Está nomeado para três Óscares, mas o Brasil está dividido e até já houve boicotes

"Ainda Estou Aqui", o filme de Walter Salles que está nomeado para os Óscares de Melhor Filme, Melhor Filme Estrangeiro e Melhor Atriz, já foi alvo de boicotes por simpatizantes da extrema-direita e "provocou muita ciumeira na Argentina". A partir de São Paulo, Gonçalo Junior — jornalista, crítico de cinema e escritor especialista em ditadura militar — conta à TSF que as nomeações fizeram reacender a discussão nas redes sociais.

Para o jornalista brasileiro que já publicou vários livros sobre a ditadura militar, o filme "Ainda Estou Aqui" é "uma florzinha no meio do asfalto que se vive no Brasil", um país polarizado politicamente. Em entrevista à TSF, Gonçalo Junior confessa-se orgulhoso com as nomeações para os Óscares, mas revela que o orgulho dele e de muitos brasileiros contrasta com os que rejeitam o filme.

"Nós temos uma força muito forte da extrema-direita no país que utiliza muito ferramentas de fake news nas redes sociais e o 'Ainda Estou Aqui' chegou a tal ponto que grupos com grande força organizaram boicotes aos cinemas", sublinha, acrescentando que "quanto mais o filme avança em prémios, mais acirra essas discussões nas redes sociais". 

"Essas três indicações não vão mexer com esses pseudo-patriotas, porque são patriotas que veneram a bandeira norte-americana, são pessoas em que o patriotismo não chega a esse ponto de ter orgulho", acredita. Para Gonçalo Junior, a direita brasileira faz campanha ostensiva pelo regresso da ditadura militar e o filme é sobre (precisamente) a ditadura militar. "Em janeiro do ano passado houve um assalto às sedes dos três poderes e uma bandeira que pedia a intervenção militar, no meio dessa confusão toda, você toca numa ferida", recorda.

Quanto ao sucesso que o filme pode alcançar, o crítico acredita que há boas hipóteses de vencer em Hollywood: "O Globo de Ouro é um indicativo de que tem boas hipóteses." Orgulhoso com o trabalho do realizador Walter Salles e também da atriz Fernanda Torres, o jornalista afirma que este é um filme "para quem preserva a capacidade de se indignar com as coisas, um filme que lava a alma e renova a esperança" e que se destaca também "pela subtileza com que trata um momento tão delicado da história do Brasil".  

Do ponto de vista técnico, Gonçalo Junior fala num passo evolutivo na produção de cinema no país: "O nosso cinema sempre foi um pouco deficiente, muito por falta de recursos em alguns aspetos técnicos, mas 'Ainda Estou Aqui' é um filme tecnicamente perfeito." O jornalista refere ainda que a obra de Walter Salles "provocou muita ciumeira na Argentina", onde se fazem "muito bons filmes".