COP29: "UE teria de suportar grande parte do financiamento." Ministra teme possível saída dos EUA do acordo climático
O financiamento climático dos países mais pobres é o grande obstáculo nas negociações na cimeira do clima. À TSF, Maria da Graça Carvalho afirma que é essencial existir um compromisso para fazer face à eventual saída dos Estados Unidos do acordo
Corpo do artigo
A generalidade dos países rejeitou um novo, mas vago, projeto de acordo da presidência da cimeira do clima do Azerbaijão, que tenta encontrar a base de um documento consensual sobre o financiamento climático dos países mais pobres. A reunião da ONU está a decorrer em Baku há quase duas semanas e deveria terminar esta sexta-feira, mas até agora não foi alcançado qualquer acordo no que respeita ao dinheiro para os países em desenvolvimento fazerem a transição para energias limpas e adaptarem-se às alterações climáticas.
O projeto apresentado deixou de fora um ponto crucial: quanto é que as nações ricas pagarão aos países pobres. Em entrevista à TSF, a ministra portuguesa do Ambiente, Maria da Graça Carvalho, acredita que será ainda possível chegar a um entendimento, eventualmente, até sábado, uma vez que, afirma a governante, é essencial existir um compromisso para fazer face à eventual saída dos Estados Unidos do acordo.
Maria da Graça Carvalho explica que a União Europeia não assina qualquer documento sem um compromisso de países como a China, os Emirados Árabes Unidos ou a Arábia Saudita.
"Vai depender de termos outros países a contribuir e, se houver muitos países a contribuir, se calhar até podemos, ter um bocadinho mais do que o duplicar", afirma à TSF a ministra do Ambiente, sublinhando que o "financiamento não é só público, como era até aqui, é também privado, com outros mecanismos".
"Precisamos ainda de ter a certeza que vamos ter um conjunto maior de países a contribuir, porque não podemos ficar num cenário em que, de um momento para o outro, os Estados Unidos saem do acordo e temos então uma responsabilidade muito grande, num número muito restrito de países, em que a UE teria de suportar grande parte desse financiamento", acrescenta.
Os países que aceitam contribuir de forma voluntária com dinheiro para os países mais pobres têm um "X" no lugar do valor que devem pagar. Sem um compromisso sobre as quantias exatas, a União Europeia não quer correr o risco de ficar a pagar sozinha o custo das alterações climáticas.
Os negociadores nas conversações da COP29 estão a tentar colmatar a lacuna entre os 1,3 biliões de dólares que o mundo em desenvolvimento diz serem necessários para o financiamento do clima e as poucas centenas de milhares de milhões que os negociadores dizem que as nações mais ricas estão preparadas para dar.
Os países em desenvolvimento exigiram "pelo menos" 500 mil milhões de dólares por ano de financiamento climático aos países ricos até 2030.
Os 500 mil milhões é um valor acima dos 100 mil milhões que foram acordados até 2025, mas é metade do que especialistas ouvidos pela ONU consideram necessário.
Sobre o projeto de acordo da presidência, o enviado dos Estados Unidos juntou-se à União Europeia para o rejeitar, com o enviado da administração de Joe Biden, John Podesta, a afirmar-se profundamente preocupado com o documento.
A China, também rejeitou o projeto de acordo e apelou a um compromisso. "O texto atual contém muitos elementos que não são satisfatórios nem aceitáveis para a China", declarou o representante chinês, Xia Yingxian, reiterando a rejeição de qualquer texto que obrigue a China a contribuir para a ajuda financeira internacional aos países em desenvolvimento.
A Arábia Saudita e o Grupo Árabe também revelaram que rejeitarão qualquer texto que vise os "combustíveis fósseis".
Do lado dos países em desenvolvimento levantaram-se também vozes, como a da ministra do Ambiente da Colômbia, Susana Mohamed: sem um valor oferecido pelas nações desenvolvidas "estamos a negociar sobre nada".
Juan Carlos Monterrey Gomez, do Panamá: "a falta de transparência nos compromissos é como uma bofetada na cara dos mais vulneráveis".
Esa Ainuu, da pequena ilha de Niue, no Pacífico, também criticou a falta de um número no projeto de acordo.
"Para nós, no Pacífico, isto é fundamental", afirmou Esa Ainuu. "Não podemos fugir para o deserto. Não podemos fugir para outro sítio. Esta é a realidade para nós. Se as finanças não estão a trazer nada de positivo, porque é que viemos à COP?".
O enviado da União Europeia para o clima, Wopke Hoekstra, já tinha considerado o projeto "desequilibrado, impraticável e inaceitável".