Em pouco tempo, o PT vai ter que ganhar palco virtual e decidir se muda de estratégia para responder aos medos dos brasileiros. Estarão Haddad e o partido prontos para discutir mais ideias e menos Bolsonaro? A TSF foi à procura de respostas.
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Fernando Haddad está numa corrida contra o tempo para tentar vencer Bolsonaro na segunda volta das presidenciais do Brasil. A História mostra, contudo, que será muito difícil o candidato do PT cortar a meta em primeiro lugar a 28 de outubro. Serão três semanas o tempo suficiente para o PT dar a volta aos resultados?
"Vai ser muito difícil", admite Felipe Leal Albuquerque, mestre em Relações Internacionais, que explica que mesmo que uma larga fatia dos apoiantes dos restantes candidatos se juntassem para apoiar Haddad, o resultado seria insuficiente para vencer Bolsonaro.
"As sondagens mais recentes mostram que cerca de 80% do eleitorado do Ciro deve migrar para o Haddad. Mais ou menos 40% do eleitorado do Alckmin e da Marina devem também fazer o mesmo. Isso dá um percentual de votos que chega perto dos 40% [para o candidato do PT]. Assim, Bolsonaro ainda está na frente."
A decisão pode estar na mão dos indecisos e da abstenção, que este ano registou um valor inesperado: apesar de o voto ser obrigatório no Brasil, a taxa de abstenção foi de 20,3%, a mais elevada dos últimos 16 anos.
PT dividido: Discutir propostas ou discutir Bolsonaro?
Enquanto Bolsonaro usou os anseios dos brasileiros para conquistar votos, a oposição esforçou-se por argumentar porque é que os eleitores não deviam escolher o candidato do PSL. A três semanas da segunda volta, o PT está dividido.
"O que se discute na cúpula do PT é se o PT deve adotar um discurso mais duro, mais agressivo com Bolsonaro ou se deve passar a discutir propostas concretas: segurança, educação, criação de empregos.", adianta o investigador.
Felipe Leal Albuquerque acredita que o apoio de Ciro Gomes, candidato do PDT, a Haddad pode ser fundamental para chegar aos brasileiros descontentes com a falta de resposta para problemas concretos.
"O discurso da segurança pública está mobilizado pela direita, o discurso da insatisfação popular e das pautas [matérias] mais diretas também. O PT precisa falar mais com esse eleitorado. Eu acho que o Ciro Gomes vai ajudar muito com isso. O Ciro até agora tem usado mais esse tipo de estratégia."
Bolsonaro, sem ideologia, falou para todos
Jair Bolsonaro é um paradoxo. As palavras não casam com a conduta do candidato que, sem uma ideologia marcada, conseguiu falar para todos, como escreve Rodrigo Tavares na TSF.
"Votam nele os dececionados com o PT ou os militantes do antipetismo e antilulismo (apesar dele já ter dito que votou no Lula em eleições passadas), votam nele o que defendem o liberalismo económico e o Estado mínimo (apesar dele ter defendido o estatismo no passado e o PT ser, cada vez mais, correlegionário do mercado financeiro), votam nele os milhões de conservadores sociais que finalmente encontraram uma voz que os represente (apesar de ser um pós-moderno dentro de casa), votam nele os que são anti-establishment (apesar dele ser o protótipo do político profissional e burocrata) e os que sofrem com a insegurança económica provocada pela atual crise (apesar dele ser confessamente pouco talentoso para enfrentar a tempestade económica que o país atravessa)."
O medo é o motor para esta vontade dos eleitores que se veem mergulhados numa profunda crise e que procuram nas soluções mais extremadas uma solução para o país.
Faltou um "mea culpa" do PT
"O Bolsonaro não é só um fenómeno político. O Bolsonaro é um fenómeno social.", assegura Joyce Martins, pós-graduanda da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
A investigadora sublinha que "qualquer candidato que ganhe vai enfrentar um momento bem difícil, porque a população está dividida" e acredita que teria sido fundamental que o PT tivesse assumido responsabilidades pela situação do país e pela descredibilização dos políticos do partido.
"O mea culpa do Partido dos Trabalhadores teria sido fundamental para que esse ódio tão forte não tivesse tido essa força. Não diria que não ocorreria, mas talvez a força dele não tivesse sido tão grande."
Acresce que quase até ao fim da corrida eleitoral, Lula era o candidato do PT, sendo que os brasileiros só tiveram o primeiro contacto com a figura de Haddad como candidato a um mês das eleições, quando a campanha de Bolsonaro já pulsava há largos meses.
Pouca despesa, redes sociais e carisma: os ingredientes que conduziram à liderança de Bolsonaro
O candidato do PSL provou que não é preciso fazer uma campanha dispendiosa para conquistar a liderança, explica António Flávio Testa, sociólogo e investigador da Universidade de Brasília, que acredita que o "carisma" foi fundamental para que o candidato conseguisse angariar votos, bem como uma aposta clara na utilização das redes sociais.
"Bolsonaro começou a usar as redes sociais com a antecipação do seu adversário e muito bem utilizado, e isso fez com que houvesse uma mudança do comportamento do eleitor para o candidato que estava a surgir como uma novidade."
Neste campo, as diferenças entre Haddad e Bolsonaro tornaram-se ainda mais evidentes quando no momento em que se soube que haveria uma segunda volta, o candidato do PT escolheu reagir aos resultados numa conferência de imprensa televisionada, sendo que, por outro lado, Bolsonaro escolheu reagir através de um vídeo no Facebook.
https://www.facebook.com/jairmessias.bolsonaro/videos/250825412292718/