No Dia Internacional da Tradução, a TSF conta o percurso e os desafios de Miroslava Petrovská, dos livros do Nobel português à chefia da Unidade Eslovaca do Parlamento Europeu.
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"Alquequenje." A palavra foi um travalínguas que fez a eslovaca Miroslava Petrovská passar noites em claro numa desafiante busca. Encontrou-a numa obra de Saramago, autor que traduzia para eslovaco.
"Pelo contexto, eu percebi que se tratava de um produto ou de uma substância curativa, mas não encontrei a palavra correspondente ou o que era exatamente", recorda a tradutora à TSF. Anos mais tarde, o dia de confrontar o escritor português com aquela escolha chegou.
Quando lhe perguntou pela "misteriosa substância", o autor riu e disse ter descoberto o produto numa enciclopédia brasileira muito antiga. "Gostei tanto desta palavra que a utilizei", justificou.
Com a passagem dos anos, a tradução deixou de ser uma questão misteriosa de alquimia, e transformou-se num exercício que exige destreza e familiaridade.
Miroslava Petrovská é hoje uma das profissionais invisíveis que se sentam em cabines e cujas vozes chegam pelos auscultadores. A chefe da Unidade Eslovaca do Parlamento Europeu tem como segunda língua o português e trabalha como intérprete há 16 anos. Das obras de Saramago a Bruxelas, esta língua que considera "poética" tem acompanhado a jornada, e a seleção de vocábulos tem muito a dizer sobre cada um dos interlocutores, conforme explica à TSF.
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"Gosto muito, porque é muito entusiasmante interpretar os políticos. Acho que a linguagem dos políticos é escolhida com muito cuidado, e é preciso saber captar as nuances", realça, sobre um trabalho que "é um desafio, e, quando se consegue, é sempre uma satisfação que se sente".
Para Miroslava Petrovská, impõe-se, nesta tarefa, conhecer bem a língua, mas nem sempre se deve interpretar tudo à letra, como no caso das crianças bilingues. É um equilíbrio que requer muita arte e engenho, de forma a "transferir o conteúdo sem necessariamente usar as mesmas palavras do orador".
O Parlamento Europeu tem a maior equipa de intérpretes e tradutores do mundo. Ao todo, são mais de 350 que ali trabalham em permanência, e a que se juntam ainda outros 400 que trabalham de forma independente, os chamados freelancer.
A maior parte dos intérpretes trabalha com quatro ou cinco línguas. Estes profissionais colaboram para que as pessoas se entendam entre si, num espaço em que se ouvem mais de 20 línguas oficiais.