São mais de 400 páginas com discursos que promovem a ausência completa de "compaixão" em relação à minoria religiosa. Vêm agora a público, e a Amnistia Internacional de Portugal diz ser impossível ignorar as conversões forçadas e "abuso de direitos humanos".
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Documentos do Governo chinês, divulgados este domingo pelo jornal norte-americano The New York Times , revelam novos detalhes acerca das detenções em massa na região de Xinjiang (no noroeste do país) de pessoas das minorias muçulmanas.
Ouvida pela TSF, a Amnistia Internacional apela ao Governo português e ao secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, para que não fechem os olhos aos mais de 400 documentos revelados por um membro do Executivo chinês descontente com a política e mantido no anonimato, que detalham as detenções que têm vitimado minorias muçulmanas, nomeadamente uigures.
Nas centenas de páginas que chegam agora a público, o Presidente chinês alega uma "luta generalizada contra o terrorismo, a infiltração e o separatismo", para que "sem qualquer misericórdia" se utilizem "mecanismos de ditadura".
Pedro Neto, da Amnistia Internacional de Portugal, frisa que cabe à comunidade internacional, e a Portugal em especial, pronunciar-se sobre este abuso dos direitos humanos. "Estes documentos mostram claramente aquela que é a intenção das autoridades chinesas, que infelizmente não nos parece surpreendente."
De acordo com o representante da Amnistia, os números negros vêm dar peso às intenções do Executivo: "Estimamos que, desde 2017, mais de um milhão de pessoas desapareceu, desta minoria uigur, naquela região de Xinjiang."
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O Governo chinês tem estado debaixo de uma crescente pressão diplomática por acusações de que mantém detidos um milhão de uigures em centros de doutrinação política em Xinjiang.
Aliás, antigos detidos confirmam mesmo terem sido forçados a criticar o islão e a sua cultura e a jurar lealdade ao Partido Comunista Chinês, em alusão ao que ocorreu aquando da Revolução Cultural (1966-1976), da autoria do fundador da República Popular da China, Mao Zedong.
Pedro Neto vinca que se trata de "pessoas que são levadas para centros de reeducação para que apreendam a doutrina chinesa e para que esqueçam a sua cultura e as suas crenças".
Estes documentos que vieram à superfície vêm dar força às denúncias que têm vindo a ser feitas pela Amnistia Internacional, e a China tem de ser chamada a prestar contas, posiciona-se Pedro Neto. "O mundo tem de olhar para estas pessoas. São muitas as que já estão desaparecidas."
Portugal terá também uma palavra a dizer sobre um país com quem tem parcerias económicas e diplomáticas: "É claro que há aqui abusos de direitos humanos, e a comunidade internacional, e Portugal em particular, tem de se pronunciar sobre isto."
Por isso, o representante da Amnistia Internacional portuguesa, em declarações à TSF, insta "o Governo e o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres", a fazer com que Pequim se explique. "A China tem de prestar contas sobre o que está a fazer."
Em abril de 2014, um grupo de uigures matou 31 pessoas num ataque a uma estação ferroviária. As páginas que o jornal norte-americano divulgou exibem discursos do Presidente Xi Jinping diante de funcionários da sua Tutela para que não mostrassem absolutamente "nenhuma compaixão" quando respondessem a este atentado.
Os uigures são predominantemente muçulmanos e etnicamente distintos do grupo maioritário do país, os chineses han, a população mais numerosa na região chinesa de Xinjiang, na fronteira com o Paquistão e o Afeganistão.
Inicialmente o Governo de Pequim tinha negado a existência destes campos de reconversão, mas já fez saber que se tratavam de centros de formação vocacional para integrar esta minoria na sociedade chinesa.