O presidente do Governo espanhol apela à regeneração democrática e diz que a sua decisão vai ser um ponto de viragem.
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Depois de cinco dias de suspense, Pedro Sánchez decidiu permanecer à frente do Governo espanhol. “Decidi seguir. Seguir com mais força ainda na frente da presidência do Governo de Espanha”, disse Sánchez esta segunda-feira, numa curta declaração no Palácio da Moncloa, em Madrid.
Sánchez avisou, no entanto, que nada vai continuar igual: “Esta decisão não é um ponto final, é um ponto final parágrafo, posso garantir-lhes. Por isso assumo perante todos o meu compromisso de trabalhar sem descanso, com firmeza e serenidade pela regeneração pendente da nossa democracia e pelo avanço e consolidação de direitos e liberdades.”
Pedro Sánchez disse que foram razões pessoais que o levaram a este período de reflexão, e “numa sociedade que no ensina que temos que continuar a todo o custo”, admitiu que mostrou “sentimentos pouco admissíveis em política”, mas que, “às vezes, a única forma de avançar é parar, refletir e decidir por onde queremos caminhar”.
O líder do Governo espanhol frisou também que tudo isto deve contribuir para uma nova forma de fazer política, “uma reflexão coletiva que abra passo à limpeza, à regeneração, ao jogo limpo”. “Há demasiado tempo que deixamos que o lodo colonize de forma impune a vida política, a vida pública, que nos contamina de prática tóxicas, impensáveis há uns anos”, declarou.
Este fim de semana, milhares de pessoas manifestaram-se em Madrid para mostrar o seu apoio a Sánchez, demonstrações que o presidente agradeceu. “Peço à sociedade espanhola que volte a ser exemplo e inspiração para um mundo convulso e ferido. Mostremos ao mundo como se defende a democracia. Ponhamos fim a este lodo da única forma possível, com a rejeição coletiva serena e democrática, para além das siglas e ideologias, que eu me comprometo a liderar com firmeza.”
Reações de esquerda a direita
Dentro do Governo e do PSOE respirou-se de alívio, depois de dias de tensão, nos quais Pedro Sánchez permaneceu completamente isolado, sem comunicar a sua decisão a ninguém.
Um dos primeiros a reagir foi o ministro de Negócios Estrangeiros, Manuel Albares, que sublinhou “a coragem pessoal e democrática apesar das campanhas de assédio que tem sofrido ao longo dos últimos dez anos”. “Não podemos tolerar que o presidente do Governo que nos representa no mundo, a sua mulher e a sua família, se vejam assediados por mentiras e calúnias.”
Por parte dos sócios de Governo, os partidos mostram o seu apoio à decisão do presidente, mas pedem-lhe medidas reais. “Mau exemplo se fosse embora porque não era uma demissão, era uma rendição. Mau exemplo se permanece sem fazer algo real, porque teria sido um ato de frivolidade e não algo real”, escreveu Gabriel Rufián, líder dos catalães do Esquerda Republicana, na rede social X.
Também a segunda vice-presidente do Governo e ministra do Trabalho, Yolanda Díaz, alinhou pelo mesmo discurso. “Este 'ponto final parágrafo' deve ser preenchido com novos conteúdos, iniciativas políticas e políticas públicas. As tentativas de desestabilização só se podem responder com duas ferramentas: mais democracia e mais direitos”, disse Díaz. “Devemos cumprir integralmente o acordo de investidura e ir mais longe, para aprofundar as transformações deste país.”
Por parte da oposição, uma das primeiras a reagir foi Isabel Díaz Ayuso, presidente da Comunidade de Madrid, que, ainda antes da análise do líder do Partido Popular, Alberto Núñez Feijóo, acusou Sánchez de “não ter vergonha” e de “pretender um poder sem controlo”.
Alberto Núñez Feijóo foi mais longe, falou de “ridículo internacional” e acusou Sánchez de ameaçar o país. “Onde buscava respeito, encontrou o ridículo. Não será a última ideia de Sánchez, nem a mais brilhante. Continuará com a sua agonia como achar conveniente, mas chegará o momento em que terá de ouvir a maioria dos espanhóis, mesmo que não queira. Hoje perdeu uma oportunidade fantástica de sair. Se alguma vez considerou dois caminhos, não há dúvida de que escolheu o caminho mais indigno. O que procurava era a polarização, a vitimização e não dar explicações”, concluiu.
Já Santiago Abascal pediu ao líder do Partido Popular que interrompa qualquer negociação com Pedro Sánchez. “Assistimos a um teatro indigno”, disse, para depois o acusar de “usar até a figura do rei” para “sepultar a crítica, garantir a impunidade para os seus crimes e mentiras e incitar o enfrentamento social”.
Sánchez ameaçou demitir na passada quarta-feira, na sequência de uma denúncia contra a sua mulher por um possível delito de tráfico de influências. A denúncia foi apresentada por um sindicato de extrema-direita, que entretanto admitiu que podia estar baseada em notícias falsas e o Ministério Público pediu o arquivamento do caso.
* Notícia atualizada às 13h59
