"Choque e revolta." Cartoonistas portugueses recordam dia do ataque ao Charlie Hebdo
Mais de cinco anos depois do ataque, julgamento ao Charlie Hebdo vai começar e cartoonistas nacionais contam à TSF como recordam o dia marcante para a arte do cartoon.
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No dia do arranque do julgamento do massacre na redação do Charlie Hebdo, que causou 12 vítimas mortais, Nuno Saraiva e António, dois cartoonistas portugueses, recordam o dia que marcou a história desta arte e a forma como foi impactante para o mundo das caricaturas políticas.
Nuno Saraiva recorda aquele dia 7 de janeiro de 2015 "como se fosse hoje". "Estava a fazer um cartoon, fiquei chocadíssimo com o que aconteceu até porque fui uma criança discretamente fã do Cabu e do Wolinski, eram praticamente heróis aquelas pessoas que foram cobardemente assassinadas", conta.
O choque foi seguido da mudança e o cartoonista português admite que o ataque terrorista lhe trouxe múltiplos sentimentos. "Sinto-me mais revoltado e com mais vontade de denúncia", refere, alertando que o ataque "deu armas ao inimigo, que é o politicamente correto, uma censura real, mas encabeçada, que tem um corpo mas não um rosto".
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Os cartoonistas e humoristas acabaram por ficar mais cautelosos, apesar de admitir que não vale tudo no humor. "Há limites no humor, fazer humor sobre a morte de uma criança, por exemplo, ou induzir a criança a beber álcool ou a experimentar drogas, mas é tudo muito estanque, às tantas não sei até que ponto não estaremos a balear-nos a nós próprios se estivermos a dizer que não há limites para o humor", explica.
Já o cartoonista António esperava que o ataque ao Charlie Hebdo pudesse aumentar
o amor pela caricatura, depois de ter havido uma "emoção grande em toda a Europa" e "solidariedade com os cartoonista", mas não sente que tenha sido bem assim.
"Aparentemente podia ser um momento favorável para o cartoon, acabou por não ser", realça, justificando-o com uma "certa viragem à direita da maior parte dos países" e também com "a crise da imprensa em papel, com a concorrência da internet, das televisões, que tem vindo a perder espaço e o cartoon também".
Desafiado a desenhar, hoje, a primeira página jornal, António faria "qualquer coisa que defendesse os seguidores, que prestasse homenagem aos que caíram nesse dia e que fosse um levado de esperança para o futuro do desenho de imprensa".
Cinco anos depois do ataque, a revista decidiu republicar as mesmas caricaturas de Maomé que transformaram a publicação num alvo terrorista.