Empresários portugueses em Frankfurt apreensivos com ameaças de Trump: "Esperemos que sejam mais vozes do que nozes"
Reações de empresários da Fileira Casa, que, por estes dias, procuram novos negócios em Frankfurt, na Alemanha
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A expetativa é muita, não só com potenciais compradores presentes em Frankfurt, oriundos de mais de 200 países, como também com o que se vai passar na Alemanha, mergulhada numa campanha eleitoral e numa economia em recessão. Além disso, os empresários portugueses da Fileira Casa mostram-se ainda apreensivos com o potencial impacto proveniente das ameaças de Donald Trump quanto às tarifas que poderá impor à Europa.
O fado de Coimbra ajudou a dar o pontapé de saída para a inauguração da mostra “Made in Portugal Naturally” que serve de “chapéu” a mais de 300 produtos de 64 empresas que foram com a Nerlei a Frankfurt para participar na Ambiente. Considerada a maior feira da Fileira Casa do mundo e onde marcam presença mais de 103 empresas nacionais na edição deste ano, a iniciativa decorre até terça-feira.
Em Frankfurt, a TSF ouviu as expetativas de alguns dos empresários presentes.
Nuno Graça, co-CEO da JOMAZÉ, que há 46 anos fabrica porcelanas, foi a Frankfurt com a conterrânea de Alcobaça, a Arfai, numa parceria que dura desde 2008. O empresário refere que no ano passado registou quebras de 5% nas vendas para os EUA, por isso, aguarda com expetativa pelas decisões da administração norte-americana quanto às relações comerciais com a Europa, adiantando que “o que fornecemos ao mercado é considerado um bem supérfluo, logo, a imposição de tarifas pode sempre afetar a atividade, porque o senhor Trump chega à televisão e diz qualquer coisa e os mercados reagem, mas depois alguém diz o contrário e os mercados reagem positivamente, portanto isto é uma incógnita para nós”.
A empresária, Carla Moreira, dona da Arfai, aguarda com alguma expetativa o que vai acontecer com o mercado norte-americano e considera que, por enquanto, pode falar-se de um abrandamento.
Presente em Frankfurt com uma bela mesa posta com loiças fabricadas na Batalha, a MatCeramica conta com a presença do acionista Marcelo Franco de Sousa, também presidente da Federação Europeia da Indústria de Cerâmica, que, questionado sobre o futuro da relação com os EUA e as ameaças de Trump, considera que são “mais vozes do que nozes, mas há de vir aí uma moeda de troca qualquer".
Quanto a Elsa Almeida, que passou de empregada a dona da PPA - Perpétua Pereira e Almeida Lda., empresa que ajudou a salvar da falência com mais dois sócios e a ajuda de um fundo norte-americano, não esconde a expetativa, mas lembra que este é o segundo mandato de Trump. Para já, tem recebido sinais positivos das vendas do outro lado do atlântico, até porque acaba de lançar uma nova gama de produtos, concebidos a partir de sons produzidos pela natureza, que, posteriormente, um software traduz em formas e moldes.
Da experiência, já resultaram peças que traduzem o som do Rio Douro no encontro com o mar, na foz, ou a voz de artistas como Sónia Tavares, dos The Gift. Remata a conversa, dizendo: “Vamos ver, mas há sempre alguma preocupação."
Já Fernando Castro, uma dos herdeiros da cutelaria da Herdmar, de Guimarães, que já serviu a Casa Branca nos tempos de Barak Obama e por uma unha negra não ganhou o concurso para fornecer o Air Force One, considera que é preciso avaliar passo a passo.
"Não indo, obviamente, contra qualquer tipo de ideologia política, temos consciência de que é uma pessoa que está no poder de uma potência mundial e que é um bocado imprevisível e, se calhar, nunca foi tão imprevisível quem esteve à frente dos EUA.”
