França vive "quinta-feira negra" com uma greve nacional e manifestações sem precedentes
Protestos em toda a França prometem causar perturbações nos serviços públicos
Corpo do artigo
A França vive esta quinta-feira uma das maiores greves dos últimos anos. As oito principais centrais sindicais convocaram uma paralisação nacional contra as medidas de austeridade orçamental do Governo de Emmanuel Macron e falam de uma “quinta-feira negra”. De acordo com os sindicatos, são esperados cerca de 800.000 manifestantes em todo o país, quatro vezes mais do que na última paralisação, a 10 de setembro. Estão previstas 250 manifestações em diferentes cidades.
O impacto mais imediato sente-se nos transportes. Em Paris, o metro está quase todo parado, apenas três linhas automáticas funcionam. A rede de comboios suburbanos (RER) circula de forma muito limitada e uma parte importante dos autocarros da Île-de-France, a região parisiense, não sai da estação rodoviária. Nos comboios regionais (TER), apenas um em cada três circula nas horas de ponta. As linhas de alta velocidade (TGV) mantêm-se operacionais, assim como os aeroportos, depois de o sindicato dos controladores aéreos ter decidido suspender a greve inicialmente prevista.
Na educação, a paralisação é significativa. O Sindicato Nacional dos Professores do Ensino Básico (SNUipp) estima que um terço dos docentes esteja em greve em todo o país, número que em Paris pode atingir 45%.
A dirigente sindical Léa de Boisseuil lembra que a falta de professores fragiliza a escola pública: “Quando uma turma de 1.º ano, numa escola de educação prioritária às portas de Paris, tem 14 professores diferentes em apenas cinco semanas, a missão da escola pública deixa de ser assegurada”, afirma. Para a sindicalista, a consequência é direta: “As crianças não aprendem, perdem confiança na escola e já não têm referências sobre o que é um professor. Mesmo que os substitutos sejam os melhores de Paris, ninguém consegue manter a estabilidade assim.”
Léa de Boisseuil acrescenta ainda que, enquanto o ensino público enfrenta cortes e falta de pessoal, “as escolas privadas não perdem alunos” e escapam à justificação da quebra demográfica usada pelo Ministério da Educação para reduzir postos de trabalho.
Na saúde, todos os sindicatos hospitalares aderem à greve, deixando hospitais e centros de saúde a funcionar com serviços mínimos. Os farmacêuticos encerram farmácias em grande número e os fisioterapeutas também suspendem a atividade.
Na função pública, os 5,8 milhões de trabalhadores estão convocados. No sector energético, a Confederação Geral do Trabalho (CGT) prevê uma adesão elevada em refinarias, centrais nucleares e barragens. A Confederação Francesa Democrática do Trabalho (CFDT) assinala ainda 150 pré-avisos de greve na indústria química e farmacêutica, em empresas como a Total Energies, a Sanofi ou a Air Liquide.
Na agricultura, a Confederação Camponesa (Confédération Paysanne) participa nas manifestações, enquanto a Federação Nacional dos Sindicatos de Agricultores (FNSEA) aguarda pela mobilização que agendou para 26 de setembro.
O Ministério do Interior mobiliza 80.000 agentes de segurança. Em Paris, o chefe da polícia, Laurent Nuñez, mostra-se preocupado com a presença de grupos radicais, os chamados black blocs, e recomenda aos comerciantes situados ao longo dos percursos que mantenham as lojas encerradas esta quinta-feira.
Muitas empresas recorrem ao teletrabalho para minimizar o impacto da paralisação. O psicólogo do trabalho Jean-Christophe Villette considera que dias como este funcionam como “um teste de agilidade” para organizações já habituadas ao trabalho remoto desde a pandemia.
Para a sindicalista Christel Fine, da Confederação Francesa de Gestão – Confederação Geral dos Quadros (CFE-CGC), a opção do teletrabalho não enfraquece o protesto: “Não é quebrar a greve. É dar resposta às necessidades de quem não quer ou não pode participar nas manifestações.”
