Da política aos media. Berlusconi, o milionário que viveu de escândalo em escândalo
Silvio Berlusconi morreu esta segunda-feira aos 86 anos.
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"Il Cavaliere" (o cavalheiro) - era assim que gostava de ser tratado depois de, em 1994, ter sido o mais jovem distinguido como cavaleiro da Ordem de Mérito do Trabalho, que acabaria por abandonar voluntariamente em 2014. Mas a vida de Berlusconi confunde-se com o sucesso no mundo dos negócios e a polémica na vida política.
Nasceu em Milão em 1936, ainda Mussolini estava no poder. Desde cedo, mostrou dotes para o negócio, ao ponto de ainda na escola primária vender apontamentos aos colegas.
Começou a trabalhar muito cedo, primeiro como vendedor de porta a porta de eletrodomésticos e depois como animador e cantor em cruzeiros no Mediterrâneo. O dinheiro que fez na música permitiu-lhe pagar o curso de direito, deixando a universidade de Milão como um dos melhores alunos do curso.
A carreira empresarial iniciou-se na área da construção civil. Fundou uma equipa de jovens arquitetos e lançou-se na construção de dois grandes empreendimentos nos arredores de Milão. Enriqueceu, mas apaixonou-se pelo setor dos media, que lhe dava grande visibilidade aos negócios.
No início dos anos 70 fundou o primeiro canal de televisão por cabo, mas em pouco tempo, expandiu o domínio. Uma década depois, já detinha um grande império mediático, tornando-se nos anos 90 o homem mais rico de Itália.
Este ano, a revista norte-americana Forbes classificou a sua fortuna e da sua família como a 352.ª maior do mundo, com um património líquido de 6,8 mil milhões de dólares (cerca de 6,2 mil milhões de euros).
Paralelamente ao imobiliário e aos media, Berlusconi investiu milhões no futebol e adquiriu um dos maiores clubes italianos, o AC Milan.
Nesta altura, quis entrar no mundo da polícia e, em 1993, fundou o próprio partido - o Forza Italia. Um ano depois, apresentou aos italianos uma forte campanha centrada na defesa dos valores tradicionais, na luta contra a corrupção, redução do défice público, o que lhe permitiu vencer as eleições legislativas.
As falhas na adoção de um vasto programa económico e as acusações de negócios pouco claros levaram à sua demissão, apenas sete meses após a eleição. Mas Berlusconi não desistiu: concorreu novamente em 1996, mas só regressou ao poder em 2001, através da coligação a casa da liberdade.
Os sucessivos mandatos de Berlusconi em Itália confundiram-se com a afirmação de Itália no espaço europeu, mas em 2011, em plena crise europeia, demitiu-se e em 2013 foi mesmo expulso do Senado por votação dos deputados.
A vida de Berlusconi fica também marcada pelos vários escândalos e processos judiciais. Com grande influência no mundo empresarial e político alguns setores da sociedade consideraram que era o maior perigo público italiano.
Entre o rol de processos judiciais que enfrentou contam-se acusações de lavagem de dinheiro, participação em homicídio, ligação à máfia, fuga ao fisco, pedofilia, corrupção e suborno de agentes de autoridade e figuras judiciais, entre outros crimes. Nenhum dos julgamentos resultou condenações definitivas.
No final de 2010, Berlusconi viu-se envolvido em mais um caso - o "escândalo Rubygate" - no qual foi acusado de ter pago favores sexuais a uma menor, - a jovem marroquina Karima El Mahrug, conhecida como 'Ruby Rubacuori' (Ruby Rouba-corações), tendo sido condenado a sete anos de prisão e inibido de exercer qualquer cargo político. Contudo, apresentou recurso e foi ilibado.
Num dos últimos julgamentos sobre alegadas fugas ao fisco, Berlusconi foi condenado apenas a serviço comunitário.
O prestigiado cineasta italiano Nanni Moretti satirizou-o na longa-metragem "O Caimão" (2006), centrada nas dificuldades enfrentadas por um produtor e uma argumentista para arranjarem financiamento para um filme sobre Berlusconi, que ainda tentou travar a exibição, mas não conseguiu.
Também o cineasta italiano Paolo Sorrentino realizou, em 2018, um filme sobre o magnata, intitulado "Loro" e que, embora advertindo no princípio tratar-se de uma obra de ficção, retrata o segundo casamento de Berlusconi, com Veronica Lario (1990-2010), com quem teve três filhos, enquanto dava festas cheias de mulheres, e também as suas tentativas de se manter na política italiana.
O empresário e dono do império de media nunca deixou a vida política e foi eleito para o Parlamento Europeu em 2019.
Mais recentemente, foi criticado pela condenação ao apoio europeu à Ucrânia, culpando Zelensky pela invasão russa.
Apesar das sucessivas polémicas, Silvio Berlusconi sempre cultivou a controvérsia, tendo chegado a classificar-se como "o melhor líder político da Europa e do mundo", depois de se ter comparado com Jesus Cristo e de ter também afirmado: "Apenas Napoleão fez mais do que eu fiz. Mas eu sou definitivamente mais alto".