São estas expetativas de quem está, por estes dias, em contacto com diferentes investidores de todo o mundo, numa cidade que diz ter a lotação de hotéis praticamente esgotada, que junta multidões nas traseiras de qualquer mercado, a comer e a beber antes do almoço ao som de música ao vivo e vê a comitiva da China como uma das maiores presenças nesta Ambiente, considerada a mais importante do mundo da Fileira Casa e que anualmente se realiza na Messe Frankfurt, nesta altura do ano.
A Fileira Casa já representa 3,7 por cento das exportações nacionais, engloba os setores do mobiliário, têxteis-lar, utilidades domésticas (cerâmica, cutelaria, loiça metálica, pequenos eletrodomésticos e vidros e cristais) e iluminação.
De acordo com dados da AICEP relativos a 2023, esta é uma fileira que marca presença em 185 mercados e representa anualmente exportações na ordem dos 2,8 mil milhões de euros. No entanto, o representante da Agência para o Investimento e Comércio Externo na Alemanha considera que, apesar do abrandamento da economia alemã, ainda há sinais de resiliência nas relações bilaterais.
Rui Boavista Marques foi a Frankfurt falar da importância da resposta da indústria portuguesa aos pedidos de parceiros alemães, que tem permitido um saldo positivo na balança comercial entre os dois países e sublinha que, "no ano passado, a Alemanha ultrapassou França como segundo principal mercado de destino das exportações portuguesas, o quase traduziu num crescimento de 1,5 mil milhões de euros, enquanto as vendas para o mercado francês desceram 600 milhões, de modo que há tendências dos mercados, que, às vezes, são um pouco surpreendentes".
"A economia alemã está em contração há dois anos consecutivos e seria óbvio dizer que isso traria problemas acrescidos, mas não. Vamos ver o que o futuro nos reserva, mas basta olhar para o passado e falar do presente. Vamos falar do caminho que as empresas estão a fazer. As exportações para a Alemanha continuaram a crescer transversalmente a quase todos os setores. Houve setores em que existiu uma espécie de abrandamento, alguns até com um bocadinho de decréscimo, que foi o caso do vestuário, do calçado e dos têxteis, mas grande parte dos outros setores cresceu. Portanto, a Alemanha prova que a relação bilateral com Portugal tem traços de consistência e, tal como observamos desde o tempo da pandemia, tem resiliência. Esta relação está mais resiliente, porque é visível nas cadeias de fornecimento, o que quer dizer que os exportadores portugueses se entendem muito bem com os importadores alemães e há aqui um bom entrosamento entre cadeias de abastecimento."
Para Henrique Carvalho, diretor-executivo do NERLEI, que acompanha a comitiva no terreno, os primeiros contactos estão a ser positivos, já com sinais de potenciais retornos para futuros negócios, até para empresas estreantes nesta edição e em especial oriundas de compradores de países europeus vizinhos.
A participação conjunta destas empresas na Feira Ambiente, Christmasworld e Creativeworld é, pela quarta vez, da responsabilidade da NERLEI CCI – Associação Empresarial da Região de Leiria/Câmara de Comércio e Indústria, em parceria com a AICEP (Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal).
Além da organização da mostra, o apoio logístico e financeiro da NERLEI CCI, no âmbito do projeto International Business 2023-25, estende-se à participação individual de um total de 73 empresas. A associação sediada em Leiria conta com mais de duas décadas de know-how no apoio à internacionalização das PME da Fileira Casa e à presença na Feira Ambiente e outros eventos de dimensão mundial.
Já o designer desta mostra “Made In Portugal Natural”, que decora o espaço nacional na feira há pelo menos quatro edições, este ano quis criar uma experiência imersiva baseada na tradição portuguesa, em tons de mar e através dos cinco sentidos, sem faltar a música, os tradicionais pastéis de nata, o queijo e o vinho português, à heterogeneidade de texturas das peças apresentadas no stand instalado no Hall 12.0 C50 do recinto.
Para Miguel Costa Cabral, o mais difícil foi selecionar as cerca de 300 peças em exposição, pelos inúmeros catálogos que recebeu das empresas portuguesas interessadas em mostrar produtos aos 100 mil visitantes oriundos de 200 países, por estes dias esperados na Messe Frankfurt.
