Ex-eurodeputada regressou a Bruxelas para apresentar as duas obras lançadas recentemente, nas quais faz o balanço do mandato e discute a Europa noutra perspetiva
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A ex-eurodeputada socialista Margarida Marques alerta para a necessidade de Bruxelas preservar a identidade da Política de Coesão, tal “como está consagrada nos tratados”. No entanto, diz-se convencida de que a Comissão Europeia será capaz de encontrar soluções técnicas que permitam o financiamento de projetos ligados à indústria da defesa, sem desvirtuar uma política história na construção europeia.
Margarida Marques apontou como possível uma solução de compromisso, que garanta o financiamento de projetos de defesa com fundos regionais, desde que os investimentos sejam realizados na região beneficiária da política de Coesão. Em entrevista ao programa Fontes Europeias, da TSF, a ex-eurodeputada afirmou que Bruxelas “saberá criar mecanismos” que respeitem o princípio de que as verbas da coesão são gastas nas regiões a que se destinam.
“Se for um projeto industrial na região Norte, que cria emprego e desenvolvimento económico, não tenho nada contra”, assumiu Margarida Marques, avisando que “se esse projeto for em Lisboa não pode ser”. O mesmo se aplica se for noutro país, nesse caso, “não pode usar dinheiro da coesão de Portugal”, afirmou. Margarida Marques insistiu que Bruxelas será suficientemente “criativa” quando apresentar a proposta para o futuro Quadro Financeiro Plurianual, “com engenharia financeira”, capaz de ocultar eventuais cortes noutras áreas. Mas, a política de coesão tem “de manter a sua identidade e os seus objetivos”, vincou.
Por outro lado, Margarida Marques admitiu também que há agora condições para retomar o debate sobre a criação de um instrumento permanente de investimento europeu, inspirado no modelo do NextGenerationEU, que financiou os planos nacionais de recuperação e resiliência pós-Covid.
“Durante anos ouvimos que o PRR era único e irrepetível. Depois veio a guerra na Ucrânia e aplicámos uma metodologia quase idêntica para financiar a ajuda à Ucrânia”, salientou Margarida Marques, admitindo que esse sinal mostra que “há abertura”, mas ainda não há uma decisão estruturada. Mas, na sua perspetiva, há espaço para utilizar mecanismos semelhantes na área da Defesa.
Margarida Marques alertou para a necessidade de não sacrificar políticas sociais. Caso contrário, “se o reforço da defesa for feito à custa de cortes nas políticas sociais, estaremos a abrir caminho à extrema-direita, que explora todas as fragilidades do modelo social europeu”, assinalou.
Nesta entrevista, realizada em Bruxelas, Margarida Marques abordou os temas dos dois livros Fazer Europa e E se falássemos de Europa, que apresentou esta semana no Parlamento Europeu.
Com a obra Fazer Europa, a ex-deputada apresenta um balanço político do seu mandato, com cinco áreas principais de intervenção: o Quadro Financeiro Plurianual, a reforma do Pacto de Estabilidade e Crescimento, com propostas "para equilibrar metas orçamentais e sociais”, o comércio justo, a política para o Mediterrâneo e causas como o Erasmus, a União para a Saúde ou o Brexit.
Na segunda obra, E se falássemos de Europa, a ex-eurodeputada junta 133 perspetivas sobre a construção europeia, de diferentes personalidades, a partir das conversas que vão além dos temas tradicionais. “Falei de poesia, cinema, igualdade de género, juventude, direitos fundamentais, biodiversidade, refugiados”, detalhou a ex-eurodeputada, referindo que os temas foram abordados num podcast que publicou regularmente, ao longo do mandato.
Na entrevista ao programa Fontes Europeias da TSF, a ex-eurodeputada abordou ainda o contributo de Portugal para a construção europeia, destacando o papel do país nas relações externas, com África, Brasil ou com Timor. No ano em que se celebram os 40 anos da assinatura do tratado de adesão ao projeto europeu, Margarida Marques enalteceu o contributo português para a construção europeia, destacando desde logo “a forma como o país lida com a democracia”.
“Os portugueses acham que só recebem da Europa, mas também contribuem. Temos uma imagem respeitada nas instituições e ajudámos a reforçar a diversidade e a democracia europeia”, vincou.