Entre os elegíveis, estão os descendentes diretos de cidadãos negros que entre 1919 e 1969 foram alvo de práticas discriminatórias no acesso à habitação.
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A cidade de Evanston, nos arredores de Chicago, deverá aprovar, na segunda-feira, um projeto para começar a pagar reparações aos cidadãos negros num valor estimado de 10 milhões de dólares na próxima década.
Localiza nos arredores de Chicago, a cidade de 75 mil habitantes, vai levar, segunda-feira, a votação do conselho municipal, um projeto que permitirá desbloquear uma primeira parcela de 400 mil dólares para oferecer reparações aos cidadãos afro-americanos, descendentes de escravos, que ajudaram a construir os Estados Unidos.
O projeto será financiado pela taxa sobre a venda de canábis, conta com largo apoio dos munícipes e deverá beneficiar nesta primeira fase "um punhado" de habitantes que irão receber cerca de 25 mil dólares para usar na compra ou reparação de casas.
Entre os elegíveis, estão os descendentes diretos de cidadãos negros que viveram em Evanston, entre 1919 e 1969, e que foram alvo de práticas discriminatórias no acesso à habitação ou cidadãos negros com mais de 18 anos confrontados com as mesmas práticas na atualidade.
Em causa esta, em particular, a prática conhecida como "redlining", segundo a qual os bancos limitavam os empréstimos à habitação concedidos aos residentes de certos bairros pobres, a maioria dos quais eram negros, marcando-os com uma linha vermelha nos mapas e reforçando a segregação que existia desde o final do século XIX.
"Não se trata apenas de escravatura, [a necessidade de reparações] vai além disso", observou Ron Daniels, membro da National African American Reparations Commission (NAARC), uma associação fundada em 2015.
Para Ron Daniels, as injustiças são imensas, e vão desde o facto de os afro-americanos não terem podido beneficiar de muitas medidas fundiárias e imobiliárias, à sistemática falta de investimento nos bairros negros ou à guerra antidroga que afeta de forma desproporcionada as populações negras.
"Em todas estas áreas, são necessárias reparações", disse.
Ao concentrar-se na discriminação imobiliária, Evanston pretende "construir riqueza através da habitação", disse, por seu lado, a vereadora Robin Rue Simmons, que representa um dos bairros negros da cidade e lidera o projeto.
Simmons ressalvou, no entanto, que a iniciativa não pretende substituir as devidas reparações federais.
"Este é um pequeno primeiro passo para a restituição e justiça para a minoria negra na nossa cidade de Evanston, mas as reparações não serão suficientes sem a lei HR40 e os recursos federais que viriam com ela", disse, referindo-se ao projeto de lei para estabelecer uma comissão parlamentar sobre este assunto, que tem sido constantemente paralisado pelo Congresso.
Após a Guerra Civil (1861-1865), os ganhos obtidos pelos afro-americanos cedo deram lugar a uma era de segregação e violência, que só terminou nos anos 60, após a aprovação de leis de direitos civis.
O mandato do ex-presidente Donald Trump e os protestos do movimento "Black Lives Matter", que se seguiram à morte de vários afro-americanos por agentes policiais em 2020, fizeram despertar os Estados Unidos, com vários candidatos nas eleições primárias do Partido Democrático a proporem abordar a questão das reparações.
Considerada uma questão complexa, os seus defensores apontam o precedente dos milhões de dólares pagos aos nipo-americanos retidos em campos durante a Segunda Guerra Mundial.
Nesse caso, contudo, o período de tempo e os danos causados eram mais facilmente mensuráveis, ao contrário dos danos sofridos por gerações inteiras de afro-americanos que ficaram marcados pela escravatura, segregação e discriminação.
Para Robin Rue Simmons, a complexidade da questão não deve impedir que se comece a agir.
"Comecem agora, sem necessidade de fazer estudos, sem necessidade de esperar por novos dados. Diga sim às reparações e à justiça para os negros", apelou.
CFF