"Diálogo", um Governo "desesperado" e uma "moldura populacional": o que representa o regresso de Mondlane a Moçambique
Nesta quinta-feira que o candidato presidencial derrotado regressou a Moçambique, a TSF falou com três homens que conhecem bem o cenário vivido no país. Os tumultos, a esperança e o futuro foram alguns dos temas em cima da mesa
Corpo do artigo
Depois meses e meio depois, Venâncio Mondlane regressou, esta quinta-feira, a Moçambique, uma semana antes da tomada de posse do novo Presidente, Daniel Chapo. O candidato presidencial reafirma que não reconhece os resultados eleitorais.
Em declarações à TSF, Carlos Almeida, coordenador da Helpo, uma organização não governamental para o desenvolvimento que atua em Moçambique, começa por abordar os tumultos. "Há uma forte percentagem de pessoas cuja forma de manifestar não é nada pacífica, que nos últimos tempos se basearam em pilhagens, roubos, e situações menos anómalas."
Carlos Almeida considera que as pessoas estão divididas e que algumas, sobretudo da classe média, estão cansadas e já não se revêm nestas formas de luta.
“Achamos que a palavra-chave é ‘diálogo’ e esperamos que o candidato [Venâncio Mondlane] seja bem recebido e que haja espaço para diálogo”, afirma o coordenador de projetos.
As eleições presidenciais em Moçambique, a 9 de outubro de 2024, deram a vitória ao partido Frelimo (Frente da Libertação de Moçambique). Desde então, o candidato derrotado, Venâncio Mondlane, tem apelado à população que se manifeste contra o resultado das eleições.
Carlos Almeida conta que apesar de não ter havido roubos ou grande tensão em Maputo, a capital sofreu uma paralisação proveniente dos arredores. "Na periferia da cidade houve grandes complicações. De forma indireta, toda a cidade sofreu porque os trabalhadores não se podiam deslocar. Os supermercados estavam fechados. As bombas de gasolina começaram a sofrer também com estes bloqueios”, conta.
Porém, as tensões não ficaram por Maputo. “Na cidade de Nampula também houve muitos desacatos, houve tentativas de ataque às diferentes esquadras da polícia. Houve praticamente situações de tensão e tiros praticamente por toda a cidade. Depois, até nas zonas rurais, em alguns distritos, houve sinais de vandalismo, sinais de muita violência. Por isso, foi um bocadinho por todo o país que estes acasos tiveram lugar”, retrata.
Já o ativista e presidente da Plataforma Eleitoral Decide, Wilker Dias, também ouvido pela TSF, receia que o regresso do candidato possa significar uma nova onda de violência no país, porque o Governo está “desesperado”.
“Há muitas incertezas, mas a maior incerteza é a questão da segurança do próprio Venâncio Mondlane, porque estamos numa altura em que o Governo e o regime atual de Frelimo estão desesperados, têm optado por algumas práticas não muito boas para tentar repelir qualquer tentativa de união democrática ou popular”, afirma.
Wilker Dias avança que a sociedade civil moçambicana está a mover uma ação judicial junto ao Tribunal Africano dos Direitos Humanos, ação essa que Lázaro Mabunda subscreve. O jornalista é também investigador do Centro de Integridade Pública (CIP), um organismo independente que visa promover a transparência e o combate à corrupção em Moçambique.
À TSF, Lázaro Mabunda refere que vê o regresso de Venâncio Mondlane como a única forma do candidato presidencial derrotado contribuir para a política moçambicana e destaca a mobilização que o candidato trouxe na manhã desta quinta-feira. “Estava a chover em Maputo, a chover mesmo, mas muita gente foi lá recebê-lo. A informação que temos é que algumas pessoas pernoitaram lá”, conta.
O investigador afirma que o candidato derrotado é uma “moldura populacional”. “Espera-se que ele seja aquela pessoa que vai ser ouvida sempre que aparecer publicamente, a dar ordens, a fazer algum discurso”, sublinha.
Lázaro Mabunda antevê anos muito difíceis, em especial porque a Frelimo já teve a oportunidade de resolver os “problemas do país nos últimos 50 anos e não o fez”.
"É extremamente difícil antever os próximos dias. O candidato vencedor vai tomar posse com Venâncio Mondlane estando na oposição, mesmo não estando no Parlamento, o que se pode antever é que o mandato governamental de Daniel Chapo vai extremamente turbulento, extremamente difícil em função do que aconteceu nestas eleições."
