake news', e o próprio WhatsApp tomou medidas para que isso fosse contido. Pode ser que isso chegue, não tendo mais essa enxurrada de "fake news", e o Haddad falando com lideranças religiosas, que ainda definem muito o voto no Brasil... Pode ser que haja uma mudança."
A resposta virá no domingo.