"Desastre ecológico e cenário devastador." Grande Barreira de Coral sofre verdadeiro "pesadelo branco"
Em declarações à TSF, o investigador Pedro Frade mergulhou na Grande Barreira de Coral e ficou surpreendido com o que viu: é o maior episódio de branqueamento desde que há registo. A culpa é das alterações climáticas
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A Grande Barreira de Coral sofreu o maior episódio de branqueamento de que há registo, indica um relatório divulgado pelo Instituto Australiano de Ciências Marinhas, que alerta que o tesouro natural está em más condições. Temperaturas oceânicas elevadas registadas em 2024, que levaram a "níveis de stress térmico sem precedentes", desencadearam, segundo especialistas, o episódio de branqueamento de corais “mais extenso” desde o início dos registos. Em declarações à TSF, Pedro Frade, investigador que estuda os corais há quase 20 anos e que esteve na Austrália a estudar o fenómeno, alerta para um "pesadelo branco" e um "desastre ecológico".
"Pensávamos que a parte mais rasa do recife era a mais afetada pelas temperaturas altas do mar e a ideia era que os corais que estão mais profundos - a 30, 40 ou 50 metros - estavam naturalmente mais protegidos dos efeitos das temperaturas altas do mar. Nós mergulhámos a essa profundidade e deparámo-nos com um cenário igualmente devastador. Tudo o que víamos era coral branco, não estávamos nada à espera de ver isso. O que acontece é que até os corais profundos estão a ser afetados por pelas alterações climáticas, deparamo-nos com um desastre ecológico ainda maior do que estávamos à espera", conta à TSF Pedro Frade.
Os corais perdem a cor devido ao "colapso de uma simbiose que o coral tem com uma alga". A "simbiose colapsa quando a temperatura sobe, estas microalgas deixam de ser competentes, o coral expele essas microalgas e a cor que é dada ao coral por essas microalgas, mais acastanhada, perde-se e o tecido do coral torna-se transparente. É um pesadelo branco. Na verdade, o que está a acontecer é que o coral está a morrer à fome, ainda está vivo, mas não tem a sua fonte de alimento", explica o investigador.
Pedro Frade deixa um alerta: "Temos de pensar que 25% de todas as espécies marinhas existem no recife de coral, ou seja, um quarto de todas as espécies que conhecemos no mar estão presentes nos recifes de coral. Os corais crescem na orla dos continentes, ocupam uma área relativamente pequena, mas a contribuição em termos de biodiversidade é exponencialmente importante por essa capacidade de contribuir para muito daquilo que precisamos em termos de fontes de alimento. Há muitos químicos que estão a ser descobertos nesses ecossistemas e que podem ser usados para fins farmacêuticos e, ao perdemos os recifes de coral, estamos também a perder muitas da expressão cultural humana ao longo do planeta."
O branqueamento ocorre quando a temperatura da água aumenta, obrigando os corais a expelir algas simbióticas microscópicas, designadas 'zooxantelas', que lhes fornecem nutrientes e também contribuem para a sua cor. O branqueamento, se prolongado, pode levar à morte do coral.
Cientistas do Instituto Australiano de Ciências Marinhas analisaram 124 recifes de coral da barreira, entre agosto de 2024 e maio de 2025, mostrando os resultados que os “braços” sul e norte do recife tentacular sofreram o "maior declínio anual" alguma vez registado.
Este é o sexto episódio do tipo registado nos últimos nove anos.
Os recifes foram atingidos por ciclones tropicais e invasões de estrelas-do-mar coroa-de-espinhos (Acanthaster. cf. solaris), uma espécie que se alimenta de corais.
Segundo o relatório, um tipo de coral de crescimento rápido, designado de Acropora, foi o que mais sofreu.
O diretor de investigação do instituto, Mike Emslie, disse à agência France-Presse, não haver dúvida de que "as alterações climáticas são a causa número um” do branqueamento.
Mas considerou que “ainda vale a pena lutar” pela Grande Barreira de Coral, que muitos designam como "a maior estrutura viva do mundo".
Richard Leck, da World Wildlife Fund, disse à AFP que alguns recifes de coral em todo o mundo já não têm forma de recuperar, alertando que a Grande Barreira de Coral poderá sofrer o mesmo destino sem uma ação climática ambiciosa e rápida.
A Grande Barreira de Coral é uma extensão de 2300 quilómetros de recifes de coral tropicais que alberga uma vasta diversidade biológica.
